Pressionada a adotar uma estratégia mais amigável ao mercado, mas sem renunciar ao “apetite” desenvolvimentista, a presidente Dilma Rousseff já começou a definir os direcionamentos da política econômica para um eventual segundo mandato. O Estado apurou que ajustes importantes serão feitos na condução da economia no campo fiscal, de infraestrutura e cambial.
Depois de 8 anos e 6 meses de Guido Mantega, o Ministério da Fazenda trocará de mãos, como já antecipou a presidente. Embora Dilma proíba qualquer discussão na campanha quanto a nomes de substituto, o próprio governo avalia algumas propostas. Uma delas seria a colocação de um empresário para comandar a Fazenda, num plano que seria amarrado com a elevação do Ministério do Planejamento para a linha de frente macroeconômica. “Dividir um pouco o poder e colocar duas vozes com força para defender a economia”, segundo um auxiliar presidencial afirmou, em entrevista gravada.
A política fiscal vai mudar. No Palácio do Planalto e também no Ministério da Fazenda há um consenso de que devem ser terminadas as operações chamadas nos bastidores de “duvidosas”, como os atrasos nos repasses de recursos do Tesouro Nacional à Caixa e à Eletrobras promovidos para melhorar pontualmente as despesas federais.
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Há na campanha presidencial, no Planalto e também na Fazenda uma visão de que o governo deve apresentar em 2015 um esforço de recursos muito inferior no ano que vem, na faixa de 1% a 1,4% do Produto Interno Bruto (PIB). Essa meta seria considerada “realista”, diante do quadro atual: as receitas estão em baixa e o PIB está saindo de uma recessão. “Se não conseguimos chegar a 1,9% do PIB em 2014, como aumentar em 2015? É preciso ser realista”, disse fonte graduada do governo.
Questionado sobre o assunto para esta reportagem, Mantega afirmou que não concorda com a definição de uma meta fiscal menor para o ano que vem. “Não concordo. O caminho agora é de um aperto fiscal maior no ano que vem, como forma de abrir espaço para o corte de juros”, disse. Mas o ministro não fará parte de um eventual segundo mandato de Dilma.
Segundo o professor Luiz Gonzaga Belluzzo, que esteve com Dilma na quarta-feira em Campinas, o debate sobre a política fiscal “está distorcido” na campanha presidencial. “Parece que é fácil fazer um superávit fiscal com economia crescendo a zero. A austeridade não resolve o problema do crescimento, mas agrava, como vemos na Europa. O momento é outro. Quando a economia voltar a crescer, é claro, o esforço fiscal deve aumentar mesmo”, disse.
Câmbio. Segundo outro conselheiro presidencial, Dilma entende que o real deve se desvalorizar mais para poder trazer competitividade para a indústria brasileira. No entanto, tendo a mudança de política do Fed (o banco central dos EUA) colocada para 2015, a presidente pode aguardar os reflexos disso no Brasil para promover a desvalorização desejada apenas aproveitando a “janela de oportunidade”.
Quando o Fed voltar a elevar os juros nos Estados Unidos, o fluxo de capitais hoje concentrado nos países emergentes, como o Brasil, deve se inverter e fluir para os EUA, provocando uma desvalorização das moedas. Foi o que ocorreu no fim de 2013, quando o Fed começou a sinalizar este cenário.
Antes disso, entre o fim de 2011 e o início de 2013, o próprio governo Dilma perseguiu uma desvalorização da moeda brasileira. De acordo com Mantega, é “arriscado fazer ajustes muito fortes em 2015, porque a indústria também importa insumos e pode ser impactada com uma desvalorização maior”.
Propostas. Estuda-se no governo a separação entre a Receita Federal e a Aduana. A ideia tem sido defendida internamente por Alessandro Teixeira, um dos coordenadores do programa do PT na eleição presidencial. Homem de confiança de Dilma, ele foi secretário executivo do Ministério do Desenvolvimento nos dois primeiros anos de mandato, antes de assumir cargo no Planalto.
A proposta é que, fora do guarda-chuva da Receita, os técnicos da Aduana poderiam ganhar mais autonomia e atuar mais fortemente na defesa dos exportadores brasileiros. Ao mesmo tempo, a Receita poderia ficar focada na arrecadação tributária, área onde a presidente Dilma Rousseff entende ser possível modernizar, para tornar o Fisco mais “amigável” e ágil no trato com o contribuinte. Ainda há resistências quanto a esta separação.
Na área de infraestrutura, o governo já tem definido que, se consórcios privados manifestarem interesse, os aeroportos de Salvador (BA), Recife (PE), Vitória (ES) e Curitiba (PR) podem ter seu controle transferido das mãos da Infraero. No máximo dois entre esses 4 terminais seriam leiloados. O governo avalia abrir a licitação ainda no fim de 2015, de forma a colher resultados no fim do próximo mandato.
O governo também garante ter sinal verde dos bancos privados quanto ao modelo de financiamento e operacionalização das concessões de ferrovias. De acordo com uma fonte, a presidente pode anunciar os primeiros leilões ainda em novembro, em caso de vitória nas eleições.
Na área de portos, o Planalto mantém o tom de indignação com o TCU que, segundo um auxiliar presidencial, “travou totalmente” o setor por dois anos. “Passadas as eleições, o TCU haverá de liberar, porque a razão da trava terá acabado.”
O governo teme as consequências de uma mudança na política monetária nos Estados Unidos, que provavelmente ocorrerá em 2015. As concessões de infraestrutura, na visão do governo, devem “voar” justamente para criar um canal paralelo de entrada de dólares no Brasil. “A insegurança de cenário será em 2015. Quando o mercado se estabilizar quanto ao Fed, o quadro deve ser outro a partir de 2016”, disse um economista que já participou do governo federal.
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