Males do monopólio

Não
dá para dizer, sem mais, que o lockout dos caminhoneiros é uma ação da direita
ou está sendo por ela impulsionada. Mas é fácil perceber que ele está
convulsionando o país e pode servir aos interesses dos que querem a volta pura
e simples da “ordem e da autoridade”.

Na
base do movimento, um protesto contra os preços do diesel e os impostos. Pode
fazer algum sentido. Na cúpula, porém, um show de chantagem e oportunismo, que
se aproveita da debilidade do governo e tenta surfar no ressentimento, na
irritação e na desconfiança da população.

Greve
de empresários é sempre complicada. Assusta e fomenta todo tipo de pânico.
Quando levada às últimas consequências, acende um rastilho, especialmente se
mexe com setores estratégicos como são os combustíveis e os alimentos. Num país
em que tudo é feito por rodovias, os caminhoneiros viram uma corporação
poderosa. Não foi por acaso que tanta gente lembrou, nos últimos dias, o papel
que tiveram no processo que levou à derrubada e ao assassinato de Salvador
Allende, no Chile do início dos anos 1970, matriz energética.

O
governo está cedendo, os caminhoneiros prometem manter a paralisação. Até onde,
ninguém sabe.

Fosse
outro o país e outra época, o melhor seria recuperar as ferrovias e
redimensionar o transporte rodoviário. De quebra, acelerar com radicalidade a
adoção de uma nova matriz energética. Quebrar a dependência que se tem dos
combustíveis fósseis, introduzir tecnologias ferroviárias de última geração,
enquanto os carros voadores não chegam. Tudo isso, porém, são tarefas para um
país de bravos, e hoje não vivemos num assim. Faltam-nos justamente os bravos,
os intrépidos, os sonhadores.

Partidos
políticos, candidatos e sindicatos de trabalhadores não se fazem ouvir, a não
ser discreta e isoladamente. Todos se comportam como reféns de uma situação que
pode fugir do controle e levar a que um fogaréu se alastre. Os candidatos, em
particular, morrem de medo de perder votos, mas no fundo não sabem mesmo o que
dizer.

Por
que não se trabalha para que a agenda do país passe a incluir a retomada do
transporte ferroviário? Por que os temas de fronteira — energia eólica e solar,
combustíveis vegetais, gás, biomassa — não ganham destaque no debate nacional?
Por que não se quebram os monopólios lesivos ao interesse público?

Podem
ser muitas as respostas, mas uma é imbatível: porque falta um mínimo de unidade
política, de projeto nacional, de articulação democrática.

Não
vale a pena assoprar as brasas ou buscar chifre em cabeça de cavalo. Sempre
haverá quem busque se aproveitar do caos, gente que se alimenta do caos e só
consegue viver a partir dele. São figuras conhecidas, que circulam há tempo com
esse programa. Mas também pode ser que tudo não passe de corporativismo, na sua
expressão mais miserável, aquela em que o interessado só pensa nos seus botões
e lixa-se para todo o restante, nem sequer se dando conta de que seus botões
podem prejudicar toda uma comunidade de pessoas muito mais prejudicadas.

Corporativismo,
oportunismo, chantagem, incapacidade de enxergar a floresta e autoritarismo
andam de braços dados. Diante disso, a opinião pública democrática precisa ter
papel ativo, no mínimo para denunciar uma atitude que no passado se chamava de
“lesa-pátria”.

 

– Fonte: http://politica.estadao.com.br/blogs/marco-aurelio-nogueira/males-do-monopolio/


Fonte: Estadão

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