Nova alta do minério leva bolsa para perto do pico

Com recordes seguidos na cotação do minério de ferro, Vale atingiu valor de mercado de R$ 606 bilhões ontem, 90% maior que o da Petrobras, a segunda no ranking — Foto: Leo Pinheiro/Valor

Valor Econômico – Cada vez mais próxima de retomar suas máximas históricas, a bolsa brasileira tem contado com um importante aliado nos últimos meses: o persistente rali das commodities. O Ibovespa acumula alta de 1,33% em seu valor de mercado em 2021, mas registraria queda de 15,43% se fossem excluídas as empresas que produzem metais, proteína, papel e celulose. Excetuando-se apenas as commodities metálicas e petróleo, o recuo seria de 3,33%.

“Se tirar as commodities, o Ibovespa cai muito”, afirma a analista de renda variável da ARX, Marcela Morais. Para ela, é justamente o desempenho das commodities negociadas no exterior e o impacto desse rali nas ações de exportadoras brasileiras que têm segurado a bolsa, mantendo o índice no intervalo entre 110 mil e 120 mil pontos.

Na segunda-feira, o Ibovespa fechou em leve queda de 0,11%, aos 121.909 pontos. Apesar do leve ajuste, o índice está a menos de 3% de superar o recorde de 125 mil pontos, que foi atingido em janeiro.

O que está por trás desse avanço é o cenário de retomada da economia global, com injeção de estímulos nos países desenvolvidos, em um mundo de juros historicamente baixos. Tudo isso significa uma demanda mais aquecida, que se soma, ainda, à restrição de oferta de algumas commodities, como minério de ferro.

E, apesar de um certo ceticismo de parte do mercado sobre os rumos das matérias-primas, analistas afirmam não é a hora de ir contra a maré e zerar as posições em exportadoras listadas na bolsa brasileira. Para eles, existe espaço adicional para valorização ao longo deste ano, por mais que os temas no mercado possam mudar aqui no Brasil.

“Mesmo que boa parte da percepção de crescimento global já esteja precificada no valor das commodities, não vemos uma correção tão cedo. O risco é ver uma continuidade do movimento de alta”, diz o chefe de economia e estratégia no Bank of America (BofA), David Beker, que vê crescimento de 8,5% do PIB da China em 2021 e de 7% nos EUA.

Beker afirma que, aos poucos, o mercado passará a dividir atenções com papéis mais sensíveis à retomada da atividade no Brasil e que ficaram para trás na crise. No entanto, as ações ligadas a commodities devem continuar com um bom desempenho. “São ações para segurar na carteira. Estamos em um momento muito favorável para commodities.”

Para Carlos Eduardo Rocha, diretor de investimentos da Occam, o mundo está entrando “em uma das primeiras etapas da recuperação econômica” e tem grandes chances de viver um novo superciclo de commodities. O que justifica essa visão é a retomada da atividade, após parada brusca por causa da pandemia, em um ambiente de juros baixos e chegada de novas tecnologias inclusive voltadas para uma economia mais “verde”.

Todo esse cenário, diz o executivo, favorece algumas empresas brasileiras. A Vale, por exemplo, produz minério de ferro de maior concentração e, portanto, menos poluente – algo que tem sido mais demandado na China. Além disso, o preço de suas ações ainda opera com desconto em relação aos pares globais, o que tende a ser destravado conforme a empresa conclui suas pendências relacionadas à tragédia de Brumadinho (MG). Já as siderúrgicas se beneficiam de preços mais altos do aço em meio a cortes de produção na China.

“Existe uma probabilidade muito alta de vermos preços elevados de commodities neste ano e no próximo. E acredito que poderemos ver um ciclo de três a cinco anos, como foi a duração de 2002 a 2007”, diz Rocha, da Occam.

Os resultados recordes da Vale no primeiro trimestre mostram bem esse efeito. E não só em termos absolutos. As margens de lucro também são as mais altas dos últimos anos. Descontados os custos de produção, a empresa ficou com 63% das vendas no primeiro trimestre, ou R$ 43,9 bilhões. No mesmo período do ano passado, sobraram 39%, ou R$ 12 bilhões.

Esse volume de recursos encheu o caixa da empresa – R$ 73 bilhões no fim de março, ante R$ 19 bilhões no ano anterior – e levou a ação para o topo, descolada de seus pares do Ibovespa. O valor de mercado, R$ 606 bilhões pelo fechamento de ontem, é 90% maior que o da Petrobras, a segunda no ranking.

Apesar disso, há quem veja esse cenário mais favorável com um pé atrás. O estrategista-chefe de mercados emergentes do BCA Research, Arthur Budagahyan, ressalta que a visão otimista de médio prazo sobre as commodities não leva em conta a desaceleração da “velha economia” da China nos próximos seis a nove meses. “O petróleo e o minério de ferro não estarão em um mercado altista secular nos próximos anos.” Em relação ao cobre, Budagahyan diz que mesmo se a demanda chinesa pautada pela “agenda verde” aumentar 25% até meados do ano que vem, o consumo mundial do metal diminuirá de 3,8% em 2020 para 2,7% nos próximos 12 meses, devido ao encolhimento da indústria tradicional da China. “A demanda por cobre por causa da descarbonização da energia ainda é muito pequena para compensar a desaceleração da ‘velha economia’”, afirma.

De toda a maneira, o momento ainda é de visões positivas entre os profissionais. Para a analista de renda variável da ARX, Marcela Morais, o cenário externo vai continuar guiando a renda variável local, o que pode dar um fôlego extra para o Ibovespa buscar a máxima recorde e testar novos topos históricos, já na faixa dos 125 mil pontos. “O superciclo ainda não terminou”, avalia Marcela, e a retomada do crescimento econômico global necessita de commodities industriais, como minério de ferro, aço, petróleo e papelão.

O otimismo com o exterior contrasta com a cautela com o quadro local. “Há um embate político”, afirma a gestora da ARX, citando a crise sanitária e a demora no avanço da agenda de reformas, que contaminam as empresas mais voltadas à atividade doméstica.

Ainda assim, um exercício semelhante ao que mostra a queda do Ibovespa sem as commodities, só que trocando as ações pelos balanços, traz resultados interessantes e até animadores. A amostra de empresas expurgada das grandes exportadoras tem vendas e lucro operacional menores em 2020, é fato, mas com crescimento de 5,2% e 4%, respectivamente, em relação a 2019. Para um ano de pandemia, é uma prova de resiliência.

Fonte: https://valor.globo.com/empresas/noticia/2021/05/11/nova-alta-do-minerio-leva-bolsa-para-perto-do-pico.ghtml

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