O socorro financeiro do governo federal para as empresas de transporte público, que tiveram o caixa duramente afetado pelo isolamento social imposto pela covid-19, deve demorar mais do que esperado. Parlamentares, empresários, secretários estaduais e municipais de transportes e integrantes do próprio governo terão suas expectativas frustradas por causa de uma briga entre as empresas para ficar com um montante maior do dinheiro e pela falta de receitas disponíveis.
Os ministérios da Infraestrutura e da Economia costuraram um acordo na semana passada com parte da base aliada do governo na Câmara para destinar R$ 4 bilhões para ajudar as empresas de ônibus, metrô e trem mediante convênios. O dinheiro viria de parte dos R$ 16 bilhões reservados para compensar a queda de arrecadação dos fundos de participação dos municípios (FPM) e Estados (FPE) de março a junho e que não foram usados.
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A oposição, contudo, protestou porque essa emenda entrou de última hora numa votação de madrugada e sem aviso prévio de que seria pautada e, sem acordo, a medida provisória ampliou o prazo de compensação do FPM e FPE, mas não previu o dinheiro especificamente para o transporte público. Os partidos combinaram negociar o repasse num projeto de lei a parte, que seria votado hoje com urgência pelo plenário da Câmara.
O dia da votação chegou, mas o relator desse projeto, o deputado Hildo Rocha (MDB-MA), disse que há desentendimentos que devem atrasar a aprovação. O timing certo era a medida provisória. Os R$ 4 bilhões ficaram na MP e o governo diz que não tem outras receitas. Como vamos votar um projeto criando despesas que não tem previsão orçamentária?, questionou.
O dinheiro viria do veto presidencial ao uso de R$ 8,6 bilhões do extinto Fundo de Reservas Monetárias para o combate à covid-19, mas não há previsão de quando ele será votado – o Congresso não analisa vetos desde março, quando começou a pandemia – e nem se será, de fato, derrubado. Dentro dos ministérios, a derrubada do veto é também a saída esperada para viabilizar os recursos. Mas até isso ocorrer, afirmou Rocha, não há orçamento disponível para fazer o repasse para o transporte.
Esse veto é o número 26 de uma extensa lista de dispositivos vetados que precisam ser analisados pelo Congresso e que incluem até projetos do ano passado, como o pacote anticrime do ex-ministro Sergio Moro e benefícios para setores da economia, como a desoneração da folha de salários e o Renovabio. Com receio de derrotas, o próprio governo tem trabalhado para adiar essas votações pelo Congresso.
Outro desentendimento que dificulta a votação, afirmou Rocha, é a disputa entre as empresas de ônibus e de trem e metrô pelo dinheiro. O setor de trilhos alega gastos maiores e quer ficar com 50% do repasse, enquanto o de transportes diz que, como os trens e metrôs transportam 25% dos passageiros, deveriam ficar com essa fatia. É dificuldade para todo lado, reclamou.
Sem o projeto, os secretários responsáveis pela gestão do transporte público dizem que há risco de quebra das empresas e dificuldades financeiras dos governos para fazer os subsídios. A covid-19 derrubou a demanda por passageiros a menos da metade na maioria das cidades, mas as empresas precisam operar com a frota completa para evitar aglomerações e a propagação do coronavírus.
A pauta de hoje da Câmara não incluiu o projeto para o setor de transportes. Após a votação, o texto ainda precisa passar pela análise do Senado Federal e sanção presidencial. Os recursos só sairão após a assinatura de convênios entre o governo federal e governadores e prefeitos, mediante imposição de contrapartidas que ainda estão sendo debatidas pelos parlamentares, governo e setor de transportes.
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