Etanol começa a ganhar espaço no mix de produção das usinas

Depois de um período de quase duas safras marcado pela ampliação
das apostas na produção de açúcar para exportação, as usinas sucroalcooleiras
da região Centro-Sul começam a “girar a chave” das operações para
abrir mais espaço à produção de etanol, já que o biocombustível aos poucos
passa a proporcionar às companhias uma remuneração melhor que a da commodity.

Desde que o governo elevou as alíquotas de PIS/Cofins sobre
os combustíveis, o que deu maior competitividade ao etanol hidratado (usado
diretamente nos tanques dos veículos) em relação à gasolina nas bombas de
alguns Estados – incluindo São Paulo -, a demanda pelo produto reagiu. O
movimento garantiu cinco semanas consecutiva de altas do indicador de preços do
hidratado nas usinas do Centro de Estudos Avançados em Economia Aplicada
(Cepea/Esalq/USP).

William Hernandes, sócio da consultoria FG/A, afirma que
atualmente as vendas de etanol hidratado têm gerado às usinas uma remuneração
média entre 5% e 10% superior à do açúcar VHP – e, segundo ele, essa diferença
poderá aumentar para 15% a 20% durante a entressafra. Enquanto os contratos de
hidratado para entrega no curto prazo estão sendo negociados em torno de R$
1,41 o litro na B3, os de vencimento no fim do ano já se aproximam de R$ 1,60.

“Quem está segurando o etanol para entrega em dezembro
pode conseguir um ganho de 10%. No mercado de açúcar, não tem essa diferença
entre os contratos com vencimento entre outubro e março do ano que vem”,
diz Hernandes.

As cotações do açúcar continuaram pressionadas na bolsa de
Nova York, diante de uma safra internacional (2017/18, que terá início em
outubro) para a qual se espera superavit. Ontem, os contratos para outubro
caíram abaixo da “barreira” de 13 centavos de dólar a libra-peso; os
papéis para março de 2018 fecharam em 13,79 centavos, menor valor de um contrato
de segunda posição de entrega desde dia 29 de junho.

Tais oscilações não mudarão o tom mais
“açucareiro” desta safra em relação ao ciclo passado, avalia
Hernandes, mas vão atenuá-lo. Em 2016/17, 46,3% do caldo da cana processada no
Centro-Sul foi destinado à produção de açúcar, de acordo com dados da União das
Indústrias de Cana-de-Açúcar (Unica).

De qualquer forma, alguns executivos do segmento indicaram
que as apostas no etanol ainda poderão ser intensificadas com a volta das
chuvas no Centro-Sul, que forçam as usinas a parar as atividades – e, nesse
meio tempo, a programação de produção das unidades pode mudar.

Assim, a FG/A já ajustou suas estimativas de safra. A
consultoria passou a estimar a produção de açúcar do Centro-Sul em 36,7 milhões
de toneladas, ante as 37,2 milhões projetadas inicialmente. Para o etanol
(anidro e hidratado), a previsão foi elevada de 24 bilhões de litros para 24,3
bilhões. No novo cenário, 48,1% do caldo de cana processado na região será
destinado ao açúcar.

A mudança de cenário pautou todas as teleconferências das
empresas do segmento com ações negociadas em bolsa sobre os resultados do
primeiro trimestre da safra 2017/18. “Estamos analisando a possibilidade
de produzir mais anidro e hidratado para capturar essas diferenças de preço”,
disse em uma delas Paula Kovarsky, diretora de relações com investidores da
Cosan, que tem participação de 50% na Raízen Energia.

De acordo com a executiva da Cosan, o anidro já remunera
melhor que o açúcar em todos os Estados. Mas ela ponderou que a produção do
anidro consome mais vapor, o que reduz a cogeração em um momento no qual os
preços de energia elétrica no mercado livre dispararam e superaram a marca de
R$ 500 o megawatt-hora (MWh).

Rui Chammas, presidente da Biosev, afirmou, por sua vez, que
a companhia alterou o mix de uma de suas usinas em Mato Grosso do Sul mais para
o etanol no primeiro trimestre, e que as outras duas unidades no Estado
seguiram o mesmo caminho. “O mix pode mudar até em São Paulo”,
acrescentou. Mas o executivo ressaltou que essa dinâmica é “bastante
volátil”. A Biosev tem cinco usinas em São Paulo.

A São Martinho preferiu não alterar sua estimativa para o
mix e indicou que deverá continuar garantindo a produção de açúcar, boa parte
dela contratada tendo como referência os contratos para outubro na bolsa de
Nova York.

A empresa tem, contudo, cerca de 120 mil toneladas de açúcar
oriundas de cana própria com produção nesta safra e sem preço fixado, o que
deixa uma janela para uma eventual mudança de mix. “Há muita água para
rolar. Prestamos muita atenção para tomar decisões acertadas e manter as
melhores remunerações possíveis”, afirmou Fabio Venturelli, presidente do
grupo São Martinho.

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