Estrangeiro reduz aportes em grandes obras

A tentativa do governo de atrair investidores estrangeiros
para a nova rodada de concessões de obras de infraestrutura para a iniciativa
privada deve encontrar desafios nada desprezíveis, na avaliação da Sociedade
Brasileira de Estudos de Empresas Transnacionais e da Globalização Econômica
(Sobeet). De acordo com boletim sobre concessões e privatizações da organização,
o investidor estrangeiro tem participado menos dos projetos realizados no
Brasil nos últimos três anos.

Entre 2010 e 2013, do total de R$ 156,9 bilhões anunciados
para obras de infraestrutura, 45,5% foram de responsabilidade de empresas de
capital exclusivamente estrangeiro. Entre 2014 e o primeiro semestre de 2016,
último dados disponível, o volume de anúncios caiu bastante, para R$ 50,7
bilhões, e a participação dos estrangeiros diminuiu para 29,1%.

Os dados consideram os anúncios de investimento coletado
pela Rede Nacional de Informações sobre o Investimento (Renai), do Ministério
da Indústria, Comércio Exterior e Serviços (Mdic), sem considerar os projetos
de capital misto (parcerias entre investidores locais e estrangeiros).

Luis Afonso Lima, presidente da Sobeet e autor do estudo,
avalia que a participação menor dos estrangeiros no setor de infraestrutura
está relacionado a fatores externos e internos.

Dados do Banco Mundial mostram que os investidores de países
desenvolvidos têm reduzido o direcionamento de IED para infraestrutura em
emergentes, em particular para a América Latina, com queda de 58% entre 2012 e
2015. No Brasil, afirma, o risco regulatório e a instabilidade política parecem
funcionar como agravante desse cenário, diz Lima.

Para Afonso, o investidor estrangeiro parece mais
interessado no mercado consumidor doméstico, e por isso a infraestrutura é uma
parcela pequena do total dos aportes. Em 2015, segundo dados do Banco Central,
os setores ligados a infraestrutura (óleo e gás, eletricidade,
telecomunicações, saneamento, transporte e obras de infraestrutura) ficaram com
25,5% dos US$ 57 bilhões que ingressaram no Brasil na forma de investimento
estrangeiro direto para participação no capital de empresas. O setor de
serviços, por sua vez, abocanhou 46,2% desses investimentos.

Para Lima, porém, os dados do Banco Central ainda refletem,
em parte, concessões realizadas ao longo do primeiro mandato da ex-presidente
Dilma Rousseff. Para ele, os anúncios de investimentos divulgados pelo Mdic
indicam que a infraestrutura deve perder fôlego nos próximos anos. De fato, até
setembro de 2016, 19,4% do IED foi direcionado para o setor, e mais da metade
disso (11,4%) ficou com dois ramos: eletricidade e óleo e gás.

Além da infraestrutura ainda ser um pedaço pequeno do
investimento direto, os setores mais visados pelos estrangeiros não são aqueles
mais destacados no Programa de Parcerias de Investimentos (PPI), a vitrine das
concessões de infraestrutura do governo Michel Temer, destaca Lima.

Segundo os dados da Renai, de todos os anúncios de projetos
no setor entre 2010 e o primeiro trimestre de 2016, 63% foram de empresas de
telecomunicação.

Lima pondera, no entanto, que os números podem subestimar a
participação do capital externo em outras áreas, como rodovias e aeroportos,
porque o levantamento não considerou anúncios em que uma empresa estrangeira se
associa com uma companhia já instalada no país.

Nas áreas visadas pelas concessões, essa costuma ser a forma
de participação mais tradicional dos estrangeiros.

De qualquer forma, afirma o presidente da Sobeet, o Brasil
precisará fazer um esforço grande para atrair o capital externo para os leilões
projetadas para os próximos anos. Ele considera positivo o esforço que o
governo de Michel Temer tem feito em viajar para outros países para apresentar
as oportunidades de investimento. “O governo vai ter que gastar bastante
sola de passado, bater em muita porta, que parece que é o que está sendo
feito”, diz.

O ambiente regulatório também precisa melhorar para garantir
a participação dos estrangeiros, diz o economista.

Em evento no começo do mês, a presidente do BNP Paribas,
Sandrine Ferdane, afirmou que dificilmente o investidor estrangeiro trará
recursos para o Brasil para financiar projetos de infraestrutura, devido ao
descasamento cambial entre os investimentos em dólar e a receita em reais. O
país, disse, precisará inovar com fontes locais de recursos. “O investidor
estrangeiro deve participar no máximo com equity”, disse.

Mario Mesquita, economista-chefe do Itaú, também avalia que
a participação do investidor estrangeiro vai esbarrar no problema colocado pelo
risco cambial. “Enquanto isso não for resolvido, e não está claro como
será resolvido, haverá dúvida [sobre a participação]”. Para Mesquita, o
estrago reputacional do governo anterior na área também pode afastar
investidores.

O governo tem tentado encontrar uma solução para proteger os
estrangeiros interessados do risco cambial. Entre as alternativas levantadas, o
Banco Central poderia, por exemplo, aumentar a oferta de swaps cambiais e
emitir títulos conversíveis, mas sempre restritos aos investidores nas
concessões de infraestrutura, segundo reportagem do Valor. A equipe econômica,
porém, não teria simpatia por esse mecanismo.

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