*Eduardo Jorge Martins Alves Sobrinho
Li com entusiasmo o artigo de Ricardo Abramovay publicado na Folha, no último dia 14 (“Mobilidade versus carrocentrismo”), sobre o impasse entre expansão acelerada de veículos privados individuais (automóveis e motos) e mobilidade dos grandes centros urbanos.
Sua tese é o conflito entre desenvolvimento sustentável e trânsito progressivamente paralisado. Ele cita três questões ligadas ao problema: ineficiência energética dos veículos, necessidade de oferta maior de opções de locomoção e um possível compartilhamento dos carros.
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Nesse caso, o conflito com o chamado desenvolvimento sustentável -que é o equilíbrio entre os fatores social, econômico e ambiental- não se refere somente ao drama do trânsito ou da mobilidade.
Além desse ponto, outros temas são diretamente afetados pela hegemonia dos veículos individuais: a saúde pública e a crise climática (aquecimento global).
Em São Paulo, Rio, Brasília, Salvador, Porto Alegre etc., não há provavelmente fator de morbidade e mortalidade mais agressivo do que o produzido pelo impacto dos veículos na saúde pública. Seja a poluição que nos adoece e mata lentamente, seja a epidemia de acidentes que mata entre 40 e 50 mil brasileiros por ano.
Dos mesmos escapamentos saem também outros gases que atacam a saúde do planeta. No caso do Brasil, cerca de 50% das emissões são veiculares por uso de combustível fóssil, nossa principal contribuição para o aquecimento global.
Em São Paulo, desde 2005 algumas políticas públicas foram implementadas. Aumentamos a oferta de transporte público ampliando o número de ônibus, expandindo o metrô e modernizando os trens.
A Secretaria Municipal de Transporte, que coordena o trabalho de 15 mil ônibus, já conseguiu em pelo menos cerca de 1.800 deles ter ação inovadora de substituição do diesel: a recuperação dos ônibus elétricos, o início da frota de ônibus a etanol, o uso de 20% de biodiesel, os ônibus híbridos elétricos/diesel e os ônibus com diesel de cana.
O apoio ao uso da bicicleta também ajuda, e tudo isso é orientado pela lei climática municipal aprovada em junho de 2009.
A inspeção veicular diminui o impacto dos poluentes nos nossos sistemas respiratório e circulatório, além de reduzir o consumo de combustível fóssil e ser uma ação positiva para o clima.
No entanto, o conflito entre desenvolvimento sustentável e uso insustentável de veículos privados movidos a combustível fóssil precisa de uma ação mais severa.
O que está dando certo em cidades como Londres, Estocolmo e Singapura é o pedágio urbano. Ele não vem sozinho, porém apenas a sua implantação já faz cair em 15% o uso de veículos.
O recurso arrecadado pelo pedágio deve ficar em um fundo próprio vinculado à expansão da quantidade e da qualidade do transporte público. Isso permite que a cidade avance celeremente na oferta de mobilidade pública.
Kassab, Marta, Alckmin e Maluf, na última eleição para prefeito, em 2008, prometeram não implantar o pedágio urbano e tiveram 95% dos votos. A democracia, portanto, diz que o povo não aprovou o pedágio naquela ocasião.
Sugestão: fazer um plebiscito municipal fora do período eleitoral, para fugir da demagogia. Dois comitês, um favorável e outro contrário, teriam tempo suficiente para expor argumentos técnicos sobre o tema em um ambiente menos contaminado pela paixão política e pelo desejo de poder.
Uma última observação: o caso é grave e não pode esperar muito.
*Eduardo Jorge Martins Alves Sobrinho, 61, médico sanitarista, é secretário municipal do Verde e do Meio Ambiente de São Paulo. Foi secretário de Saúde nas gestões Luiza Erundina e Marta Suplicy
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