Desde a época do Império, por volta de 1872, quando começaram a ser implantadas as primeiras ferrovias em Minas, os trens estão no nosso imaginário. Não é à toa que algumas das nossas mais conhecidas expressões têm trem: “trem bão”, “ trem danado”, “trem de doido”, “trem ruim…”. Poemas, contos, livros e canções, como a bela Ponta de areia, letra de Fernando Brant, interpretada por Milton Nascimento, sempre os homenagearam. Guimarães Rosa, no conto “Sorôco, sua mãe, sua filha”, de Primeiras estórias, falou deles, assim como em outros textos. De uns anos para cá, quase não são mais vistos pelas Minas Gerais, onde já tiveram papel fundamental, tanto econômico como cultural.
Também interessada no assunto, sobre o qual já havia escrito um livro, Nos trilhos do tempo – memória da Ferrovia em Pedro Leopoldo, em coautoria com Rogério Arruda, a professora de história Andréa Casa Nova Maia, carioca criada em Belo Horizonte, de uns tempos para cá resolveu voltar ao assunto e acaba de publicar outro trabalho sobre tema: Encontros e despedidas – história de ferrovias e ferroviários de Minas, que ela lança hoje, na Livraria Quixote. A ideia de escrevê-lo, segundo ela, surgiu em 1998, quando foi convidada para ministrar um curso sobre o movimento operário brasileiro no Sindicato dos Ferroviários de Belo Horizonte.
Os alunos, na quase totalidade, eram ou tinham sido trabalhadores ferroviários, ou ligados ao ramo. “Ouvi tantas histórias, tantos depoimentos interessantes, que acabei escrevendo Encontros e despedidas, com o qual fiz meu doutorado na Universidade Federal Fluminense. Foi também uma forma de preservar um pouco dessa memória, que, apesar de ser muito rica, estava começando a cair no esquecimento. Hoje a maioria das estações estão abandonadas”, diz a professora.
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ARQUIVOS
O livro foi prefaciado pela professora Lucília de Almeida Neves Delgado e vem ainda com documentação fotográfica. Além de dar uma geral na história das ferrovias em Minas, a autora procurou priorizar um período especial, que foi de 1930 a 1950, quando as malhas ferroviárias do estado, segundo ela, conheceram seu apogeu, perfazendo milhares de quilômetros, e também o começo do seu declínio. Esse se acentuou depois do golpe de Estado de 1964, quando os militares tomaram o poder, até quase a derrocada, com as privatizações, feitas durante os governos de Fernando Henrique Cardoso.
Para realizar suas pesquisas, às quais se entregou durante bom tempo, Andréa Casa Nova conta que se valeu não só de arquivos da Rede Mineira de Viação, em Belo Horizonte, como foi várias vezes a Divinópolis, onde havia grande oficina da Estrada de Ferro Oeste de Minas. “A documentação que encontrei, com muitas informações, levou-me também a pesquisar sobre as greves ferroviárias ocorridas naquela cidade, onde as mulheres dos operários também tiveram importante participação.”
Andréa, que está de volta ao Rio para dar aulas na Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), é autora também de História oral do movimento docente da UFMG. Ainda a respeito de Encontros e despedidas, ela diz que começou seu texto buscando entender o significado simbólico da passagem do trem pelo interior de Minas. Procurou ainda situar o leitor na relação ferrovia-modernidade-progresso, até chegar à luta dos ferroviários, seja na Estrada de Ferro Oeste de Minas ou seja na Rede Mineira de Viação, para fazer valer seus direitos. “Acho que a experiência deles pode ser importante para os trabalhadores do presente”, afirma.
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