O engenheiro Silvio dos Santos – grande especialista e professor da área de transportes, principalmente o ferroviário e também colunista do Portogente – assumiu, recentemente, o cargo de gerente de ferrovias da Secretaria de Estado de Transporte de Santa Catarina. Santos avisa que o estado catarinense tem interesse em potencializar o uso das ferrovias no transporte de cargas, por isso considera equivocada a política empresarial que demonstra desinteresse na Malha Sul que atravessa os estados do Sul do País. Por isso, as propostas formuladas pretendem aumentar o transporte de carga pelas ferrovias de Santa Catarina, que, em 2008, apresentava uma Divisão Modal para a ferrovia cinco vezes menor que a média brasileira: enquanto Santa Catarina transportava apenas 5% das cargas por ferrovia, o Brasil atingia 25%, condição que sobrecarrega o sistema rodoviário e praticamente esgota a capacidade com um transporte de 76% das cargas em caminhões.
Portogente – O senhor assumiu recentemente o cargo de gerente de ferrovias. Poderia nos fazer um balanço da situação que encontrou?
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Silvio dos Santos – Nossa ação aqui no Estado é para a gestão de políticas e acompanhamento, pois a ação ferroviária, legislação e investimento são de alçada federal. Inclusive as ferrovias estão arrendadas (ainda que falem que estão privatizadas). Aqui em Santa Catarina a Ferrovia Teresa Cristina, que carrega carvão aqui no sul do estado, é um arrendamento e no resto do Estado a antiga ALL [América Latina Logística], que hoje é Rumo é quem comanda a concessão.
Portogente – Qual terminal ferroviário atende a maior demanda em Santa Catarina?
Santos – O principal terminal ferroviário catarinense é o Porto de São Francisco do Sul, que é destino de produtos do complexo soja e contêineres, quantidades que atingiram praticamente 4 milhões de toneladas em 2015. Na importação, os volumes ferroviários vêm diminuindo desde 2008.
O trecho na Serra do Mar entre São Francisco do Sul e Mafra tem capacidade disponível para uma demanda eventual crescente, pois a ferrovia entre Paranaguá e Curitiba [ambos no Paraná], com condições mais restritas, já transportou 14 milhões de toneladas/ano, e a ligação de Campinas ao Porto de Santos [SP], depois das obras de melhorias e duplicação, está transportando 24 milhões de toneladas.
Portogente – Quais são as perspectivas que desenha em termos de demandas, necessidades e investimentos no setor?
Santos – Nossas ações vão no sentido de ampliar o uso da ferrovia, que perdem carga ano a ano, com exceção da Teresa Cristina, que alimenta a termoelétrica de Tubarão. A Rumo tem perdido carga devido a uma política equivocada de desinteresse na Malha Sul que atravessa o Paraná, Santa Catarina e Rio Grande do Sul. No Paraná ainda tem um movimento razoável e Apucarana e Londrina para o Porto de Paranaguá. Outro problema é que Santa Catarina não tem nenhum terminal de carga, então o trem que vem de São Paulo e passa por Santa Catarina, não carrega nada aqui, devido a falta de terminais. Estamos propondo a criação de alguns terminais para sanar essa dificuldade. Outro aspecto é que tentamos, há mais de 20 anos, criar os contornos ferroviários de Joinville e São Francisco do Sul. Fizemos os projetos, foi encaminhado ao Governo Federal, que começou a obra e parou, mas agora recomeça.
Portogente – Qual tem sido o volume de operações no Estado?
Santos – Apesar dessa malha ferroviária abrangente, o volume de carga na Região Sul tem diminuído muito, principalmente no Tronco Sul, ligação de São Paulo ao Rio Grande do Sul. O fluxo entre Tatuí em São Paulo e Uruguaiana, na divisa gaúcha com a Argentina, vem caindo desde 2009, chegando a zerar em 2018. Os quatro pares de trens diários que circularam nesse trecho representavam uma capacidade de transporte de 12 milhões de toneladas/ano que deixaram de ser utilizadas. Lages, a única estação de Santa Catarina no Tronco Sul, sem ter instalações adequadas para a movimentação de carga geral, deixou de movimentar bobinas de papel e contêineres desde 2012. Atualmente, nas instalações da base de distribuição da Petrobras, recebemos apenas combustível da Refinaria de Alberto Pasqualini na Grande Porto Alegre. Além da diminuição do volume de carga no trecho catarinense do Tronco Sul (Mafra-Lages), a falta de manutenção da via permanente tem levado a velocidade a valores inacreditáveis, com velocidades comerciais de 15 e 10km/h respectivamente.
Portogente – Em quais áreas pretendem priorizar os investimentos: portos, intermodais, ligação da indústria e agricultura do Oeste com o Leste do estado?
Santos – Com relação a novos projetos, temos estudos da ferrovia de ligação leste-oeste e a litorânea ainda na fase de viabilidade técnica e ambiental, que começaram nos anos 1990. Nos anos 2000 foram aprofundados e feito o projeto básico da litorânea. Mas tudo anda muito devagar. Essas decisões ficam no âmbito do Dnit [Departamento Nacional de Infraestrutura de Transportes] e da Valec. Estamos fazendo algumas ações de curto prazo, aumentando a utilização dos trechos existentes. Propusemos um primeiro trecho da ferrovia litorânea de Joinville-Araquari a Navegantes. O objeto é ligar a indústria aos portos para favorecer a exportação.
No oeste o objetivo é fazer um terminal em Curitibanos, Ponte Alta, um pouco para cima de Lages, para pegar um volume grande de carga de exportação que poderia ir para os portos de Itajaí, Navegantes e Itapoá e para o mercado interno de Rio de Janeiro, São Paulo e Minas Gerais. A Valec contratou, em 2010, o Projeto Básico de Engenharia e os Estudos Ambientais da Ferrovia Leste-Oeste de Santa Catarina, entre Itajaí e Chapecó, com 623km de extensão, com o consórcio Prosul/Urbaniza/Setepla. Os contratos também sofreram paralisações. Essas são algumas alternativas que vêm sendo analisadas para verificar a viabilidade do investimento.
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