A multinacional americana General Electric negocia sua
entrada no consórcio que pretende erguer a Ferrogrão. O projeto já atraiu
grandes tradings do agronegócio, mas elas se dispõem a bancar não mais de 40%
do investimento de R$ 12,6 bilhões e faltam outros sócios para aportar o
dinheiro restante. A GE deve entrar com 8%. Com isso, ganharia preferência no
fornecimento de locomotivas e vagões para a ferrovia, que deve ligar o
município de Sinop (MT) a Miritituba (PA).
Há um acordo de confidencialidade em torno das negociações.
Além da Estação da Luz Participações (EDLP), que atua como estruturadora do
projeto, o consórcio tem como âncoras cinco tradings: ADM, Amaggi, Bunge,
Cargill e Louis Dreyfus. Elas têm interesse na construção da ferrovia por causa
da queda nos custos de escoamento pela região Norte do país, mas veem com
cautela a possibilidade de imobilizar todo o capital suficiente para o projeto.
Outros 12% de participação estão sendo negociados com um fundo americano,
conforme antecipou o Valor no mês passado.
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Uma das formas aventadas pelo governo para preencher o que
falta no consórcio e viabilizar definitivamente a Ferrogrão é trazer dinheiro
chinês. O empreendimento deve estar nas prioridades do Fundo Brasil-China de
Cooperação para Expansão da Capacidade Produtiva, que começou a operar no
início desta semana. Esse fundo receberá aportes de até US$ 20 bilhões – dos
quais US$ 15 bilhões virão do Claifund, instituição oficial chinesa para
financiamento na América Latina.
O presidente da EDLP, Guilherme Quintella, pretende iniciar
em julho um “road show” para apresentar o projeto a potenciais
investidores na Europa, Ásia, Estados Unidos e Oriente Médio.
Os estudos econômicos para a abertura da audiência pública
que precede o leilão estão praticamente prontos. A tendência, entretanto, é dar
uma segurada no processo. Os técnicos do governo acreditam que isso permite ao
consórcio ganhar um pouco mais de tempo para se fechar e evita a contaminação
do projeto pelo agravamento da crise política. “Vamos guardar um
pouquinho”, diz uma fonte envolvida nos preparativos da concessão.
Há, contudo, uma mudança importante nos bastidores. A
intenção inicial do governo era conceder a ferrovia por 65 anos e dar um
período de 30 a 40 anos de exclusividade na operação dos trilhos. Depois, a
linha seria liberada para os operadores ferroviários independentes, conhecidos
no mercado pela sigla OFI. Trata-se de uma figura ainda incipiente no Brasil,
mas que deve se fortalecer com a ampliação da rede. São empresas que detêm
frota própria e prestam serviços de transporte ferroviário usando a malha de
outros.
O consórcio idealizador da Ferrogrão – batizado como
Pirarara em alusão a um peixe de água doce típico do Amazonas – combate essa
ideia desde o início e afirma que só existe viabilidade no empreendimento se
houver exclusividade na operação durante toda vigência do contrato.
Antes resistente aos argumentos do consórcio, o governo está
agora inclinado a barrar OFIs na ferrovia. Um técnico lembra que, se o preço do
frete ferroviário estiver alto demais, uma alternativa real aos produtores de
grãos será escoar suas cargas pela BR-163. A conclusão dos trabalhos de
pavimentação da rodovia está listada como prioridade no Projeto Avançar,
prestes a ser lançada pelo presidente Michel Temer, com foco em obras de
infraestrutura.
A flexibilização com o pedido de exclusividade nas operações
reflete os temores no governo de falta de interessados para compor o consórcio
e viabilizar a concessão. O Palácio do Planalto desconfia que as tradings, no
fundo, podem não entrar como sócias porque têm muito capital de giro, mas pouca
autonomia de suas matrizes para colocar “equity” em um projeto de
longo prazo.
Além disso, espera-se uma batalha na área ambiental para a
obtenção do licenciamento das obras. Mesmo assim, o governo está disposto a
soltar o edital da Ferrogrão no segundo semestre, em uma tentativa de avançar
nas discussões do empreendimento.
Procurado pelo Valor, o consórcio Pirarara negou a
existência de tratativas com a GE. A General Electric, por meio de sua
assessoria, disse que “não comenta especulações de mercado”.
“Com 97 anos de atuação no Brasil, a empresa tem sido uma das grandes
parceiras da infraestrutura nacional e segue focada em continuar desenvolvendo
avanços do país.”
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