CSN tenta superar a retração do país com maior exportação

Diante de um cenário de forte queda na demanda por aço no mercado interno, competição global com produtos chineses e expressiva queda nos preços dos minérios de ferro ante os patamares de quase US$ 150 a tonelada de três anos atrás, a Companhia Siderúrgica Nacional (CSN), desde o ano passado, tenta atravessar, sem muita turbulência, este momento difícil da economia, que pode perdurar até 2017. Com a escalada da dívida e queima de caixa, a empresa, a partir do ano passado, tomou medidas de curto e médio prazos. Selecionou um pacote de ativos não estratégicos para vender e fazer caixa e trabalhou na rolagem da dívida que vencia neste e no próximo ano. Obteve postergação de vencimentos de R$ 5 bilhões, 70% do total nos dois anos.

A aposta é que a partir de 2018 a maré ruim do mercado se reverta, e a companhia alcance a tranquilidade, voltando a ter uma forte geração de caixa. Atualmente, o resultado operacional anualizado é de pouco mais de R$ 3 bilhões, o suficiente para pagar os custos da dívida. O endividamento líquido, no fim de março, era de R$ 26,6 bilhões, e a alavancagem financeira batia em 8,7 vezes o Ebitda.

À frente desse processo, está Benjamin Steinbruch, principal acionista, presidente do conselho e executivo-chefe da empresa desde 2002. Para ajudá-lo na empreitada, em março do ano passado, o empresário trouxe de Brasília para a CSN o executivo Paulo Rogério Caffarelli, com longa carreira no Banco do Brasil e que tinha passado pela Secretaria Executiva do Ministério da Fazenda. Steinbruch reforçou o time também com outros ex-ministros, a quem foram delegadas missões nos negócios da ferrovia Transnordestina e da área de logística portuária.

Caffarelli, advogado com mestrado em Economia, assumiu o cargo de Diretor Executivo Corporativo.
Recentemente, também a diretoria de Relações com Investidores. Ele relata que a rotina de trabalho, nestes 15 meses, tem sido exaustiva, com reuniões comandadas por Steinbruch que avançam noite adentro até que se esgote o assunto, às vezes até nos fins de semana.

“Acompanhar o ritmo intenso de Steinbruch requer muita disposição”, afirma. Com fama de centralizador, o empresário despacha até meia-noite e quer estar a par de cada detalhe do que acontece no dia a dia da companhia.

O pacote de ativos colocados à venda vai desde terminal de contêineres, participações em duas hidrelétricas, ações na ferrovia MRS Logística, a fatia na Usiminas até a fabricante de latas de aço Metalic.

Abaixo, a íntegra da entrevista com Caffarelli, na sede da CSN.

Valor: Como a companhia está gerenciando sua elevada alavancagem financeira, que mais do que dobrou no último ano?

Paulo Caffarelli: Estamos trabalhando na venda de ativos, com a finalidade de abater dívidas; vamos buscar a otimização da geração de caixa (Ebitda), por exemplo, com ganhos financeiros do caixa da companhia; redução das despesas gerais dentro de um programa que traçamos; e rigidez no Capex (programa de investimentos).

Valor: O mercado está à espera de que aconteça, de fato, a venda prometida de um dos ativos.

Caffarelli: Prevemos anunciar a primeira venda neste semestre. E outras deverão vir ao longo do ano. O importante é que a CSN, além de seu “core business” [negócio principal], tem uma série de ativos de valores expressivos que, no nosso objetivo de redução da alavancagem, pode ser parte da solução.

Valor: O endividamento da empresa beira R$ 27 bilhões.

Caffarelli: A rolagem dos vencimentos de 2016 e 2017 com o banco do Brasil e Caixa Econômica Federal, R$ 4,8 bilhões, nos deu um tempo razoável para fazer qualquer tipo de transação. Assim, não somos obrigados a nos desfazer de ativo por preço não justo. Com isso, podemos ditar as regras do jogo no processo de venda.

Valor: Como está o perfil da dívida da companhia?

Caffarelli: A CSN está bem equilibrada: 51% da dívida é em moeda estrangeira com 53% da receita no mercado externo. Se olharmos o Ebitda (resultado operacional), ainda é 60% gerado no mercado interno. Isso nos traz uma relação de equilíbrio, porque temos um hedge natural em termos de receita e dívida.

Valor: Como a companhia está agindo para enfrentar o atual cenário de retração no mercado de aço?

Caffarelli: Com a desvalorização do real, as importações caíram bastante, permitindo ocupar espaços no mercado interno. E temos os melhores custos de produção de placas em relação aos competidores – US$ 272 a tonelada no primeiro trimestre. E fazemos agregação de valor aos nossos produtos: hoje, os aços revestidos representam 58% das vendas totais. Chega a 77% das vendas no exterior. Até a recuperação do mercado interno, continuamos com a estratégia de ampliar as exportações, ainda com benefício do câmbio.

Valor: Qual a estratégia da companhia neste cenário adverso que enfrenta, tendo uma elevada dívida para administrar?

Caffarelli: O foco é aumentar as vendas em todos os setores de demanda de aço e trabalhar, arduamente, na redução das despesas não operacionais. Estamos cortando 35% dessas despesas, o que representa R$ 1,4 bilhão.

Valor: Na sua avaliação, qual a taxa de dólar adequada para ser competitiva na exportação?

Cafarelli: Estamos trabalhando com a previsão de R$ 3,80, do Focus, mas com tendência de baixa. Esse é um patamar bom para exportação. A cada desvalorização de US$ 0,25 do dólar em relação ao real, o Ebitda da área de mineração varia R$ 150 milhões. E a cada US$ 5 de alta ou baixa no preço da tonelada do minério, o Ebitda da empresa nessa área tem variação de R$ 450 milhões. Estamos bastante otimistas com as perspectivas com o mercado de minério de ferro no futuro.

Valor: Além disso, que outras medidas foram tomadas pela CSN?

Caffarelli: Tivemos a concretização das negociações com o consórcio asiático, que levou à criação de uma grande de minério de ferro verticalizada na plataforma mina-ferrovia-porto, a Congonhas Minérios. Com isso, garantiu contratos de compra com os membros do consórcio por 40 anos, de 7,5 milhões de toneladas ao ano, podendo aumentar no futuro. Em função desse off-take, ganhamos condições de utilizar exportações para securitizar como lastro para tomada de funding no mercado asiático comparativamente mais baratas que no mercado interno. A juros básicos de 2,5% ao ano, ante custo aqui 115% do CDI. E esse acerto retirou da CSN uma série de obrigações que tinha durante a criação da Namisa.

Valor: Com que cenário de mercado a CSN está trabalhando para o minério de ferro?

Caffarelli: Na faixa de US$ 55 a US$ 60 a tonelada neste ano, mas o orçamento da companhia está pautado em US$ 46,50 a tonelada. Em 2015, o preço chegou a bater em US$ 34. Acreditamos que deverá estabilizar num patamar de US$ 70 a US$ 75 entre 2018 e 2019. Nesse patamar, ganhamos uma condição de margem bem significativa. No quarto trimestre de 2014, o custo de equilíbrio era US$ 53,30. Em 2015, com esforços mais câmbio, baixamos para US$ 33,3 e, neste ano, já chegamos a US$ 31,20 por tonelada. Estamos entre os cinco melhores custos de produção de minério do mundo.

Valor: Quanto de minério a CSN prevê produzir e vender neste ano?

Caffarelli: Vamos produzir em torno de 30 milhões de toneladas e vender 36 milhões de toneladas, somando as compras de terceiros. A grande parte para exportação. Agora, a CSN é também uma cliente da Congonhas Minérios e até de terceiros. A Usina de Volta Redonda vai demandar 5 milhões de toneladas neste ano.

Valor: Qual o plano que tem para a Congonhas Minérios, depois da criação da fusão da Namisa com Casa de Pedra, ferrovia e porto?

Caffarelli: Nosso plano, no futuro, é chegar a 60 milhões de toneladas de produção e vendas. Vamos respeitar o comportamento do preço no mercado. Isso significa dobrar a capacidade atual. No porto, já estamos aptos a movimentar 45 milhões de toneladas. Também vamos para 60 milhões de toneladas. Os investimentos serão graduais até atingirmos essa meta. Hoje, mais de 60% dos embarques vão para Ásia. O restante para Europa e Oriente Médio.

Valor: A CSN está também neste ano enxugando investimentos?

Caffarelli: Desembolsamos R$ 2,2 bilhões no ano passado. Para 2016, prevemos R$ 1,2 bilhão, já considerando gastos correntes e manutenção e expansão das operações. O nome do jogo é liquidez: aumentar as vendas, reduzir despesas e preservar o caixa, que é superior a R$ 6 bilhões.

Valor: A empresa decidiu ser seletiva no plano de investimentos?

Caffarelli: Grande parte do orçamento para o ano, mais de 40%, é para concluir projetos de cimento em Arcos, com instalação de novo forno. Com isso, vamos passar de 2,3 milhões para 4,3 milhões de toneladas de capacidade de produção. Com perspectiva de em para 4,3 milhões de toneladas de capacidade de produção. Com perspectiva de em 2018 somar mais 1 milhão de toneladas com novo projeto no Sudeste, e a empresa se tornar uma das grandes players do país em cimento. Vamos nos preparar para a retomada do mercado a partir de 2017, e temos a vantagem de vender ensacado, que tem maior margem. No primeiro trimestre nossas vendas cresceram mais de 15% – já o setor caiu 7%.

Valor: A ações da Usiminas são um dos ativos à venda, mas a empresa vive crise e está depreciada.

Caffarelli: A CSN investiu mais de R$ 3 bilhões na empresa e isso, agora, vale menos de R$ 500 milhões. Temos de lutar pela sobrevivência da Usiminas. Os concorrentes da CSN e dela são as siderúrgicas chinesas, que inundam o mercado global. Queremos que a empresa retome o crescimento e se fortaleça no mercado.

Valor: Mas a CSN foi contra o aumento de capital da Usiminas, de R$ 1 bilhão, que visa a dar fôlego enquanto faz rolagem da dívida…

Caffarelli: Não somos contra. Queríamos, sim, que ele fosse precedido pela distribuição de resultado da Musa [controlada de mineração], que tem R$ 1,3 bilhão em caixa. Nossa proposta era que a capitalização completasse as necessidades dela após a distribuição do caixa da Musa.

Valor: Com autorização do Cade, questionada na Justiça com ações dos sócios controladores, a CSN fez a indicação de três representantes ao conselho da Usiminas.

Caffarelli: São conselheiros independentes, cuja função é contribuir para a gestão da empresa e o alinhamento entre os acionistas [Nippon Steel e Ternium-Techint, controladores, estão envolvidos em uma disputa societária há dois anos]. Queremos que volte a ocupar lugar de destaque no país. O que mais nos incomoda na Usiminas é o volume de contrato existentes entre partes relacionadas, principalmente com Nippon. Temos informações de R$ 13 bilhões.

Valor: E como fica a situação da ferrovia Transnordestina?

Caffarelli: A CSN vem fazendo a sua parte. Já pôs o dinheiro que era de sua competência colocar. Agora, conta com a contrapartida dos aportes da Valec [estatal ligada ao Ministério dos Transportes], do governo e de outros órgãos, como fundos federais.

Valor: A questão ambiental enfrentada pela CSN com comunidades e órgãos ambientais do Rio de Janeiro está de vez resolvida?

Caffarelli: A assinatura do termo de ajustamento de conduta (TAC) com o governo do Rio e a Secretaria de Meio Ambiente deixou a CSN em conformidade com todas as suas obrigações ambientais, podendo operar com tranquilidade a usina de Volta Redonda. É um processo que vem desde 2009, a partir de 114 itens que exigiram investimentos de R$ 214 milhões. Outros TACs foram assinados e, agora, firmamos o último, com investimentos de R$ 178 milhões. Ao todo, já foram aportados R$ 463 milhões na questão ambiental da usina. Na época de sua criação, não havia tantas exigências, e nós estamos compromissados, fazendo todas as adequações pedidas.

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