Infraestrutura e faxina regulatória

O Brasil está em crise – política, econômica e social. Mas,
no campo da infraestrutura, é um país de oportunidades. Temos muito a fazer, a
construir e a investir. A recente decisão de intensificar as parcerias do setor
público com o setor privado – consubstanciada na Medida Provisória (MP) n.º
727/16 – trouxe algum otimismo ao mercado pelos pressupostos que explicita:
parcerias como política de Estado, ampliação da competição, aumento da
segurança jurídica, redução da burocracia e fortalecimento da regulação. É
preciso, no entanto, modelar processos que contenham esses pressupostos e sejam
atrativos aos investidores e usuários.

Das diversas formas de parceria possíveis, entendemos que
aquelas que ensejam recursos públicos para lhes dar viabilidade são de difícil
consecução. Por outro lado, as chamadas concessões integrais são as que têm
maior chance de darem certo, desde que revestidas de regras claras, seguras e
com modelos atrativos.

Concessão não é obra pública. Concessão é prestação de
serviços. Obras são temporárias, de curto prazo. Serviços são perenes, de longo
prazo. Assim, as concessões devem conter prazos contratuais que justifiquem os
pesados investimentos exigidos e a manutenção e operação das vias –
normalmente, acima de 20 anos para a completa amortização e remuneração dos
ativos. No setor de rodovias, só 12% da extensão total é pavimentada e, destes,
cerca de 10% são concessionados.

Nos atuais modelos de concessão de rodovias vê-se que a cada
projeto estudado as tarifas alcançam patamares que podem se revestir de
verdadeiras impedâncias à competitividade dos produtos e ao desenvolvimento
econômico regional. Quando o governo anuncia um programa de concessões o faz
explicitando o volume bilionário dos investimentos (o que não é ruim, mas é
conceitualmente insuficiente como razão da parceria!). O mais adequado, para
demonstrar a importância dos projetos, seria explicitar os benefícios que as
parcerias trarão à economia: qual a redução do custo logístico? Qual o efeito
no aumento da competitividade dos produtos? Quais os reflexos no
desenvolvimento da produção por melhoria de competitividade? São respostas
fundamentais que subsidiarão as decisões governamentais num processo de
priorização de parcerias.

No setor ferroviário as dificuldades são maiores, tanto do
ponto de vista da viabilidade financeira do projeto quanto da modelagem
operacional a ser implantada. Um projeto ferroviário greenfield (com
investimento da ordem de R$ 10 milhões por km de via) dificilmente é
financeiramente viável só com recursos privados – algum recurso público, a
fundo perdido, é necessário para complementar sua rentabilidade e consequente
atratividade. Caso contrário, as tarifas não serão atrativas ao usuário e todo
o projeto se perde.

No momento, com o País com contas públicas deficitárias, é
quase impossível contar com esse aporte. A nosso ver, os projetos cujas
parcerias podem ser viabilizadas sem recursos públicos são aqueles referentes
aos trechos da Valec Engenharia, Construções e Ferrovias S.A. já praticamente
implantados: Palmas a Anápolis (em Goiás) até Estrela D’Oeste (em São Paulo).

No entanto, num cenário de competição e integração modal
como apregoa a MP 727, precisamos responder: Como inserir a competição nas
ferrovias, se o seu atual modelo de exploração é de monopólio? Como permitir o
transporte por operadores ferroviários independentes? Como integrar as malhas,
se as atuais concessionárias não permitem o direito de passagem? As respostas a
esses questionamentos são fundamentais para que as decisões do poder concedente
promovam a materialização das parcerias no setor ferroviário.

Finalmente, para dar sustentação aos modelos e aderir aos
pressupostos da MP, será necessário realizar uma verdadeira “faxina
regulatória”, com objetivo de completar a base normativa, eliminar excessos,
reduzir a burocracia e construir um cenário de regras claras, duradouras e de
longo prazo.

Luis Henrique Teixeira Baldez – É presidente executivo da
Associação Nacional dos Usuários do Transporte de Carga (Anut)

 

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