A construtora Camargo Corrêa começou a desvendar, em seu
acordo de leniência negociado com o Conselho Administrativo de Defesa Econômica
(Cade), a caixa de pandora de um esquema multimilionário de cartel para
construção e ampliação de linhas do metrô no país. Segundo as informações
prestadas pela empresa, o grupo operou entre 1998 e 2014 nos Estados de São
Paulo, Rio de Janeiro, Minas Gerais, Paraná, Bahia, Ceará, Rio Grande do Sul e
no Distrito Federal. No total, 21 licitações teriam sido alvo de tentativas de
manipulação por parte do grupo de construtoras, que contava também com as
empreiteiras Andrade Gutierrez, Odebrecht, OAS e Queiroz Galvão. De acordo com
o portal G1, nesta segunda feira o Cade deverá iniciar um processo
administrativo para analisar os fatos apresentados pela Camargo.
O acordo de leniência firmado pela empresa pode garantir
imunidade processual e permite que ela continue disputando contratos com o
setor público. O grupo de empresas envolvido com a prática do cartel se
autodenominava Tatu Tênis Clube, em referência ao tatuzão, equipamento usado
para escavar os túneis de metrô. De acordo com os depoimentos de executivos da
empreiteira, em São Paulo existem indícios de conluio em obras nas linhas
2-Verde, linha 4-Amarela, 5-Lilás e Monotrilho, mas em alguns casos o acordo
não teria se concretizado. Em nota, a assessoria do Metrô paulista informou que
tem interesse na “apuração das denúncias”, e que “continua à disposição das
autoridades”.
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No documento de 331 páginas produzido pelo Cade não é citado
o nome de nenhum governador – em São Paulo, durante o período de atuação do
cartel o Bandeirantes foi ocupado por Mário Covas (PSDB), Geraldo Alckmin
(PSDB), Cláudio Lembro (PFL), José Serra (PSDB) e Alberto Goldman (PSDB). Eles
sempre negaram envolvimento em qualquer malfeito, e sempre defenderam a tese de
que o Governo paulista foi uma das grandes vítimas do esquema. Alckmin, que
está em seu terceiro mandato à frente do Executivo estadual, é o virtual
candidato tucano para disputar a presidência no ano que vem. Delatado pela
Odebrecht, ele é alvo de um inquérito que tramita em sigilo no Superior
Tribunal de Justiça.
Em São Paulo o Ministério Público Estadual já apresentou
mais de oito denúncias por formação de cartel para disputa de obras do Metrô. A
maioria se encontra parada no Tribunal de Justiça do Estado, e as que avançaram
não chegaram a nenhum núcleo político, levando a julgamento apenas executivos.
Apenas uma obra tem o valor citado no documento do Cade: um
débito de 50 milhões de reais em favor da Andrade Gutierrez por obras na Linha
2-Verde, e outra um débito de 2 milhões para a OAS também pelo mesmo
empreendimento.
Segundo os documentos, a fase mais ativa do cartel ocorreu
entre 2008 e 2014, devido à injeção de recursos para obras do Programa de
Aceleração do Crescimento, o PAC. Durante o período o grupo firmou acordos com
frequência, de olho também nos megaeventos esportivos que ocorreram no país –
Copa do Mundo de 2014 e Jogos Olímpicos do Rio de Janeiro em 2016.
Inicialmente faziam parte do grupo apenas a Camargo Corrêa,
a Odebrecht e a Andrade Gutierrez, mas posteriormente a OAS e a Queiroz Galvão
se juntaram ao Tatu Tênis Clube. Elas também teriam atuado com construtoras
menores mas que possuíam bom trânsito local para facilitar as negociações.
As investigações da prática de cartel começaram após a 23ª
etapa da Operação Lava Jato, quando a Polícia Federal apreendeu um documento
com Benedicto Barbosa, então presidente da Odebrecht Infraestrutura, na qual
constavam algumas regras do clube da propina.
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