Domingos José Minicucci
Recordo-me do tempo em que andávamos de bonde em São Paulo e Santos, nos anos de 1960. Também já se passaram 40 anos desde a época em que viajávamos de trem do interior para São Paulo. Os trens pertenciam à extinta Estrada de Ferro Sorocabana, eram confortáveis e rápidos para época, com linhas eletrificadas, comparados aos melhores da Europa e Estados Unidos. Estas são lembranças de um tempo que parece resistir a voltar em nosso País, pois acabamos com o transporte de passageiros por ferrovia de média e longa distância, bem como os bondes – que hoje circulam em muitas cidades da Europa complementando o transporte rodoviário e metroviário.
Enquanto o Velho Continente avançou e modernizou o transporte ferroviário, o Brasil praticamente parou no tempo e sucateou este modal, que hoje se depara com a carência e defasagem tecnológica brutal na área de passageiros.
Alguns números da cidade de São Paulo nos fazem refletir o quanto nós erramos ao longo de 40 anos. Os congestionamentos no ano 2000 eram de 117 km e hoje chegam a 250 km. A frota de veículos também em 2000 era de 5 milhões de carros e hoje temos mais de 6 milhões. Para ter idéia do volume, emplacamos atualmente cerca de 800 veículos por dia na capital paulista. Todo este crescimento tem um preço bastante alto, pois a média de velocidade dos automóveis em congestionamentos há 8 anos era de 20 km/h, enquanto que, atualmente, reduziu-se para 17 km/h. Segundo dados da CET, o custo estimado da redução da mobilidade em São Paulo é de R$ 33,5 milhões. Infelizmente, o problema não é apenas de São Paulo. Estudos apontam que até 2023 as cidades do Rio de Janeiro, Belo Horizonte e Porto Alegre irão parar.
Diante do quadro, algumas obras urgentes precisam sair do papel, como o ferroanel, que facilitará a travessia dos trens de carga pela cidade de São Paulo. Hoje, estes trens dividem as mesmas linhas com a CPTM, criando um gargalo no escoamento de carga. Recentemente, foi estendido o rodízio para os caminhões em São Paulo, na tentativa de desafogar as marginais. Mas será que isto não seria mais eficiente se parte desta carga fosse transportada pela ferrovia por meio do ferroanel? Outra obra importante seria a ligação de São Paulo com Campinas e Jundiaí, com trem de média velocidade, aliviando o grande movimento de carros e ônibus entre estas cidades.
É certo que estamos acordando para o problema, já que assistimos à expansão do Metrô de São Paulo e a discussão de alguns projetos importantes, como o expresso aeroporto, que fará a ligação da Estação da Luz ao aeroporto de Cumbica, em Guarulhos. Na esfera federal, estamos construindo a ferrovia Norte-Sul, que possibilitará a ligação ferroviária entre os dois extremos do País – embora isto mostre o quanto nós estamos atrasados, já que um país do tamanho do Brasil ainda não tem, em 2008, o Norte e o Sul ligados por ferrovia. A Transnordestina é outra obra importante que possibilitará a integração ferroviária do Nordeste do Brasil, visto que a nova fronteira agrícola do Brasil está no Norte e Nordeste.
Na área de passageiros, o trem de alta velocidade entre Rio e São Paulo mostra sinais de que, finalmente, irá sair do papel, tirando parte do movimento de carros e ônibus da via Dutra, bem como da ponte aérea. A respeito deste projeto, creio, particularmente, que um trem de média velocidade que trafegue a 160 km/h ou 140 km/h atenderia esta demanda com um custo de implantação e operação bem menor que o trem de alta velocidade.
Não se pode esquecer que toda esta demanda da área ferroviária tem que estar integrada com o transporte rodoviário, tanto na área de carga como na de passageiros. Um exemplo simples se refere ao Metrô, que necessita construir bolsões de estacionamento a preço acessíveis nas estações de bairros afastados do Centro, para incentivar as pessoas a fazerem o trajeto de carro até o estacionamento e continuar de Metrô para a região central.
Da mesma forma o transporte de carga normalmente necessita que uma parte seja feita por caminhão, pois poucas empresas possuem ramais ferroviários internos. Todos os países de primeiro mundo que têm uma cadeia de logística eficiente conseguiram fazer o equilíbrio entre o ferroviário e o rodoviário.
Artigo publicado em 12/09/2008
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