Trânsito livre não é sonho

Redesenhar a Central do Brasil, fazendo da estação de trem carioca um ponto de conexão entre diferentes meios de transporte, como trem, metrô e ônibus, é uma das propostas de replanejamento urbano para a cidade do Rio em 2030. O projeto foi criado para a exposição Our Cities Ourselves: The Future of Transportation in Urban Life, que segue até 11 de setembro em Nova York, apresentando alternativas para diminuir a circulação de carros nos grandes centros urbanos – e, consequentemente, o trânsito e a poluição que os veículos acarretam. Itinerante, a mostra deixa o AIA Center nova-iorquino para se instalar no Rio no fim do ano.


Ao todo, dez cidades integram a exposição, uma iniciativa do ITDP (Institute for Transportation and Development Policy), organização com sede na cidade de Nova York voltada ao desenvolvimento do transporte sustentável – com meios de transporte que geram pouca ou nenhuma poluição. A maioria das metrópoles está situada em países com economias em desenvolvimento, já que o ITDP prevê nessas nações o maior crescimento de centros urbanos nos próximos 20 anos.


Exceto pela Rússia, os demais países do Bric, em destaque pelo rápido crescimento de suas economias, estão representados na mostra – realizada para comemorar o 25º aniversário do ITDP. O Brasil entra com o Rio; a Índia, com Ahmedabad; e a China, com Guangzhou. Também participam a Cidade do México, Buenos Aires, Nova York, Budapeste, Johannesburg, Jakarta (Indonésia) e Dar es Salaam (Tanzânia).


A Central do Brasil deve ser ponto de conexão entre diferentes meios de transporte, como trem, metrô e ônibus: proposta de replanejamento urbano para o Rio em 2030
Para vislumbrar como as metrópoles seriam em 2030, se projetos de planejamento urbano priorizassem o transporte público e a circulação de bicicletas e de pedestres, o ITDP escolheu arquitetos atuantes em cada cidade. Aqui a motivação é baseada nas necessidades das pessoas e não dos carros, diz Gabriel Duarte, arquiteto do escritório Campo aud, que realizou o projeto em parceria com a Fábrica, também do Rio.


Cada arquiteto escolheu uma área específica, fazendo um recorte urbano de sua cidade, onde aplicou os dez princípios de transporte sustentável do ITDP. Entre eles, destacam-se as criação de espaços para pedestres, para bicicletas e outros veículos não-motorizados e a preservação dos patrimônios naturais, culturais e histórico de cada região.


Escolhemos a Central do Brasil por ser a maior concentração de transporte público no Rio. Além de trem, metrô e ônibus, há táxis, vans legais e as ilegais, afirma Duarte. Seu projeto inclui redesenhar toda a área da estação inaugurada em 1943, com a torre do relógio inspirada no movimento da art déco. A criação de uma grande marquise expandiria o saguão principal da estação, conectando diferentes áreas. E vários tipos de transporte, como trem, ônibus e metrô, passariam a compartilhar o saguão central, permitindo que os usuários trocassem de um meio para outro muito mais facilmente, ao usufruir de uma área de convivência. Todos os meios de transporte estão lá, mas não estão articulados entre si, o que não valoriza a região.


Ainda está previsto o replanejamento da congestionada avenida Presidente Vargas, transformando-a num bulevar para a circulação de ônibus BRT (bus rapid transit) e de bicicletas – reduzindo o número de pistas para carros. O projeto revitalizaria toda a área. Não só aproveitaria as construções que se encontram abandonadas no local atualmente, valorizando o estilo arquitetônico original, como integraria a vizinhança, criando uma conexão, por meio de um elevador, com o Morro da Previdência. Há ainda a ideia de instalar uma estação de teleférico no local.


Embora seja um projeto hipotético, criado para a exposição, acreditamos nele e esperamos que o ITDP ajude na sua concretização, considerando que o instituto presta assessoria a várias prefeituras, inclusive a do Rio, afirma Duarte.


Há projetos ainda mais radicais na exposição, composta de fotos das cidades participantes (especificamente do recorte urbano escolhido), de desenhos de como essas áreas ficariam em 2030 e de maquetes dos locais replanejados. O mais polêmico é o de Nova York, criado pelo arquiteto Michael Sorkin para a região da ponte do Brooklyn, do lado de Manhattan. Sorkin propõe a implementação de vias para os ciclistas no nível mais baixo da ponte e a liberação da passagem elevada somente para pedestres, além da remoção da parte sul da estrada FDR Drive para a criação de um espaço verde público, com lojas e cafés.


O projeto de Buenos Aires compreende a área de La Boca, para a qual o escritório Palo Arquitetura urbana planejou um waterfront com acesso aos cafés, bares e clubes de tango já existentes, num espaço integrado com BFTs, táxis aquáticos e vias para pedestres e ciclistas.


De Guangzhou, o ponto escolhido foi o distrito de Liwan, que engloba a estrada elevada de Renmin. Desenvolvido pelo escritório Urbanus Architecture & Design, o projeto prevê a transformação da rodovia numa promenade elevada para pedestres e ciclistas e a criação de um corredor de BRT no andar de baixo, revitalizando a área comercial existente.


Somente com projetos dessa natureza é que poderemos reverter o quadro de domínio do tráfego de veículos no mundo, o que é um ponto chave para o desenvolvimento urbano, afirma Duarte.

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