Um grupo de 11 países, liderado pela França e Irlanda,
enviou carta à Comissão Europeia pedindo na prática para a Europa adiar a
oferta agrícola para o Mercosul, prevista para ser entregue na semana que vem
em Brasília, para permitir anúncio político de um acordo no fim do ano.
Áustria, Bélgica, França, Hungria, Irlanda, Lituânia,
Luxemburgo, Romênia, Polônia, Eslováquia e Eslovênia consideram
“intempestivo” que a oferta europeia inclua cotas (entrada de volume
limitada com tarifa de importação menor) para produtos como carne bovina,
etanol, açúcar e carne de frango, todos de interesse particular do Brasil.
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A Comissão Europeia está sob fogo cerrado dos
protecionistas. E dentro da própria Comissão, o braço executivo da UE, as
diretorias de Comércio e de Agricultura não se entendem sobre os volumes de
abertura agrícola para o Mercosul.
A expectativa é de que hoje à tarde a comissão volte a
discutir com os Estados membros para decidir o que fazer. O Valor apurou que
vários países insistem em acelerar a conclusão do acordo, tentando se contrapor
aos protecionistas liderados pela França de Emmanuel Macron, um presidente que
se diz modernista, mas mantém uma agenda agrícola protecionista.
Na carta enviada à Comissão Europeia, os 11 países alegam
que uma análise publicada em novembro pela UE concluiu que o impacto econômico
acumulado de futuros acordos de livre comércio sobre a agricultura europeia
cria riscos significativos para o setor, com deterioração na balança comercial
e preços mais baixos para produtos já vulneráveis, especialmente carne bovina,
etanol, açúcar e frango.
Na carta, os 11 países lembram que 12 ministros de Comércio
e 14 de Agricultura insistiram em março e junho deste ano por uma melhor
coerência entre as políticas agrícola e de comércio exterior, por exemplo,
sobre cotas que Bruxelas poderia oferecer. Os 11 países visivelmente querem
aumentar o custo político da comissão com uma oferta agrícola, talvez na
expectativa de também arrancar mais concessões do Mercosul.
Além de considerar “intempestiva” agora uma oferta
europeia incluindo produtos sensíveis, os 11 países insistem que, se uma oferta
for feita para o Mercosul, precisa respeitar dois pré-requisitos.
Primeiro, que a comissão elabore um método para definir um
nível máximo de concessões (volume, composição, administração de cotas), em
acordo com os países-membros. A ideia é levar em conta todas as concessões que
a UE já fez e as que deve fazer em negociações em curso (com Austrália, Nova
Zelândia, México), com um limite máximo para cada produto.
É a ideia do “bolso único”. Para os 11 países,
esse método deve em particular ser a base para eventual concessão envolvendo
produtos sensíveis, levando em conta a capacidade de absorção do mercado
europeu e as implicações do Brexit, a saída do Reino Unido da UE.
O segundo pré-requisito é que a UE inclua provisões na
oferta agrícola para assegurar um “level playing field” entre os
parceiros. Com ajuste nas cotas, mecanismos eficientes de salvaguarda e
condicionalidades não tarifárias, como rígidos padrões sanitários e
fitossanitários. “Esses instrumentos podem permitir a suspensão de
preferências comerciais”, diz a carta, ou seja, a UE poderia suspender a
redução tarifária ou cota oferecida ao Mercosul a qualquer momento que
considerar necessário.
A nova reação do bloco protecionista não surpreende. No
mínimo, mostra que a barganha final entre a UE e o Mercosul está realmente
próxima. O que chama atenção é a mesma postura da França com Macron, que
visivelmente entende que esse acordo vai além da parte comercial e é
estratégico para os dois lados.
O Brasil tem a presidência atualmente do Mercosul. E nessa
condição, a missão do Brasil junto à UE em Bruxelas intensificou a mobilização,
com contatos políticos com importantes negociadores da UE, embaixadores dos
países-membros, parlamentares.
A mensagem do Brasil e dos outros embaixadores do Mercosul
em Bruxelas é que o bloco do Cone Sul quer um acordo logo, mas que as
concessões devem ser equilibradas. Também nota que a negociação com o Mercosul
é a segunda maior da história da UE, em termos de PIB. Só a negociação da UE
com o Japão é maior, no momento. Significa que os europeus também têm muito a
ganhar, obtendo preferência (tarifa menor para exportar) num mercado até agora
fechado como o do Mercosul.
Isso é algo que uma parte da Comissão Europeia entende. Mas
a questão é se ela vai conseguir convencer os 11 países mais protecionistas a
aceitarem colocar na mesa a oferta agrícola na semana que vem em Brasília.
Sem essa oferta, fica difícil justificar uma delegação
europeia para negociar em Brasília com o Mercosul, sem as cifras prometidas de
abertura de mercado agrícola, em troca de ganhos nas áreas industrial, de
serviços e compras governamentais no Mercosul.
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