Estadão – O governo federal ganhou o apoio do setor privado para editar uma Medida Provisória com um novo regime de ferrovias – um regramento para o setor está parado no Senado. O apoio vem das empresas que hoje operam ferrovias no País por meio de concessões que esperam ver na MP a possibilidade de migrarem para o novo regime, de autorização, cujo peso regulatório é considerado mais leve. Segundo apurou o Estadão/Broadcast, a regra deve estar prevista no texto.
O Ministério da Infraestrutura tem a expectativa de editar a medida até o fim de setembro. A pasta ganhou mais confiança para adotar o plano após participar de audiência no Senado, em que o relator do projeto de lei de um novo marco legal das ferrovias, senador Jean Paul Prates (PT-RN), indicou que não se opor caso o governo opte por publicar a MP, que teria praticamente o mesmo conteúdo da proposta relatada por ele.
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O respaldo do setor privado também seria importante para o governo porque a estratégia, mesmo não tendo resistência do relator, já causa incômodo em alguns senadores.
Assim como o governo, a Associação Nacional de Transportadores Ferroviários (ANTF) avalia que a edição de uma medida provisória se impõe diante de iniciativas estaduais que liberam a construção de ferrovias por autorização, dentro de seus limites territoriais. A MP, cujos efeitos são imediatos a partir da publicação, seria importante para agilizar a sinergia entre os projetos de ferrovia estaduais e as federais, que já funcionam atualmente em regime de concessão, argumenta a entidade. De qualquer forma, a medida precisaria ser aprovada pela Câmara e pelo Senado em até 120 dias para não perder a validade.
Na prática, o texto deve trazer regras para que empresas obtenham aval ao regime de autorização na malha da União. A modalidade permite que ferrovias sejam construídas sem concorrência público. Hoje, a operação por empresas precisa passar por uma licitação, que resulta na concessão do serviço. Esse formato continuará existindo, e a escolha do regime vai depender do modelo de negócio.
“As iniciativas dos Estados de regulamentar regionalmente (o regime de autorização) são bem-vindas. Um País que tem baixa densidade de malha ferroviária não pode se dar ao luxo de ficar discutindo paternidade dos projetos. E é aí que a MP ganha relevância, porque é preciso que haja diálogo entre essas iniciativas estaduais e o sistema ferroviário federal”, afirmou ao Estadão/Broadcast o diretor executivo da ANTF, Fernando Paes.
Iniciativas
Mato Grosso, Minas Gerais e Pará já abriram caminho para que a iniciativa privada construa e opere ferrovias pelo regime de autorização. No entanto, concessionárias temem que essas novas ferrovias gerem uma concorrência em relação às operações federais, pois elas potencialmente podem disputar a mesma carga e ter a vantagem de operar com um regramento menor.
A associação aguarda que a MP do governo preveja possibilidades de as operações que funcionam hoje sob o regime de concessão migrarem para o de autorização. A hipótese mais básica, aponta o diretor executivo da ANTF, seria o direito de migrar quando ficar comprovado que uma nova ferrovia operada via autorização provocou um desequilíbrio financeiro na concessão.
“O que precisa ser comprovado é que a projeção de receita, a demanda, que você tem no contrato teve alteração por conta da ferrovia autorizada”, disse Paes. No auge das discussões em torno do PL que institui um novo marco legal das ferrovias, a ANTF já cobrava que esse cenário de mudança de regime estivesse previsto no texto. O que muda agora é a urgência de a regra entrar em vigor, em razão dos projetos de ferrovias nos Estados, entende a entidade.
A expectativa também é de que fique expresso no texto que, enquanto a migração não ocorrer – já que o processo pode ser longo –, a concessionária tenha direito ao reequilíbrio do contrato.
Outra hipótese que deve estar prevista na MP é a possibilidade de migração mesmo quando não há disputa de carga gerada por uma nova ferrovia autorizada. A mudança de regime seria facultativa ao governo, que precisaria constatar que a alteração é vantajosa ao poder público. Para conseguir migrar, a concessionária poderia, por exemplo, se comprometer a ampliar a ferrovia ou investir em outro ramal por meio do investimento cruzado, afirmou Paes.
A regra de migração foi discutida durante a elaboração do relatório do PL que trata do assunto no Senado, mas acabou ficando de fora do último parecer por discordância de integrantes da equipe econômica. Para operar no regime de autorização, os bens móveis precisariam passar para o domínio da empresa, e existia uma avaliação de que essa transferência, mesmo remunerada, não seria tão vantajosa para o governo como a realização de uma nova licitação.
O diretor executivo da ANTF avalia que essa discordância da equipe econômica já seria um ponto superado. “Eu acho que eles já entenderam que isso pode ser sim vantajoso para a União. No caso da migração facultativa, a União teria uma contrapartida muito clara”, afirmou Paes.
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