A política ferroviária do Brasil é tradicionalmente precária. Em um país de dimensões continentais como o nosso, a implantação de estradas de ferro obedeceu a um esquema herdado das estradas de rodagem coloniais, de viabilizar o escoamento de produtos primários do interior para os principais portos. Nunca houve a preocupação de cobrir todo o território nacional com uma malha ligando as diversas regiões, como ocorre nos Estados Unidos, na Europa, no Japão, e como se deu com a malha rodoviária construída a partir da metade do século findo. Durante a 2ª Guerra Mundial, as matrizes estrangeiras começaram a negligenciar a manutenção de suas ramificações brasileiras o que as levou ao sucateamento. O governo, geralmente tão alheio aos interesses nacionais, aceitou ser forçado a comprar estradas de ferro deficientes, sem investimentos, sem conservação, e constituir a Rede Ferroviária Federal S.A. (RFFSA), que nunca prosperou, pois foi logo transformada em cabide de empregos para políticos e seus afilhados.
Hoje, as poucas ferrovias que continuaram operando não são integradas nacionalmente e transportam quase exclusivamente cargas, com poucas exceções. Nos países desenvolvidos, a revolução rodoviária do pós-guerra não teve como conseqüência o abandono das ferrovias, como aconteceu aqui. No Nordeste, as linhas da Great Western Railway estatizada, que ligavam as capitais de Natal a Maceió ao Sertão, foram se deteriorando até serem desativadas. A concessão das linhas nordestinas à empresa privada Companhia Ferroviária do Nordeste (CFN) não trouxe o resultado esperado. A tão primordial e aguardada Transnordestina, que ligaria Pernambuco, Ceará, Bahia e Piauí, continua fora dos trilhos.
Daí o ultimato recente da ministra-chefe da Casa Civil e gerente maior do PAC, Dilma Roussef, cobrando ação das concessionárias e se referindo nominalmente ao atraso na construção dessa estrada e da Ferronorte, que ligará o Alto Araguaia a Rondonópolis, em Mato Grosso: “O País não pode esperar e não tem como atrasar mais a estruturação de ferrovias.” O presidente Luiz Inácio Lula da Silva chegou a atribuir o atraso das obras da CFN à inadimplência com a União da Companhia Siderúrgica Nacional (CSN), maior acionista da concessão nordestina, que liga Propriá, em Sergipe, a São Luís, no Maranhão. Apesar da privatização, o governo continua bancando parte dos custos da Transnordestina através do Fundo de Desenvolvimento do Nordeste. O restante virá da própria companhia e de empréstimo contratado com o BNDES.
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O ministro do Planejamento, Paulo Bernardo, também se referiu à preocupação do governo com o atraso e lembrou que há cláusulas contratuais de responsabilidade e um calendário de obras, e “é um dever do Estado, como poder concedente, exigir que elas andem”. A intenção de fazer a Transnordestina é antiga e se deve ao Barão de Mauá, que construiu o primeiro trecho ferroviário brasileiro no século 19, entre o Rio de Janeiro e Petrópolis. Tomou corpo no governo de Juscelino Kubitschek e é muito importante para o Nordeste, pois escoará a soja do Maranhão e do Piauí e a gipsita da região do Araripe. Intriga o Ministério Público o fato de a CSN, apesar de inadimplente com a União e de não haver cumprido as exigências de investimento na ferrovia decorrentes da privatização, contar com abundantes recursos públicos do BNDES.
Além da grande importância das ferrovias para o transporte mais barato de grãos e outros produtos, deve-se frisar também que todos os países desenvolvidos têm, em suas malhas ferroviárias, um meio de transporte de passageiros rápido, eficiente, muito mais seguro que o rodoviário e não poluente. Nos anos 1950, os trens chegaram a transportar mais de 100 milhões de passageiros por ano, e é desolador constatar que hoje só restam no País três linhas de trem fazendo a condução regular de pessoas em trechos de longa distância. E dos 35 mil quilômetros de estradas de ferro do final da guerra 1939-45, o que era pouquíssimo
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