O suposto pagamento de propina a políticos para conseguir contratos com o governo de São Paulo partiu da cúpula da Alstom em Paris, segundo depoimento ao Ministério Público do empresário Romeu Pinto Junior. Ele tem conhecimento de causa sobre o assunto: representava a MCA Uruguay, empresa que a Alstom usou para trazer o dinheiro da Europa para o Brasil, de acordo com o Ministério Público da Suíça.
Pinto Junior afirma que a MCA Uruguay foi aberta por Phillipe Jaffré, diretor financeiro da Alstom que chegou a vice-presidente da multinacional francesa. A MCA é uma “offshore”, tipo de empresa que paga menos impostos, por funcionar em paraísos fiscais, e permite que seus controladores não sejam conhecidos pelas autoridades. Apesar do nome, a MCA foi aberta nas Ilhas Virgens Britânicas, no Caribe.
A Alstom depositou pouco mais de US$ 1 milhão nas contas da MCA entre outubro de 1998 e fevereiro de 2002 -o valor exato é de US$ 1.006.516,02 (R$ 1,86 milhão hoje).
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A Alstom está sob investigação no Brasil sob suspeita de ter pago propina a políticos do PSDB para obter contratos para fornecer equipamentos para uma subestação de energia e para o Metrô.
No último dia 5, a Justiça decidiu bloquear contas na Suíça atribuídas a Robson Marinho, conselheiro do Tribunal de Contas do Estado, e a Jorge Fagali Neto, irmão do presidente do Metrô. Ambos negam ter tido negócios com a Alstom.
Dólares e motoboys
Pinto Junior confirmou em depoimento ao promotor Silvio Marques e do procurador Rodrigo de Grandis a suspeita de que os contratos de consultoria da Alstom com brasileiros eram um disfarce para pagamento de propina porque o serviço contratado não era prestado: “O declarante afirma que não prestou os referidos serviços relacionados nos recibos (invoices) emitidos pela MCA Uruguay”.
O dinheiro vinha para o Brasil por meio de doleiros indicados pelo diretor financeiro da Alstom, ainda de acordo com o empresário brasileiro.
Pinto Junior diz que não sabe qual seria o destino final do dinheiro: “O declarante recebeu os valores mencionados no Brasil, na sua casa, mas não ficou para si com qualquer quantia, pois teve de indicar as quantias para pessoas indicadas para Jaffré. O declarante recorda-se que entregava os valores em restaurantes a motoboys indicados por doleiros”.
As contas da MCA em Zurique, na Suíça, e em Luxemburgo eram controladas por Jaffré e por Pinto Junior, de acordo com o empresário brasileiro.
Pinto Junior diz que foi contratado pelo diretor financeiro da Alstom para ajudar a implementar um contrato com a Eletropaulo que estava parado. Chamado de projeto Gisel (Grupo Industrial para o Sistema Eletropaulo), o contrato de cerca de R$ 110 milhões foi executado a partir de 1998.
A MCA receberia 7,5% do valor dos contratos que a Alstom assinasse com a Eletropaulo, segundo Pinto Junior. Manuscrito em francês apreendido diz que a empresa estava disposta a pagar “comissão” a políticos para fechar negócio com a Eletropaulo e cita as iniciais R.M. -que a Promotoria acredita ser de Robson Marinho.
O diretor da Alstom que contratou Pinto Junior era prestigiado na empresa. Quando ele morreu de câncer, em 2007, o atual presidente, Patrice Kron, ressaltou “o papel essencial que teve na recuperação” da companhia entre 2003 e 2004, quando a Alstom quase quebrou. Para Kron, o executivo “apresentou visão, competências e disponibilidade que (…) permitiram salvar a empresa”.
Outro lado: empresa afirma que acusação ofende executivo
A Alstom no Brasil afirma por meio de nota enviada à Folha que “as sérias acusações contra Philippe Jaffré são chocantes e ofendem a integridade e honestidade de um homem que ocupou altas posições não somente em órgãos públicos na França, mas também em indústrias e bancos mundialmente respeitados”.
Jaffré trabalhou em bancos como o Stern e na petroleira Elf Aquitaine. No governo de Édouard Balladur (1984-1985), teve atuação no Tesouro francês e cuidou do processo de privatização.
A multinacional francesa diz que não pretende comentar as investigações sobre eventual pagamento de propina a políticos porque elas tramitam sob sigilo. Afirma que “estamos cooperando com as autoridades tanto na Suíça como no Brasil”.
A Alstom diz seguir “um código de ética muito rígido, definido e implementado por meio de sérios procedimentos, de maneira a respeitar todas as leis e regulamentações mundialmente”.
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