A fusão das operações ferroviárias da Siemens com as da
francesa Alstom é um marco para o maior conglomerado industrial da Europa, mas
também chega com um significado político mais profundo para seu
executivo-chefe, Joe Kaeser.
O negócio, segundo Kaeser, serviu para enviar um recado
político poucos dias depois de as eleições nacionais alemãs terem elevado a
extrema direita do Alternativa para a Alemanha à condição de terceiro maior
partido do país.
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A mensagem da fusão é bem clara: o espírito europeu
está vivo, disse a repórteres em Paris. É uma mensagem firme em
tempos que estão marcados pelo populismo, pelo nacionalismo, por divisões
sociais e políticas e por uma liderança egocêntrica.
Comentários como esses caracterizam Kaeser, de 60 anos, como
um executivo que se importa com mais que o retorno dos acionistas – em
particular, a defesa da noção mais ampla de responsabilidade empresarial, em um
momento no qual muitos mostram cautela excessiva ao falar de política.
Seria possível fazer isso sendo legal com todos; mas
essa não é a abordagem dele, diz Dieter Zetsche, executivo-chefe da
Daimler. Ele mantém-se firme em suas convicções. Não arrisca prejudicar
sua companhia, mas [se posiciona] na medida do possível.
Kaeser disse a repórteres: As pessoas que acreditam
que isto se trata apenas do trimestre ou maximizar o preço das ações; que
compram e vendem com base em rumores e transações – são responsáveis pelo mundo
estar dividido como nunca. Temos responsabilidade de congregar as
pessoas.
Neste ano, ele acompanhou a primeira-ministra da Alemanha,
Angela Merkel, à Casa Branca e explicou ao presidente dos Estados Unidos,
Donald Trump, por que a Alemanha exibe superávits comerciais tão grandes.
Eu disse a ele: tivemos que exportar muito para ter
tantos Mercedes na Quinta Avenida quanto iPhones na Alemanha, contou ao
jornal de economia alemão Handelsblatt. Não caiu muito
bem.
Kaeser, pai de duas filhas, também tem um lado ameno. É
conhecido pelo senso de humor, embora seu estilo se incline mais para
piadas de pai, ou o que um colega chama de o mundialmente
famoso humor alemão.
Quando perguntado por que a Siemens escolheu a Alstom em vez
da Bombardier para a fusão na área de trens, o executivo disse que a escolha
foi por ordem alfabética. Neste ano, quando uma conferência foi adiada por um
alarme de incêndio, disse que não precisavam se preocupar: o que estava pegando
fogo eram as ações da Siemens, perto do maior nível em 16 anos.
Nos últimos dois anos, as ações da Siemens valorizaram-se
quase 50%. Projeta-se aumento no lucro operacional deste ano para € 8,3
bilhões, em comparação aos € 5,8 bilhões de 2015, segundo a S&P Capital IQ.
Os números são reflexo do sucesso da iniciativa Visão
2020, que Kaeser lançou em 2014, um ano após ter passado de diretor
financeiro a presidente. Ele percebeu a necessidade de tornar o conglomerado
mais dinâmico e prepará-lo para a automação, a era industrial digital e o mundo
interconectado da internet das coisas.
Kaeser, que entrou na Siemens aos 24 anos, quer que o foco
da grupo seja direcionado aos negócios industriais principais, mas também quer
dar mais autonomia às unidades secundárias, para que possam operar mais como
uma frota de navios e não um desajeitado superpetroleiro.
Werner Wenning, presidente do conselho de administração da
Bayer e membro do conselho de supervisão da Siemens desde 2013, disse que
Kaeser foi um golpe de sorte para o grupo.
Ele foi capaz de, em um curto período, mudar a
Siemens, reestruturar a companhia, diz Wenning. Se você acompanhar
os últimos quatro anos, ele teve um desempenho absolutamente dentro do que
havia prometido. Em certos aspectos, [até] superior.
Em abril, a Siemens uniu a unidade de energia renovável com
a Gamesa, da Espanha. A Siemens tem fatia de 60%. O negócio com a Alstom segue
o mesmo modelo: a Siemens é majoritária, mas a empresa será administrada na
França. Um terceiro grande passo está previsto para 2018, quando a Siemens quer
abrir o capital de sua unidade de produtos médicos.
Lançamos muitos navios ao mar agora e, primeiro,
precisamos certificar que eles vão cumprir seu propósito, disse Kaeser ao
Financial Times. Estamos chegando muito, muito perto do que
eu sempre chamei de ‘a Siemens industrial’, com sinergias muito bem ajustadas
na cadeia de valor.
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