Florianópolis lidera o Índice de Desenvolvimento Humano (IDH-M) entre as capitais brasileiras e é um dos principais destinos turísticos do país. Contudo, seus atrativos também trazem problemas aos moradores e visitantes. Entre 2000 e 2010, a população cresceu o dobro da média nacional. Congestionamentos de trânsito fazem parte do cotidiano das 900 mil pessoas que vivem nos 13 municípios da região metropolitana. Um estudo técnico propõe atacar a questão de forma integrada, priorizando o transporte coletivo e o não motorizado. O BRT (sigla em inglês para ônibus de trânsito rápido) é recomendado como principal alternativa de transporte, por ser mais barato que os sistemas sobre trilhos e demandar menor tempo de implantação.
Com 97% do território situados em uma ilha, a cidade sofre as consequências do planejamento errático da ocupação do solo e do modelo de desenvolvimento focado em rodovias. Florianópolis é a segunda capital brasileira na proporção de carros por pessoa – 2,14 por habitante -, atrás apenas de Curitiba. Na região metropolitana, 48% dos deslocamentos se dão de carro e motocicleta, contra apenas 27% de ônibus. Sua malha viária é a pior entre as 27 capitais brasileiras e a segunda pior do mundo, num universo de 120 cidades analisadas em pesquisa do arquiteto e urbanista Valério Medeiros, da Universidade de Brasília (UnB), com dados atualizados em 2015.
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Um estudo de 5 mil páginas, divulgado em 27 de novembro, dá respaldo técnico às políticas públicas que estão sendo planejadas na área. Resultado de três anos de trabalho, o Plano de Mobilidade Urbana Sustentável da Grande Florianópolis (Plamus) faz um diagnóstico da situação e recomenda uma série de ações até 2040. O Plamus foi realizado por um consórcio de empresas (Logit, Machado Meyer Sendacz Advogados e Strategy&), com financiamento não reembolsável do Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES). Sua premissa é a promoção do desenvolvimento urbano orientado pelos eixos de transporte de massa.
“Já fazemos isso em Curitiba desde os anos 1970”, diz o engenheiro e urbanista Cassio Taniguchi. Ex-prefeito da capital paranaense, ele assumiu em fevereiro a Superintendência de Desenvolvimento da Região Metropolitana da Grande Florianópolis (Suderf), autarquia criada pelo governo de Santa Catarina para coordenar as ações de mobilidade urbana na região. Taniguchi destaca a importância do controle social para que o plano não sofra descontinuidade. Estima-se que as ações vão demandar investimentos de R$ 3 bilhões e devem representar economia de R$ 1,38 bilhão à sociedade, somente com ganho de tempo. O edital para o BRT será lançado no primeiro trimestre de 2016.
O estudo recomenda a ampliação de ciclovias – dos atuais 64 km de trechos fragmentados para 350 km em rede conectada; o transporte aquaviário complementar e o uso de veículos menores para transporte de carga. Também propõe a construção de 146 km de ruas completas – para veículos motorizados, ciclistas e pedestres – e 30 km de ruas Zona 30, em que a velocidade máxima é de 30 km/h. Se adotadas essas soluções, até 2040 o tempo médio de viagem com transporte individual deve cair de 29 para 22 minutos e o de transporte público, 60 para 40.
“O estudo limpa a discussão sobre alternativas de modos de transporte”, diz Werner Kraus Júnior, professor do Departamento de Automação e Sistemas da Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC), que dá suporte técnico ao Plamus. “Podemos agora nos concentrar na política pública voltada para a região metropolitana.”
Ele lembra a importância do Estatuto da Metrópole, promulgado em janeiro, que estabelece diretrizes de governança interfederativa, com prevalência do interesse comum sobre o local.
O arquiteto Lino Peres, coordenador do Grupo de Estudos de Mobilidade Urbana e Sustentável da UFSC e vereador de Florianópolis (PT), avalia que o estudo é um avanço, mas só sairá do papel se houver vontade política: “Vai ser necessário ter integração institucional entre os municípios e qualificar profissionais que ataquem um conjunto de políticas públicas”, afirma. “Não há como desarticular mobilidade urbana do Plano Diretor e da exploração imobiliária, que tem empurrado a população de baixa renda para os municípios vizinhos.” Peres critica a falta de participação popular no Conselho Municipal de Transportes.
“É uma luzinha no fim do túnel, mas depende da mobilização da sociedade”, opina Anita Pires, presidente da ONG FloripAmanhã, que incentiva o desenvolvimento planejado da cidade. “Tudo o que puder qualificar o transporte, a princípio, é visto com simpatia, mas não adianta ter BRT em um regime de concessão como este, que não tem controle público nenhum”, comenta Victor Khaled, militante do Movimento Passe Livre. A organização foi fundada como movimento nacional depois da “Revolta da Catraca”, uma série de protestos em 2004 e 2005 contra o aumento de tarifas de ônibus na capital catarinense.
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