Valor Econômico – A agenda da atração do setor privado para o investimento em infraestrutura avançou, mas o processo segue ainda muito atrasado diante da grande necessidade de melhorar a prestação de serviços para sociedade e a falta de capacidade financeira do Estado para investimento, afirmou o economista Gesner Oliveira, sócio da GO Associados e professor da Fundação Getulio Vargas (FGV), durante a Live do Valor, na sexta-feira. O evento também teve participação do advogado João Santana, ex-ministro da Infraestrutura do governo Fernando Collor de Mello.
Gesner aponta avanços nas concessões, que não envolvem a transferência de ativos para o setor privado. Privatizações, contudo, têm sido mais vagarosas. “Se olharmos o que foi feito até agora, houve aumento nas concessões de ferrovias, rodovias, saneamento. Mas o processo ainda está muito atrasado. Empresas como Correios e Eletrobras deveriam ter sido privatizados há muito tempo”, afirmou. Ele chama atenção para a necessidade de planejamento de longo prazo, a fim de que se consiga “daqui a alguns anos” devolver serviços melhores para a sociedade.
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Crítico do tamanho do Estado na economia e autor do livro “O Estado a Que Chegamos”, que trata do tema, João Santana aponta que após décadas de discussões sobre privatizações no país, as resistências à venda de empresas estatais seguem fortes e ocorrem inclusive dentro do privado. “As resistências têm dois vieses, um interno, do Estado, de corporações, funcionários, que não querem mudança. Outra do setor privado, como os fornecedores, que se articulam em torno dos interesses dessas empresas públicas”. Soma-se a isso parte da classe política contrária à privatização.
Para Santana, o Estado se exauriu, não consegue fazer investimento básicos em infraestrutura, saúde e educação. “Que dirá disputar mercado com o setor privado. Siderúrgico, por exemplo”, diz. “Mas as resistências têm que ser um estímulo para que se atue contra ela”.
Questionados pela audiência da live sobre falhas em setores ou empresas privatizadas, como os desastres provocados pelas barragens da Vale em Minas Gerais, ou o alto índice de reclamações contra empresas de telecomunicações, Gesner e Santana observaram que a transferência para o setor privado não resolve todos os problemas. “Privatização não é panaceia. É fundamental ter boa regulação e nisso o Brasil está engatinhando, precisamos investir muito nisso”, diz Gesner para que a boa regulação depende de excelência técnica, independência nas decisões e transparência.
Para Santana, a transferência de empresas para o setor privado abre espaço para que o governo se concentre em áreas essenciais, como saúde, educação e segurança. Durante a live, o advogado criticou o processo de privatização da Eletrobras dizendo que trata-se, na verdade, de um plano de capitalização.
Para Santana, apenas fato de se acenar com uma venda futura de ações não pode ser qualificado como venda ao setor privado.
“Vende-se um projeto de que vai privatizar, mas não vai ser nada disso. A proposta é tomar recursos no privado, para capitalizar, [o governo] continuar no comando, acenar com a venda de 10% e reduzir o controle de 57% para 45%”, disse, observando que dessa forma o governo continuará ditando as regras, executando a mesma política energética. “Acomoda-se interesses privados e ok. Se a economia crescer vai faltar energia e vai aumentar o custo”. Santana sugere que a Eletrobras poderia ter começado por vender participações consideradas excessivas em alguns segmentos, como a geração elétrica.
Para Gesner, um ponto positivo do projeto é melhorar a governança da empresa. “É um projeto de capitalização, mas o projeto de uma corporation, de um salto de governança que é positivo”. A empresa, diz, pode ter uma estrutura de decisões que permita transparência, objetividade e caráter técnico das decisões. Santana diz ser favorável à corporação, mas considera que o Estado não transformará a empresa. “É impossível achar que a gestão estatal levará uma empresa a ser uma corporação. O Estado não sabe fazer isso.”.
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