Empresas de porte médio ficaram frustradas com o edital do
governo paulista para a concessão de 574 km da rodovia SP-333, entre Florínea e
Igarapava, no centro-oeste do Estado. Alegam que, ao contrário do que o
governador Geraldo Alckmin (PSDB) sinalizou ao anunciar o pacote de concessões
no fim de 2015, o edital recém-lançado tira do páreo pequenas e médias empresas
ao concentrar os desembolsos com a outorga na largada. O governo contesta.
O valor da outorga fixa mínima é considerado alto – R$ 794
milhões – e 50% do pagamento será na assinatura do contrato. Vence quem der o
maior ágio sobre a primeira parcela. Os 50% restantes serão pagos em 2018,
quando o vencedor assumirá um trecho hoje sob concessão da Arteris. A entrega
de propostas está agendada para acontecer no fim de fevereiro, em leilão na
BMFBovespa.
Governos estaduais e o federal adotaram nos últimos anos um
discurso de flexibilizar as regras das futuras concessões para atrair empresas
de porte médio. O discurso veio na esteira dos problemas que as grandes
empreiteiras, que costumeiramente dominam o mercado, tiveram por envolvimento
na Lava-Jato, com consequências como falta de financiamento.
“Do jeito que veio, parece que o objetivo é fazer
caixa”, afirmou ao Valor o presidente da Comissão de Obras Públicas,
Privatizações e Concessões da Câmara Brasileira da Indústria da Construção
(COP-CBIC), Carlos Eduardo Lima.
Durante o período que antecedeu a publicação do edital
definitivo, representantes desse segmento pediram uma maior diluição do
pagamento da outorga ao longo da concessão – válida por 30 anos.
“Ouvimos pelo menos 18 empresas médias que têm
interesse na licitação, mas nem em consórcio elas têm condições de
entrar”, disse Lima. O patrimônio líquido mínimo exigido para habilitação
é de R$ 238,3 milhões. Para as licitantes reunidas em consórcio, o valor sobe
para R$ 274 milhões.
Paulo Nunes Lopes, presidente da MGO Rodovias, que
administra um trecho da BR-050 entre Goiás e Minas Gerais, diz que o grupo tem
interesse em disputar a licitação, pois a rodovia paulista tem conexão com a
federal. Contudo, ele avalia que os desembolsos – além da outorga, o vencedor
terá de investir R$ 3,89 bilhões ao longo dos 30 anos – exigem uma associação
com “alguém de peso”. Notadamente um operador estrangeiro ou um sócio
forte financeiro, disse.
Para Lima, da COP-CBIC, “é a troca de um modelo de
concentração de grandes empresas nacionais por outro modelo idêntico de grandes
empresas estrangeiras, com todos os riscos que a concentração gera, inclusive
desvios éticos.”
“Além da outorga, que é muito cara, há os primeiros
investimentos e o BNDES só empresta 50%. É um volume muito grande para um risco
alto”, afirmou Lopes. O governo paulista já obteve a carta de intenções do
IFC, do Banco Mundial, para financiar até 30% do negócio.
A MGO Rodovias é resultado de um consórcio de nove empresas
de porte médio que arrematou em 2013 o lote federal de 436,6 km. O critério da
licitação foi o maior desconto sobre a tarifa.
Karla Bertocco, subsecretária de parcerias e inovação do governo
de São Paulo, diz que há um ruído de interpretação. “Colocamos até
cláusula de saída. Está disciplinada no contrato uma cláusula de saída que
prevê riscos, indenização”. Karla admite que as empresas médias costumavam
ter mais dificuldade por conta da atestação. Dessa vez, não há exigência
técnica que limite a participação delas. “Não é um edital em que as
empreiteiras vão ser as proponentes e vão tocar sozinhas o negócio com o
financiamento do BNDES. Se as críticas vêm daqueles que querem reproduzir o
modelo anterior, isso não é viável hoje em dia”, disse.
O diretor-geral da agência reguladora do Estado, Artesp,
Giovanni Pengue Filho, nega que o critério seja arrecadatório. “O que
tentamos fazer foi melhorar os mecanismos de financiabilidade. A modelagem
econômica se mostrou mais viável dessa forma a qualquer tipo de
investidor”. A proposta inicial de edital da SP-333 já previa a
concorrência por maior valor de outorga, inclusive um montante mais alto – R$
845 milhões -, mas com pagamentos em parcelas trimestrais ao longo de três
anos.
Segundo a Artesp, essa condição dificultaria a captação de
financiamento. Já a nova modelagem, com pagamento em duas parcelas, deve
facilitar o financiamento da outorga – seja por meio de debêntures ou por
captação no exterior com a garantia da proteção cambial, conforme consta do
edital.
Pengue Filho destaca ainda que o edital traz critérios que
abrem o mercado para mais competidores. Entre eles, cita a diluição do
investimento principal entre o segundo e oitavo anos (e não mais nos cinco
primeiros); a proteção cambial para financiamento no exterior; e a antecipação
da cobrança do pedágio, que poderá ser feita seis meses após a assinatura do
contrato, desde que a concessionária cumpra o plano intensivo inicial.
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