Porto seco entre Brasil e Argentina fica sem dono

O transporte ferroviário entre Brasil, Argentina e Uruguai
poderá ficar comprometido a partir do mês que vem. A Rumo ALL, empresa do Grupo
Cosan que administra dois portos secos (terminal alfandegado) em Uruguaiana e
Sant’Ana do Livramento, decidiu sair do negócio e devolver a permissão dada
pelo governo federal para prestar o serviço. Em carta enviada à estatal
ferroviária argentina Belgrano, obtida pelo ‘Estado’, a empresa afirma que
encerrará as operações a partir de 31 de janeiro.

Embora a decisão de devolver os dois portos já vinha sendo
esboçada desde o ano passado, a notícia pegou o governo federal no contrapé.
Segundo fontes, ninguém ainda sabe como resolver o problema. Uma nova permissão
demoraria algum tempo para sair e poderia prejudicar a importação e exportação
de produtos pelo corredor. Há quem aposte numa solução de mercado, que seria
transferir para outra empresa a administração os portos.

Procurado, o Ministério dos Transportes afirmou que quem
responde pelo assunto é a Agência Nacional de Transportes Terrestres (ANTT). O
órgão regulador, por sua vez, disse que instaurou procedimento interno para
apurar a informação e se manifestará no momento oportuno.

No fundo, uma das grandes preocupações é que a devolução dos
portos secos interrompa o tráfego ferroviário. A malha sul, como é conhecida,
inclui o Corredor do Mercosul para o Uruguai no porto seco de Sant’Ana do
Livramento e de Uruguaiana, que leva matéria-prima para as fábricas e
indústrias argentinas.

Importadores, exportadores e despachantes já enviaram uma
série de correspondências para a ANTT, Ministério dos Transportes e Casa Civil
alertando para o problema. O caso também está sendo acompanhado pelo Ministério
Público Federal no Paraná. Num dos trechos de carta enviada ao ministro da Casa
Civil Eliseu Padilha, os representantes do comércio exterior temem que, com a
decisão da Rumo, tratados internacionais de integração de aduanas sejam
descumpridos. E questionam sobre a possibilidade de a ANTT fazer uma nova
licitação para a malha sul.

Em nota, a Rumo admite que em 31 de janeiro fará a devolução
da permissão dos portos secos. Segundo a empresa, que já demitiu os
funcionários do recinto alfandegado, o contrato foi firmado em 2006 com a
União, pela antiga ALL. Em 2011, diz a companhia, a Receita emitiu uma portaria
autorizando a devolução. “A operação em questão não faz parte da estratégia da
Rumo que, desde a fusão com a ALL, concluída em 2015, vem realizando grandes
investimentos para promover o crescimento do modal ferroviário. O transporte
ferroviário de cargas segue normalmente na região”, destacou a empresa.

Mas, de acordo com exportadores, que preferem não se
identificar, a empresa vem minando o comércio exterior pelo corredor,
especialmente no trecho Tatuí (SP) – Uruguaiana (RS). Um usuário da malha
afirma que até 2015 transportava cerca de 1.500 contêineres. No ano passado, a
Rumo liberou apenas 200 contêineres. O resto teve de usar o transporte
rodoviário. Entre os produtos transportados pelo corredor, está bauxita, hidróxido
de alumínio, cerâmica e papel em bobina. No ano passado, foram despachados
5.500 contêineres. Na década passada, esse número ultrapassou as 20 mil
unidades. “Um transporte que durava 12, 15 dias passou a 40 dias. Isso faz com
que o cliente fuja da ferrovia”, disse um usuário.

Segundo essa fonte, há um movimento para alertar o governo
sobre o risco de extinção desse trecho. Atualmente, nesse trecho, a ferrovia
representa cerca de 15% do comércio entre Brasil e Argentina feito por
transporte terrestre. A ferrovia é usada mais por cargas de menor valor
agregado e de produtos não perecíveis. Ainda que esteja caindo, o transporte
sobre trilhos no corredor baliza o preço do frente rodoviários.

Prioridades. A incorporação da América Latina Logística
(ALL) pela Rumo foi um processo tumultuado. Na primeira oferta do Grupo Cosan,
em fevereiro de 2012, a companhia ofereceu R$ 896 milhões para entrar no bloco
de controle da ALL. Mas alguns dos sócios do bloco de c0ntrole – como a Petros
(Petrobrás) e o BNDES, sobretudo, foram contra e as negociações travaram. Meses
depois, Cosan e ALL voltaram a conversar.

Desde a incorporação, a Rumo passou a se concentrar em
alguns negócios. Um dos principais objetivos é a renovação da concessão da
Malha Paulista por mais 30 anos. A renovação está em negociação com o governo
federal e na ANTT. Mas ainda há uma série de pendências da concessão atual para
ser resolvida.

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