Ministério dos Transportes aluga prédio por até o triplo do preço de mercado em área proibida no Sudoeste

O Ministério dos Transportes, Portos e Aviação Civil fechou um contrato milionário para alugar prédio na 301/302 do Sudoeste, onde pretende acomodar 700 servidores da pasta. Acontece que a destinação dessa área é reservada a atividades comunitárias, de lazer, cultura ou para o funcionamento de escolas. E não há previsão legal para acomodar o serviço público no endereço. O desprezo pela legislação que rege o uso do solo no DF foi apenas uma das excentricidades da negociação, cujo valor chega a ser três vezes mais caro que o preço praticado no mercado.


Mesmo diante de impedimento explícito na Norma de Edificação, Uso e Gabarito vigente para a região (168/93), o contrato de R$ 87 milhões entre Ministério dos Transportes e a Itália Participações foi firmado em 17 de março de 2017, e seu registro publicado no Diário Oficial da União no último dia 24. A intenção do órgão é transferir as secretarias de Portos e de Aviação Civil para o novo endereço.


Em agosto de 2016, a Valec Engenharia, Construções e Ferrovias – empresa pública vinculada ao Ministério dos Transportes – já havia tentado transferir sua estrutura para o mesmo edifício. Na ocasião, o diretor de Administração e Finanças da Valec, Handerson Cabral Ribeiro, fez uma consulta formal à Administração Regional do Sudoeste/Octogonal.


O Metrópoles teve acesso ao ofício 3139/2016, que registra o pedido de informações da Valec a respeito da viabilidade de locação do imóvel para atividades burocráticas, e a negativa à solicitação.


No documento, é relatado um processo de chamamento público no qual o grupo HC Construtora (responsável pela empreitada), representada pela DBX Incorporações, aparece como a parte interessada em propor a locação.


 


“Diante de tal situação, visando a observância de regras e exigências instituídas por essa administração regional no processo de chamamento público em questão, consulto a esta diretoria a existência de norma que trate do uso do solo urbano do Sudoeste, na qual haja permissão de instalação de entidade pública como no caso da Valec”, diz um trecho do memorando protocolado na Administração do Sudoeste, às 10h26 do dia 29 de agosto de 2016.


 


Um dia depois, em 30 de agosto, a diretoria de obras da Administração Regional negou o pedido: “No caso específico do endereço EQSW 301/302 Lote 1, os usos permitidos são elencados na Norma de Edificações, Uso e Gabarito 168/93, e permitem os usos institucional ou comunitário com atividades nas áreas social, cultural, de lazer e de educação. Visto que não há mencionado o uso/atividade/tipo solicitado pelo interessado para o endereço citado, conclui-se a inviabilidade de localização”.


Ignorando a negativa de sete meses atrás, o ministro dos Transportes, Maurício Quintella Lessa, assinou o contrato de 120 meses (10 anos) para alugar o espaço. A impropriedade do endereço é apenas uma das condições adversas no trato. O prédio para onde o Ministério dos Transportes pretende se mudar em três meses não está pronto. Com fachada de vidros espelhados e acabamento em granito, o miolo do edifício está no esqueleto. Há três pavimentos e dois subsolos. Mas as salas não têm porta, a fiação que desce do teto é aparente e os cômodos não estão divididos. Os quatro elevadores não funcionam.


 


Preço 3 vezes acima do mercado


 


No total, o edifício da HC Construtora, administrado pela Itália Participações, tem 4.800 m². Como o contrato abrange 10 anos de vigência no valor de R$ 87.379.276,30, o custo mensal do aluguel sairá por R$ 728 mil. Assim, o metro quadrado custará aos cofres públicos R$ 151,70, muito acima do praticado no mercado de locação de prédios comerciais, cuja faixa de preço varia entre R$ 45 e R$ 60 o metro quadrado.


Recentemente, a Secretaria de Educação do Distrito Federal negociou a transferência de 1.387 servidores para um edifício de 18.000 m² no Plano Piloto. Nesse caso, o metro quadrado sairia a R$ 44, o que já foi objeto de crítica, pois era o dobro do aluguel pago pela pasta na locação em vigência. Localizados no Setor de Autarquias Sul, os prédios da Caixa Econômica Federal e do Ministério das Cidades custam à administração pública R$ 60 o metro quadrado.


 


O outro lado


 


Mesmo a Valec sendo uma empresa pública vinculada ao Ministério dos Transportes, a pasta informou oficialmente que não tinha conhecimento da restrição imposta pela legislação local para ocupar o prédio na quadra 301/302 do Sudoeste.


 


“O MTPAC não tem conhecimento desta restrição. De antemão, informamos que não consultamos o GDF e tampouco que tivemos a resposta de que a utilização era apenas para lazer ou educação”, disse a assessoria de imprensa do órgão ao Metrópoles.


 


A pasta, no entanto, condiciona a mudança para o novo endereço à apresentação dos documentos e cumprimento das normas estabelecidas em lei: “Os efeitos financeiros decorrentes desta contratação só começarão a ocorrer 30 dias após o recebimento definitivo do imóvel pelo MTPAC; recebimento este previsto para daqui a 90 dias, e somente ocorrerá se toda a documentação prevista em lei e no edital de chamamento público for apresentada”.


Em reposta à reportagem, a Administração Regional do Sudoeste/Octogonal confirmou o que já havia justificado à Valec em agosto de 2016, quando negou a autorização para a empresa pública ocupar o prédio no Sudoeste: “O endereço é reservado para cultura, lazer, atividades comunitárias ou escolas”. A administração de Portos e da Aviação Civil, definitivamente, não se enquadram nessas especificações.

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