Para atrair os interessados no Trem de Alta Velocidade (TAV), o governo brasileiro aceitou flexibilizar algumas exigências no que diz respeito à transferência tecnológica. Uma das grandes mudanças é que agora a transmissão dos conhecimentos do concessionário ficará centrada no material rodante, sistema de eletrificação, de controle da rede de trens e projetos integrados de engenharia. A infraestrutura de trilhos, por exemplo, ficou de fora, assim como operação e manutenção do trem. “Antes, a transferência englobava a totalidade dos módulos do TAV, era de fio a pavio”, afirmou à Agência Estado o superintendente-executivo da Agência Nacional de Transportes Terrestres (ANTT), Hélio Mauro França. “Procuramos fazer ajustes que os próprios competidores entendiam como razoáveis.” No mercado ferroviário, poucos executivos se inteiraram destas mudanças.
Outra novidade é que o provedor das tecnologias dos módulos do TAV poderá cobrar ou exigir royalties quando repassar seu conhecimento a terceiros. Antes, de acordo com França, não havia a possibilidade de remuneração. Esse é um ponto favorável às detentoras das tecnologias para o TAV brasileiro, pois não haverá restrição à venda de bens ou serviços, inclusive a sistemas ferroviários de outros países. No contrato entre o detentor e o receptor da tecnologia serão estabelecidas condições para o pagamento e critérios para a venda de produtos.
A Empresa de Transporte Ferroviário de Alta Velocidade (ETAV), estatal que será criada para o projeto do trem-bala e será sócia do empreendimento, também terá a liberdade de sublicenciar a tecnologia do trem-bala. Conforme o superintendente da ANTT, se a ETAV decidir cobrar pelo sublicenciamento a agentes locais ou terceiros, o provedor da tecnologia terá direito a 20% da receita líquida auferida com a operação. “Haverá a obrigatoriedade de o concessionário fornecer a tecnologia e a ETAV vai monitorar todas as especificações técnicas. As relações comerciais entre o fornecedor e a empresa que vai receber essa tecnologia serão passíveis de remuneração”, explicou França.
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Além de um escopo mais abrangente nos itens passíveis de transferência tecnológica, a versão anterior do edital não estabelecia um prazo de vigência das atualizações dos módulos do TAV. Isso gerava dúvidas se a obrigatoriedade dos aprimoramentos tecnológicos extrapolaria os 40 anos de concessão. Agora, conforme França, a validade das atualizações será definida em contrato, respeitando-se, também, os prazos legais no Brasil para os direitos de propriedade.
Outra preocupação comum a todos os interessados no trem-bala – e que agora foi resolvida – era que, na versão preliminar do edital, a transferência da tecnologia poderia ser feita inclusive a uma empresa concorrente. “Essa era uma incoerência que foi solucionada. Além disso, os contratos não serão mais pré-moldados: haverá liberdade para o estabelecimento de parâmetros na transferência tecnológica”, destacou o superintendente da ANTT.
Um dos representantes de consórcios interessados no TAV, que preferiu não ser identificado, elogiou as mudanças. “Antes o governo queria que fizéssemos a transferência tecnológica de graça. A versão anterior do edital também pregava a livre transferência de tecnologia, abrindo a possibilidade de o fornecedor repassar seus conhecimentos a um concorrente no Brasil.”
Conteúdo Nacional
Diferentemente da minuta, o edital agora pede índices progressivos de conteúdo nacional para produtos usados no desenvolvimento do TAV. No caso do material rodante, por exemplo, ao menos 15% dos produtos deverão ser produzidos no País nos dois primeiros anos de construção do TAV, passando a 60% entre 26 e 40 anos da concessão. O executivo da ANTT comentou, também, que o governo resolveu retirar operação e manutenção da lista de itens que precisam de transferência tecnológica porque o governo vai ser sócio do concessionário e, desta forma, absorverá de qualquer maneira o conhecimento.
O presidente da Associação Brasileira da Indústria Ferroviária (Abifer), Vicente Abate, comemorou o fato de a versão final do edital garantir uma presença mínima para a indústria nacional. Ele ressalta que o ideal seria que as empresas brasileiras fornecessem, logo no início do projeto, 60% dos produtos ferroviários. Ele reconhece, no entanto, que o trem de alta velocidade é um negócio novo no Brasil e que as empresas locais ainda precisam assimilar os conhecimentos necessários para concretizar este empreendimento. “O conteúdo nacional escalonado será um desafio. Cabe à indústria brasileira absorver a tecnologia e aumentar o porcentual de conteúdo nacional o mais rápido possível”, destacou.
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