O plano do governo para bancar obras dos ministros Rogério Marinho (Desenvolvimento Regional) e Tarcísio Freitas (Infraestrutura) incomodou bancadas estaduais do Congresso.
A proposta, que precisa do aval da Câmara e do Senado, prevê a retirada de verba de emendas dessas bancadas -inclusive do Norte e Nordeste- para financiar projetos e dar mais poder aos ministros.
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Após pressão da ala liderada por Marinho, o presidente Jair Bolsonaro (sem partido) propôs destinar R$ 6,1 bilhões a obras de infraestrutura e, em contrapartida, reduzir o orçamento de diversos ministérios, como Educação e Cidadania, inclusive em programas que haviam sido considerados prioritários pelos parlamentares.
O Congresso reagiu. Mais de 200 pedidos de alteração no texto foram apresentados ao projeto de lei.
O primeiro da lista é do líder do MDB no Senado, Eduardo Braga (MDB-AM), para impedir o cancelamento dos recursos destinados pela bancada do Amazonas para pavimentação e o manejo de resíduos sólidos da região metropolitana de Manaus. A verba em jogo é de R$ 69 milhões.
O projeto de Bolsonaro também desagradou a bancada de Goiás. O grupo contesta o corte de R$ 44 milhões no orçamento de projetos que foram escolhidos pelos deputados e senadores do estado.
Isso não foi discutido com a gente antes. Somos um grupo suprapartidário, que defende o interesse do estado. Me surpreendi com a proposta do governo, disse a líder da bancada Flávia Morais (PDT-GO).
A maior perda -de R$ 24 milhões- retira dinheiro de apoio a projetos de desenvolvimento sustentável em Goiás e transfere o valor para o mesmo tipo de ação, mas num campo do Orçamento sem destinação específica.
Essa mudança de rubrica proposta pelo governo daria mais poder aos ministros de Bolsonaro, pois caberia a eles decidirem onde aplicar um dinheiro que, antes, havia sido destinado a um estado ou município pelo Congresso.
Apesar de reunirem diversas siglas, as bancadas estaduais tendem a defender os recursos para suas bases eleitorais. Por isso, tentarão desidratar o plano da ala comandada por Marinho.
Alguns líderes afirmam que, diante do detalhamento dos cortes, não há clima para votar o projeto de financiar as obras públicas neste ano, cujo programa tem sido chamado de Pró-Brasil.
Até mesmo o vice-líder do governo no Senado, Elmano Férrer (PP-PI), quer alterar a proposta do Palácio do Planalto. O senador tenta preservar mais de R$ 20 milhões para obras em duas rodovias federais que cortam o Piauí.
Os cancelamentos [previstos no projeto de lei] impõem pesados prejuízos a políticas públicas meritórias em várias áreas e em diversas regiões do país, escreveu Férrer ao justificar o pedido de alteração no texto.
CRONOLOGIA DO PLANO DE OBRAS PÚBLICAS
Ministros da área de infraestrutura e do Palácio do Planalto elaboram plano para estimular projetos com dinheiro público, chamado Pró-Brasil Guedes foi escanteado das discussões iniciais Discussão gera racha entre Guedes e Marinho Equipe econômica consegue adiar e desidratar o plano Ala de Marinho começa a buscar formas de conseguir verba Principal alvo é o teto de gastos, que limita despesas públicas Marinho e ala militar estudam colocar obras fora do teto Guedes consegue derrubar ideia Núcleo pró-obras começa a articular com o Congresso como ter dinheiro fora do teto Guedes vence mais uma vez Plano fica em R$ 6,1 bilhões e ainda depende de votação no Congresso Dinheiro terá que sair do orçamento de outros ministérios Partidos contestam perda de verba para emendas e para Educação
Fonte: Ministério da Economia e Consultoria Legislativa do Congresso
O deputado Fausto Pinato (PP-SP), que faz parte de um bloco parlamentar alinhado ao governo, também contestou a estratégia da equipe de Bolsonaro.
Para ele, a tentativa de cancelar emendas com destinação específica e colocar a verba numa rubrica ampla (nacional) causa patente prejuízo ao trabalho de regionalização feito no Congresso Nacional.
Na oposição, as críticas são ainda mais contundentes. Coordenador da bancada do Ceará, o deputado Eduardo Bismarck (PDT) afirmou que o cancelamento, como proposto pelo governo, prejudicaria a educação, saúde e segurança pública justamente quando os estados e municípios mais precisam desses recursos.
Ele disse ainda esperar que as emendas propostas e que devolvem os recursos para o Ceará sejam acatadas.
A deputada federal Natália Bonavides (PT-RN) disse que, com o PLN, o governo está sacrificando a educação básica, superior e profissional.
No Rio Grande do Norte, por exemplo, em plena pandemia, o governo federal pretende tirar mais de R$ 3 milhões da saúde e de recursos que seriam destinados à melhoria da estrutura da segurança pública no enfrentamento da violência, disse. Se o governo quer investir em obras de infraestrutura, que invista sem sacrificar os serviços públicos e os direitos da população.
Na busca de R$ 6,1 bilhões, a equipe econômica propôs remanejar o dinheiro atualmente reservado para outras áreas. Os ministérios que mais perdem são Educação (R$ 1,4 bilhão), Economia (R$ 615 milhões) e Cidadania (R$ 385 milhões).
Enquanto o projeto não é votado, a fatia do Orçamento que pode ser cortada fica bloqueada e não pode ser usada.
Procurados, os Ministérios da Infraestrutura e Desenvolvimento Regional atribuíram a outras pastas a definição dos cortes propostos. O Ministério da Economia disse que cada pasta que, de acordo com o projeto, pode perder verba foi responsável por elencar onde seria a tesourada.
Deputados e senadores da comissão que acompanha as atividades do Ministério da Educação também se posicionaram contra os cortes na área. O dinheiro, segundo eles, poderia ser investido, por exemplo, na melhoria das condições para que alunos de baixa renda possam ter acesso a aulas virtuais na pandemia.
Isso [o projeto do Planalto] mostra o descaso do governo com a educação brasileira, argumenta Felipe Rigoni, coordenador do grupo.
De olho na projeção política, alguns ministros do governo defendem a ampliação do investimento público, como recursos para rodovias e combate à seca no Nordeste. O plano contrariou o ministro Paulo Guedes (Economia), que impediu um volume maior de recursos.
Marinho se alinhou a militares. Eles tentaram usar brechas no Orçamento criadas para o enfrentamento da pandemia de Covid-19 para conseguir mais dinheiro para obras.
O teto de gastos (regra que limita o crescimento das despesas públicas) foi o principal alvo. Mas Guedes, com apoio do TCU (Tribunal de Contas da União) e do presidente da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ), conseguiu conter as pressões.
O resultado foi um plano de obras mais enxuto e que não burla o teto de gastos. Uma derrota para o ministro do Desenvolvimento Regional, que também tentou articular no Congresso propostas para aumentar os recursos em suas mãos.
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