Às margens da BR-135, no Maranhão, o viajante depara-se com uma situação inusitada e perigosa. Por 18 quilômetros, entre os municípios de Estiva e Bacabeira, na grande São Luís, a linha férrea serpenteia junto à estrada, separada do asfalto por apenas meio metro de distância. Nesse trecho fazer retornos é uma temeridade porque a rodovia não tem acostamento. Quando o trem passa, circula praticamente colado em caminhões, ônibus e carros que transitam pelo local, muitas vezes em alta velocidade.
Existe um plano para deslocar os trilhos desse perímetro em malha que é operada pela Transnordestina Logística, a antiga Companhia Ferroviária do Nordeste (CFN). A obra se insere na primeira etapa do projeto de duplicação da BR-135, único eixo viário na ligação de São Luís ao resto do Brasil. A modernização dessa estrada é uma das maiores aspirações dos maranhenses na área de infraestrutura de transportes. Quando sair do papel, a obra poderá melhorar o trânsito de passageiros e cargas e contribuir para uma melhor integração entre os diferentes modais – caminhão, trem e navio.
A integração dos modais precisa ser mais trabalhada no Brasil como forma de facilitar o fluxo de mercadorias de diferentes características, com confiabilidade, prazo adequado e custos menores, diz Paulo Fleury, diretor do Instituto Ilos Supply Chain. Nas contas do Ilos, o Brasil tem um dos custos logísticos mais altos do mundo, de 11,6% do Produto Interno Bruto (PIB), segundo dados de 2008. Há avaliações segundo as quais esse custo pode ser ainda maior, entre 15% e 18% do PIB. No início da década de 2000, estimativas apontavam para um custo logístico de 16,7% do PIB, mas o número era questionado porque não havia uma metodologia disponível para calcular os gastos com logística no Brasil, afirma Fleury.
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A redução dos custos logísticos é importante para o Brasil continuar a crescer, considerando-se que a expansão da economia apoia-se em boa parte nas exportações e importações. E a competitividade do comércio exterior depende, em grande medida, de estradas, ferrovias e portos eficientes. É consenso entre especialistas, empresários e entidades multilaterais que a infraestrutura de transportes melhorou no Brasil nos últimos anos, sobretudo a partir do início das concessões rodoviárias em meados da década de 1990. A privatização dos portos também melhorou as operações logísticas. A movimentação de um contêiner, que em 1994-1995 custava cerca de US$ 600, fica hoje entre US$ 200 e US$ 250 por unidade.
Uma prova das melhorias na infraestrutura do país está no fato de o Brasil ter pulado da 61ª para a 41ª posição, entre 2007 e 2010, em um ranking do Banco Mundial (Bird) que mede a eficiência na área de logística. O ranking inclui 155 países e é formado a partir de pesquisas com mais de mil operadores logísticos. O ministro Pedro Brito, da Secretaria Especial de Portos (SEP), avalia que a gestão profissional dos portos, aliada a um plano nacional de dragagem em curso, contribui nesse esforço de avançar no ranking.
Com a dragagem, os portos poderão receber navios de novas gerações, com maior capacidade de carga. Segundo Brito, estão previstos US$ 20 bilhões em novos investimentos nos portos do país nos próximos cinco anos. Só nos terminais de contêineres de uso público serão investidos US$ 4 bilhões.
No setor privado, a avaliação é de que as concessões foram um marco no setor de transportes no país. Na área rodoviária, a privatização permitiu melhorar e recuperar estradas existentes. O problema é que novas concessões de rodovias demoraram a sair. “Houve aumento de eficiência do sistema, mas faltou implementar nova malha”, avalia Luiz Fernando Santos Reis, presidente do Sindicato Nacional da Indústria da Construção Pesada (Sinicon).
O governo federal, no entanto, não conseguiu desenvolver parcerias público-privadas para fazer novos trechos de rodovias, diz Moacyr Duarte, presidente da Associação Brasileira de Concessionárias de Rodovias (ABCR). Segundo ele, o Brasil tem uma malha rodoviária pavimentada pequena levando-se em conta a extensão territorial e o PIB do país. O Brasil tem a quinta maior extensão territorial do mundo, mas fica apenas em 13º do ranking quando o critério de classificação é a extensão de rodovias pavimentadas, segundo mostra o consultor Geraldo Vianna. Entre os países Bric (Brasil, Rússia, Índia e China), o Brasil é o que tem a menor densidade de malha em todos os modais.
A densidade de malha considera quilômetros de vias disponíveis sobre a área total do país, em quilômetros quadrados. A densidade da rede de rodovias pavimentadas brasileira é 20 vezes menor do que a indiana e quase sete vezes menor do que a chinesa, compara o Instituto Ilos Supply Chain. Ao mesmo tempo, a densidade da malha ferroviária nacional é seis vezes menor do que a indiana. E a densidade da rede de hidrovias do Brasil é sete vezes menor do que a chinesa.
É comum a ideia, entre executivos da área, que para ampliar os investimentos no setor o governo deveria fazer mais concessões rodoviárias e intensificar a aplicação desse modelo em portos e ferrovias. Luiz Antonio Pagot, diretor-geral do Departamento Nacional de Infraestrutura de Transportes (Dnit), concorda: “Temos que evoluir rápido na questão das concessões de forma a modificar a matriz de transporte. Se transferir mais estradas para o setor privado, o governo precisará de menos recursos para manutenção rodoviária e vai sobrar mais dinheiro para investir em hidrovia e ferrovia.”
Vianna, que foi presidente da Associação Nacional do Transporte de Cargas e Logística (NTC&Logística), entende que em muitas situações é indispensável que a ferrovia e a hidrovia ampliem sua participação de mercado, como de fato já vem ocorrendo timidamente. Mas, segundo ele, isso só será uma boa notícia se a transferência de cargas entre os diferentes modais ocorrer em um cenário em que as ferrovias e os portos tenham sido modernizados e concorram com um sistema rodoviário também ágil e moderno.
Para os próximos anos, a demanda por recursos será ainda maior para fazer frente aos projetos que o país precisa para continuar a se desenvolver. O Plano Nacional de Logística e Transportes (PNLT), elaborado pelo Ministério dos Transportes em parceria com o Ministério da Defesa, indica a necessidade de R$ 290,3 bilhões em investimentos em infraestrutura de transportes até 2023.
O Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES) trabalha com números diferentes. O investimento em infraestrutura previsto pelo banco, que era de R$ 274 bilhões, foi revisto para R$ 311 bilhões entre 2010 e 2013. As projeções consideram, além de transporte, saneamento, telecomunicações e energia elétrica. Só em ferrovias a previsão do banco saltou de R$ 29 bilhões para R$ 56 bilhões em função de melhores definições na implementação do Trem de Alta Velocidade (TAV), diz Fernando Puga, chefe do departamento de acompanhamento econômico e operações do BNDES.
Fleury, do Ilos, diz que para melhorar a situação é preciso investir mais. Segundo ele, em 2008 foram destinados apenas 0,48% do PIB para a área de infraestrutura de transporte, ante 1,75% investido em 1975, década em que o Brasil cresceu em ritmo acelerado e investiu pesado em projetos estruturantes, sobretudo em estradas e energia.
No Maranhão, um polo exportador de minério de ferro, soja e alumínio, entre outros produtos, ainda há muito a se fazer na área de infraestrutura. “A duplicação da BR-135 é importante para por fim ao estrangulamento da rodovia por força da movimentação do porto (de Itaqui) e do turismo (para os Lençóis Maranhenses)”, diz Gerardo Fernandes, superintendente do Dnit no Maranhão.
No porto do Itaqui, em São Luís, o projeto de construção do Terminal de Grãos do Maranhão (Tegram) foi repensado. O novo projeto passou a prever a ligação do terminal com a Ferrovia Norte-Sul, malha que se liga à Estrada d
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