Desempenho da indústria reforça freio no investimento

O desempenho negativo da produção industrial não para de
surpreender. Em outubro, houve queda de 1,1% em relação ao mês anterior, feito
o ajuste sazonal, com resultados especialmente ruins da fabricação de bens de
capital e bens intermediários (insumos e matérias-primas), justamente os
segmentos que deveriam puxar a recuperação. O elevado grau de endividamento das
empresas e a grande capacidade ociosa ajudam a explicar a atividade anêmica da
indústria, num cenário em que os juros ainda estão muito elevados. A produção deve
encolher mais uma vez no quarto trimestre, voltando a crescer apenas em 2017.

O recuo em outubro levou a indústria para o mesmo nível
registrado em dezembro de 2008, “no pior momento da crise global”,
como lembra o economista-chefe da corretora Tullet Prebon, Fernando Montero.
“Com exceção daquele breve tombo extraordinário, a indústria precisaria
recuar até janeiro de 2004 para registrar patamar equivalente”, diz ele.

Depois de subir entre março e junho na série que desconta
efeitos sazonais, a produção industrial ficou estável em julho e caiu 3,7% em
agosto, acendendo a luz amarela sobre o que parecia ser o início da retomada,
ou no mínimo a estabilização. Em setembro, houve uma alta modesta, de apenas
0,5%, seguida pela contração de 1,1% em outubro. Para o economista Rafael
Bacciotti, da Tendências Consultoria, o crescimento observado em alguns meses
deste ano tinha “bases muito instáveis”, influenciada pela melhora da
confiança empresarial, que tem demorado a se refletir nos indicadores de
atividade.

Na visão de Bacciotti, “fatores intrínsecos” ao
atual ciclo recessivo têm pesado sobre a indústria, atrasando a retomada da
produção. As empresas, assim como as famílias, estão muito endividadas, diz
ele. Para o economista Igor Velecico, do Bradesco, a estabilização das
condições financeiras em níveis ainda restritivos, depois de uma melhora ao
longo do primeiro semestre, ajuda a entender o comportamento da indústria no
período mais recente. Essas condições são influenciadas por um conjunto de
diversos elementos, como a situação do setor externo, o comportamento do
mercado de capitais, o crédito bancário e a curva de juros, diz ele.

“Ainda é incerto se a indústria flerta com a
estabilização ou se há uma nova rodada de deterioração”, resumem os
economistas da Rosenberg Associados. A consultoria nota que a queda em relação
ao mesmo mês do ano anterior, de 7,3%, foi a 32ª consecutiva nessa base de
comparação.

O resultado da produção de bens de capital e de insumos
típicos da construção civil em outubro mostrou que o panorama para o
investimento segue muito ruim. Isso ocorre mesmo depois de, no terceiro
trimestre, a formação bruta de capital fixo (FCBF, medida do que se investe na
construção civil, máquinas e equipamentos e pesquisa) ter recuado 3,1% na
comparação com o trimestre anterior, acumulando uma queda de quase 28% em três
anos.

Em outubro, a produção de bens de capital teve retração de
2,2%, a quarta baixa seguida. No período, a fabricação desses produtos caiu
9,5%.

Já a fabricação de insumos típicos da construção civil
recuou 3% em relação a setembro, de acordo com o ajuste sazonal da Rosenberg.
“Atingimos o pior momento da série histórica, iniciada em 2002, em termos
de produção do setor, bem abaixo do pior nível registrado durante a crise de
2009”, diz a consultoria. “Com a desaceleração das concessões de
financiamento imobiliário e o mercado de trabalho em deterioração, sem
mencionar o imbróglio em que a construção civil se encontra por conta da
Lava-Jato, a tendência é de continuidade da produção de insumos típicos no
atual patamar, com recuperação lenta.”

Para o Bradesco, a expectativa é de nova queda da FCBF no
quarto trimestre. Além dos números negativos da produção de bens de capital e
insumos típicos para construção, “o arrefecimento da confiança do
empresariado industrial e a queda das importações nos últimos meses” devem
levar a novo recuo do investimento.

A produção de bens intermediários também voltou a
decepcionar. Depois de ter subido 0,9% em setembro, caiu 1,9% em outubro.

Dos 24 setores indústria, nada menos de 20 viram a produção
recuar em outubro na comparação com setembro, como destaca a Rosenberg. A
fabricação de produtos alimentícios caiu 3,1% e a de veículos, reboques e
carrocerias, 4,5%.

Nesse cenário de terra arrasada, a indústria tem grande
ociosidade. O nível de utilização de capacidade instalada calculado pela
Confederação Nacional da Indústria (CNI) baixou de 77% em setembro para 76,6%
em outubro, o menor nível da série com ajuste sazonal iniciada em 2003. Montero
diz que isso, porém, não conta a história toda. “Os atuais mínimos na
utilização de capacidade começam a perder quase três pontos percentuais
comparativamente a recessões anteriores, o que é muito”, escreve ele.

Pelo lado da demanda, essa ociosidade retarda a volta dos
investimentos, afirma Montero. Ao mesmo tempo, garante a folga na oferta para
responder a essa demanda mais lenta. “São duas forças, ainda que cíclicas,
para [que haja] menos juros na retomada cíclica à frente”, diz ele.

Os estoques da indústria, por sua vez, parecem ajustados,
segundo Velecico. Para ele, isso indica que eles não devem derrubar a produção,
como ocorreu nos muitos meses em que estavam acima do desejado, mas tampouco
tendem a dar grande impulso à atividade.

O desempenho fraquíssimo da indústria em outubro é um sinal
que reforça as apostas em queda do setor – e do PIB – também no quarto
trimestre. Se a produção industrial ficar estável em novembro e dezembro, ela
registrará queda de 2% nos três últimos meses do ano. A recuperação da
indústria, com isso, deverá ficar para o ano que vem. O problema é que o ritmo
da retomada pode não ser dos mais animadores.

Além da ociosidade monstruosa, as empresas se encontram em
situação financeira delicada, com dívidas elevadas. Um corte de juros mais
acentuado pode dar algum alívio, ao permitir a renegociação dos débitos a taxas
mais baixas. A questão é saber qual o ritmo de redução da Selic a ser adotado
pelo Comitê de Política Monetária (Copom). Neste ano, o Copom cortou a taxa em
0,25 ponto em cada uma das últimas reuniões, levando os juros básicos da
economia para 13,75%.

Bacciotti cita ainda a fraqueza do comércio internacional
como um fator que afeta a indústria, prejudicando as exportações das empresas
brasileiras. A valorização do câmbio, que ficou abaixo de R$ 3,15 em alguns
momentos do terceiro trimestre, também pode ter atrapalhado as empresas que
vendem ao exterior, avalia ele. O volume exportado tem caído nos últimos meses,
como ressalta o Bradesco, em relatório em que reduziu a projeção de expansão do
PIB de 2017 de 1% para 0,3%.

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