A falta de interessados levou a Aeronáutica a adiar para o final do ano o leilão da sua primeira Parceria Público Privada (PPP). O contrato prevê o repasse do sistema de comunicação do controle de tráfego aéreo para a iniciativa privada por um prazo total de 25 anos. Na primeira tentativa de licitar o serviço nenhuma empresa se candidatou, apesar de algumas operadoras de telecom terem acompanhado o processo de perto. Apesar disso, a Força Aérea Brasileira (FAB) persistiu na adaptação dos termos do contrato com o objetivo de atrair interessados, mantendo a contrapartida máxima próxima de R$ 5 bilhões.
Este é um exemplo de como as PPPs ainda geram dúvidas entre empresas e investidores. Entre as principais queixas está a falta de segurança jurídica.
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O cenário de incertezas em torno do tema tem gerado uma série de iniciativas tanto no Senado quanto na Câmara dos Deputados com o objetivo de melhorar o ambiente de negócios nas esferas Federal, Estadual e Municipal. O movimento parlamentar está em linha com o atual momento do setor de infraestrutura, que ganha cada vez mais espaço na retomada da economia.
No Senado, o parlamentar Antonio Anastasia (PSDB-MG) apresentou há cerca de dois meses um Projeto de Lei (PL 3263/2019) em que propõe que Estados e Municípios possam utilizar os recursos de fundos públicos para honrar compromissos contratuais, além de servirem como garantia junto às instituições que financiam investimentos de PPPs. A proposta, se avançar, representará uma mudança importante Lei de PPP (Lei 11.079, de 30 de dezembro de 2004). O senador defende que a alteração dará mais segurança jurídica, estimulará novos contratos e reduzirá as despesas do Poder Público.
Sócio do escritório de advocacia Machado Meyer, José Virgílio Lopes Enei acredita que este é um momento em que o governo mantém um canal aberto para discussões nessa área com a participação da iniciativa privada e das universidades. “Vejo o governo bastante preocupado em ouvir, nem sempre concordando com as sugestões é claro, mas quando possível voltado a buscar soluções para fortalecer, desburocratizar e facilitar as PPPs e concessões”.
Logo depois do senador do PSDB apresentar seu PL, foi formada na Câmara dos Deputados uma Comissão Especial, presidida por João Maia(PL-RN) e relatada por Arnaldo Jardim (Cidadania-SP), que tem discutido possíveis aprimoramentos tanto nas regras das PPPs quanto nas que regem as concessões. Os detates têm atraído representantes do Ministério da Economia e Secretaria Especial da Programa de Parcerias de Investimentos (PPI).
Ainda é cedo para dizer quais proposições vão vingar, mas é possível destacar algumas, diz Enei, especialista em PPPs. “Uma delas prevê o aumento do limite das PPPs para Estados e Municípios. Hoje, eles estão limitados para que no longo prazo não comprometam mais de 5% da receita liquida. A proposta é que não sejam computadas despesas já anteriormente incorridas e meramente requalificadas como PPPs. Hoje, a regra prevê a inclusão de toda a despesa na PPP, não só o gasto incremental”, explica o sócio do Machado Meyer. Discute-se também a possibilidade de aumentar a fatia da receita líquida para 10%.
Outra mudança que deve ser aprovada é a redução do valor dos contratos, atualmente de R$ 20 milhões. Se a proposta que está sendo discutida na Câmara avançar, esse valor cairia para R$ 10 milhões, permitindo assim que municípios menores também passem a adotar o modelo de PPPs para atrair investimentos em seus projetos.
Dentre outras proposições relevantes, discute-se também regras mais claras para multas e indenização dos ativos não amortizados, em caso de término antecipado da concessão, bem como a submissão das concessionárias em geral a um regime de recuperação próprio, conduzido no âmbito das respectivas agências reguladoras, e não na via judicial.
Hoje, lembra Enei, há 111 contratos celebrados no modelo de PPP no Brasil, mas 30% deles tiveram o encerramento antecipado ou enfrentam problemas graves por diferentes razões, muitas delas ligadas ao tema da segurança jurídica. Entre elas, por envolverem garantias frágeis, com o que se viu na cidade fluminense de Rio das Ostras, onde foi assinado um contrato com a iniciativa privada para a construção, gestão e manutenção do sistema de saneamento.
“Quando chegou a vez de o município pagar a contra-prestação pública, a arrecadação com royalties do petróleo diminuiu. Com mudança de prefeito, o poder público se valeu de diversas formas para frustrar o pagamento. Hoje, depois de uma longa discussão na Justiça, paga-se 10% da contraprestação pública, o que é suficiente para fazer frente apenas à manutenção da rede de esgotamento, sem que seja possível recuperar o elevado investimento realizado”, explica o especialista.
Histórias como a de Rio das Ostras mostram a importância de revisão da atual regra para as PPPs e concessões, avalia Enei. “Como está agora, fica muito difícil atrair investidores sérios e viabilizar o financiamento de longo prazo. Quanto mais segurança jurídica, melhores propostas o poder público vai receber.”, analisa.
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