O efeito da Operação Lava-Jato sobre o grupo Odebrecht mal
se vê no resultado consolidado do grupo em 2015, que tanto demorou a ser
divulgado. Explica pouco do prejuízo de R$ 297,7 milhões do ano passado,
causado em sua maior parte pelo efeito negativo da alta do dólar sobre as
dívidas internacionais.
A receita líquida consolidada do grupo subiu de R$ 95
bilhões para R$ 124 bilhões. O lucro operacional, antes do financeiro, cresceu
mais de 35% e ficou em R$ 13,65 bilhões.
Sobre a linha final, pesou mesmo a dívida de mais de uma
centena de bilhão. O grupo Odebrecht fechou dezembro com R$ 110 bilhões em
dívida bruta, para R$ 25 bilhões em caixa. Em 2014, o total bruto devido era de
R$ 88 bilhões.
O desempenho operacional superior reflete, principalmente, a
melhoria no balanço da controlada petroquímica, a Braskem, e também o foco
internacional no setor de construção, que trouxe receitas em dólares, além da
maturação de alguns projetos da Odebrecht Transport.
É só nas letras miúdas das notas explicativas e na ressalva
do auditor independentemente, a PricewaterhouseCoopers (PwC), que estão as pistas
sobre as consequências da prisão de Marcelo Odebrecht, neto do fundador,
acionista e ex-presidente da organização. O empresário está preso há mais de um
ano. A crise de credibilidade, que atingiu a empresa em cheio num momento de
retração da economia, dava sinais de que se transformaria em
desafio de liquidez ao longo deste ano de 2016.
O registro das contas a receber mostrava que
alguns clientes arrastavam os pagamentos, fazendo com que o dinheiro levasse
mais tempo para chegar no caixa das companhias.
O saldo dessa conta subiu de R$ 19 bilhões para mais R$ 31
bilhões, ao fim de 2015. Do total, a Odebrecht Engenharia e Construção
respondia por 70% do saldo. A explicação para o aumento mistura o efeito
cambial sobre o valor dos contratos e um aumento no prazo concedido aos
clientes para o pagamento.
O poder público era o maior devedor, com R$ 22
bilhões, do total. A linha, porém, não trata apenas do poder público nacional.
Quem tem os maiores débitos abertos são os governos nos quais a Odebrecht Engenharia
e Construção atua, alguns financiados pelo BNDES.
A Odebrecht, em meio ao turbilhão da Lava-Jato, terminava
2015 ciente de que enfrentaria quase R$ 23 bilhões em vencimentos neste ano
(mesmo valor de seu saldo em caixa), enquanto os clientes pediam mais prazo, a
economia se retraia e os bancos ficavam cada vez mais avessos a fornecer novas
linhas.
Em seu relatório sobre o balanço, a PwC afirma que as
demonstrações refletem de forma apropriada a situação patrimonial e financeira
da Odebrecht e de suas controladas.
Contudo, a auditoria faz uma ressalva: não sabe como estimar
quais serão as consequências da Lava -Jato sobre o futuro da companhia e suas
finanças, incluindo uma possível antecipação dos vencimentos financeiro pelo
descumprimento de cláusulas de liquidez do negócio.
Boa parte da demora na publicação do balanço da Odebrecht
deveu-se à discussão sobre como refletir no resultado os possíveis efeitos da
Lava-Jato. Após muito debate, a PwC assinou o balanço mesmo sem que a companhia
fizesse uma provisão, uma estimativa para as penas e multas que pode sofrer.
A companhia é alvo de uma ação civil pública do Ministério
Público Federal (MPF), aberta em março, no valor de R$ 7,3 bilhões. Além disso,
em 30 de maio, a Advocacia Geral da União (AGU) abriu outras duas ações, num
total de R$ 12 bilhões, contra diversas companhias que atuavam em consórcios,
incluindo a Odebrecht.
Desde 22 de março, a Odebrecht tornou pública sua atenção de
colaborar e buscar um acordo de leniência junto aos órgãos públicos competentes.
O acordo, porém, ainda não foi concluído. O tema fica sob sigilo máximo e a
companhia não comenta.
O desafio pega em cheio as finanças do grupo pois diversas
instituições ficam proibidas de fornecer recursos à organização, em função das
acusações de improbidade administrativa.
O grupo está prestes a concluir a reestruturação da dívida
da Odebrecht Agroindustrial, o que tira a espada que estava sobre a holding.
Mas o futuro depende da normalização dos pagamentos pelos clientes e dos
repasses do BNDES, além do acesso a novas linhas de capital. A leniência, mais
uma vez, volta a ser questão mais determinante.
O balanço de 2015 mostra que cinco grandes unidades do grupo
mostravam excesso no passivo circulante frente aos ativos: Odebrecht
Agroindustrial, Óleo e Gás, Transport, o estaleiro Enseada e a Energia. Ou
seja, mais a pagar do que a receber.
A Odebrecht mantém a aposta na venda de ativos como fonte de
liquidez extra para o período de dificuldade. Prevê obter até R$ 12 bilhões até
junho de 2017. Logo no início dos comentários sobre 2015 escreve: a
organização se prepara para atravessar os próximos anos com liquidez e
endividamento mais adequados ao momento.
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