Preço para usar metrô e BRT afasta usuários de legado olímpico no Rio

O operário Jean Lourenço, 21, esperava no ponto na tarde de
quarta (21) pelo ônibus que o levaria do trabalho, no Leblon (zona sul do Rio),
para casa, em Santa Cruz (zona oeste), numa viagem de duas horas, com tarifa de
R$ 3,80.

Ele teria a opção de economizar meia hora num transporte
novo e mais confortável: a linha 4 do metrô integrada ao BRT Transoeste
(corredor de ônibus moderno). Mas, como explica, não é bem uma questão de
escolha. “Não dá para mim”, diz Lourenço, em referência ao custo para
desfrutar do legado olímpico nesse deslocamento –inicialmente, R$ 7,90, e, com
desconto, a partir desta segunda-feira (26), R$ 7.

Entregue para os Jogos de 2016 depois de R$ 10,4 bilhões de
gastos, a linha 4 do metrô do Rio (para ligar Ipanema à Barra da Tijuca)
estreou nesta semana a integração tarifária com o BRT, mas numa condição
incapaz de atrair usuários mais pobres que pagam a passagem do próprio bolso.

“Quando falaram que iria abrir metrô aqui, fiquei
animado, achei que pagaria a mesma coisa. Ter metrô e BRT ajudou muita gente,
mas também deixou muitos na mesma situação de antes. Esse é o meu caso”,
conta Lourenço.

“Para a gente que se esfola para ganhar pouco, esse
dinheiro faz falta”, explica a doméstica Maria Santos, 38.

“Melhora um bocado [o tempo], mas ainda precisa baixar
esses R$ 7 para valer a pena pegar o metrô”, diz o segurança José
Nascimento.

DESCONTO

A integração entre a linha 4 e o BRT transportou 100 mil
pessoas diariamente durante os Jogos Olímpicos do Rio. Agora, o gasto extra
mensal para quem usava ônibus e quer mudar para o novo sistema mais rápido (com
metrô e BRT integrados) pode chegar a R$ 128 por mês, considerando só viagens
em dias úteis. Para quem ganha um salário mínimo, equivale a 14% do que recebe
no mês.

A previsão é que a integração entre os dois transportes
atraia 75 mil pessoas por dia, já incluídos aqueles que utilizam vale-transporte.

O preço de R$ 7 representa um desconto de 11% em relação à
tarifa integral do metrô e do BRT individualmente. Mas é o menor abatimento
entre todas as integrações de transporte coletivo do Rio -que variam de 12% a
50%.

Em São Paulo, a tarifa integrada entre ônibus municipais,
metrô e trem é de R$ 5,92 -um desconto de 22,1%.

Considerando outras capitais brasileiras, o abatimento nesse
novo transporte no Rio supera o de Porto Alegre (10,1%), mas perde também para
as integrações do Recife (14,8%), Belo Horizonte (16,4%), Brasília (36%) e
Salvador (50%), segundo dados fornecidos pelo IPTD (Instituto de Políticas de
Transporte & Desenvolvimento).

Num contexto global Londres tem desconto de 16,7% e
Santiago, de 46,4%. E há metrópoles com tarifa única e baldeações ilimitadas
entre ônibus, metrô e trens.

QUEM PAGA

“O problema do Rio é o que muitas cidades enfrentam.
Por um lado, esse valor de R$ 7 é alto demais para a maior parte da população.
A média das tarifas no Brasil está entre R$ 3 e R$ 4. Por outro lado, há um
custo operacional desses transportes. Alguém tem que pagar”, afirma o
superintendente da ANTP (Associação Nacional de Transportes Públicos), Luiz
Carlos Mantovani Néspoli.

Atualmente, operadores privados são contratados pelo poder
público para fazer a gestão de transporte, ainda que seja um serviço público.
“Em alguns casos, o governo dá subsídios. Mas isso obriga o Tesouro a
tirar recursos de outras pastas, como educação e saúde. E, num momento de
crise, com baixa arrecadação, se torna mais difícil para o Estado prover esse
subsídio”, afirma.

O prefeito do Rio, Eduardo Paes (PMDB), chegou a citar a
crise econômica antes de acertar a integração do BRT com o novo metrô pelo
preço de R$ 7. “Não é uma tarefa simples porque nesse momento de crise
econômica ninguém quer abrir mão de receita. O Estado não tem condições de
aportar recursos para subsidiar”, disse.

O coordenador de gestão da demanda por viagens do IPTD,
Diego Silva, questiona se os recursos investidos na construção da linha 4 do
metrô valeram o investimento.

“Precisaríamos fazer uma análise mais minuciosa. Mas a
crítica que fazemos é que, apesar de ter investido no transporte de massa, o
metrô, também foram abertas novas vias para carros entre a zona sul e
Barra”, afirma Silva, citando a duplicação do elevado do Joá, que liga São
Conrado à Barra da Tijuca, mesmo trajeto feito pela linha 4.

‘GRANDE DIFERENÇA’

A Secretaria de Estado de Transportes do Rio, responsável
pelo metrô, diz que 72% da demanda da linha 4 será formada por passageiros
oriundos do transporte público e 28% por pessoas que utilizavam transporte
privado, conforme estudo da FGV (Fundação Getulio Vargas).

A pasta afirma que a estação Jardim Oceânico, onde ocorre a
integração entre o metrô e o BRT, será a de maior demanda. “Vale ressaltar
que a tarifa de integração foi definida entre as operadoras dos sistemas de
metrô e BRT, com base no estudo de demanda”, afirma.

Responsável pelo BRT, a prefeitura diz que era necessária a
integração tarifária para permitir “que o cidadão use a rede de transporte
de alta capacidade economizando”. Ela afirma que a economia diária será de
R$ 1,80 o que representa, em um ano, R$ 475,20, “valor que faz grande
diferença para quem utiliza regularmente o transporte público”.

A prefeitura lembra que não há subsídio público na
integração tarifária do BRT com o metrô. Estima que a integração vá beneficiar
75 mil pessoas diariamente.

Afirma ainda que, há seis anos, o serviço de transporte
público no Rio chegava a ter cinco tarifas diferentes, que variavam de R$ 2,85
a R$ 5,40, dependendo de o coletivo ter ar-condicionado e considerando a
distância percorrida. “Ou seja, quem morava nas áreas mais distantes
pagava mais caro.”

E cita a criação do Bilhete Único Carioca, em 2010, que
permitiu que o passageiro usasse até dois transportes no período de até duas
horas e meia, pagando apenas uma passagem.

“Atualmente, o usuário pode pegar até três transportes
pagando apenas R$ 3,80, quando um dos transportes for uma alimentadora de BRT
(linha alimentadora + BRT + ônibus). A prefeitura entende, portanto, que a
integração tarifária entre BRT e metrô vem a ampliar o benefício da política
tarifária para a população carioca”, diz.

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