Embora a confiança no campo já não seja a mesmo do início do ano, sobretudo por causa dos efeitos da pandemia sobre a atividade econômica em geral, o sentimento que predomina no empresariado dos meios urbanos e rural em relação ao agronegócio ainda é de relativo otimismo, por mais que algumas cadeias produtivas estejam sofrendo com a demanda em queda e que seja cada vez mais difícil projetar crescimentos expressivos neste e nos próximos anos.
Pesquisa realizada pela PwC Brasil com 500 empresários de diversos setores – do próprio agronegócio ao varejo, passando pela indústria automotiva -, que comandam companhias que faturam de R$ 100 mil a R$ 5 bilhões por ano, mostrou que 54% deles acreditam que não haverá alterações relevantes na oferta de produtos agrícolas depois da pandemia, enquanto 47% estimam que as vendas do setor se manterão dentro das médias nos próximos anos.
POD NOS TRILHOS
- Investimentos, projetos e desafios da CCR na mobilidade urbana
- O projeto de renovação de 560 km de vias da MRS
- Da expansão da Malha Norte às obras na Malha Paulista: os projetos da Rumo no setor ferroviário
- TIC Trens: o sonho começa a virar realidade
- SP nos Trilhos: os projetos ferroviários na carteira do estado
Maurício Moraes, líder do setor de Agronegócios da PwC Brasil, responsável pela pesquisa e pelo estudo “Impactos da covid-19 no agronegócio brasileiro”, acredita que a visão do empresariado seja realista, apesar dos desafios e readequações que estão sendo necessários em segmentos como o de carnes, por exemplo.
“Com certeza teremos redução de área plantada em alguns cultivos, como o de hortaliças. Mas a tendência é que o setor de alimentos seja menos afetado do que outros pela crise, porque atende a uma necessidade básica do consumidor”, avalia. Mesmo com desemprego em alta e diminuição de renda, Moraes projeta estabilidade no médio prazo.
Considerando uma segmentação das cadeias de agronegócios desde antes da porteira até a mesa da população, os entrevistados pela PwC destacaram que as áreas mais impactadas tendem a ser o varejo (23%), o consumidor final (15%) e a indústria depois da porteira (14%) – caso das máquinas agrícolas, que encaram juros considerados elevados nas linhas de crédito oficiais e perderam um importante canal de vendas com o cancelamentos de feiras agropecuárias em todo o país.
Na comercialização em geral, contudo, Moraes destaca que, apesar das turbulências, a pandemia acelerou a digitalização de processos e serviços. Como efeito dessa adesão a novas ferramentas tecnológicas, 42% dos empresários ouvidos acreditam que haverá redução, ainda que pouco significativa, na mão de obra empregada no setor.
Para o executivo da PwC, esse movimento é mais claro nos departamentos administrativos das empresas, e a crise deverá mudar o perfil dos funcionários contratados. Para ele, terão vantagens os profissionais com “mindset mais voltado para a tecnologia e capacidade de transitar entre diferentes funções”.
No campo, ele lembra que algumas atividades já são bastante mecanizadas, como a colheita de cana, algodão, soja e milho. No caso de cultivos como o café, em que esses trabalhos ainda dependem de muita mão de obra em algumas regiões, as fazendas, no momento, estão investindo em criar logística de transporte própria, algo mais pontual e operacional, para auxiliar no traslado de funcionários temporários, além de dar suporte para manter o isolamento social durante sua estada.
Outra questão que volta à tona em meio à crise são os certificados de origem, na visão de Moraes. “É significativo o aumento da menção à rastreabilidade de alimentos e segurança alimentar que recebemos nas últimas semanas, principalmente do exterior. É preciso lembrar que é uma crise sanitária que estamos vivendo”, diz. Moraes acrescenta que também é válido estar atento ao protecionismo, que ganha força com as economias em dificuldades e com foco no abastecimento interno.
Para o agronegócio também não ser pego de surpresa no elo da compra de matérias-primas, ele alerta para a necessidade de diversificação de fornecedores neste momento, em que a logística se torna imprevisível. “Mesmo as empresas de fertilizantes e defensivos, que estão dentro de um mercado mais concentrado, devem buscar fazer uma avaliação prévia de novos fornecedores de matérias-primas e ter um plano B para o caso de, amanhã ou depois, a situação piorar”, diz.
Processos internos de compras também precisam ser otimizados, para que nem o caixa nem a capacidade de oferta ao cliente sejam prejudicados. “Preservação de caixa é a palavra de ordem hoje”, afirma. “Mas, seja como for, quando você está em uma crise generalizada como essa, tem muito mais argumentos para discutir alongamento de pagamento, porque estão todos no mesmo barco”, acrescenta Moraes.
O executivo ressalta, ainda, que as empresas não devem se voltar única e exclusivamente para o enfrentamento da crise, e que o ideal é deslocar parte do pessoal para pensar em oportunidades e no que será feito após a pandemia. “Um parte das pessoas deve, neste momento, pensar em como trazer safristas, equilibrar a produção, fazer caixa. Mas outra deve se preocupar com fusões e aquisições, desenvolvimento de novas tecnologias para escoamento de produtos, melhoria da experiência do consumidor etc”, conclui.
Seja o primeiro a comentar