Valor Econômico – O governo de Pernambuco enviou ontem uma Proposta de Emenda à Constituição (PEC) que dá autorização ao executivo para viabilizar a construção de ferrovias estaduais, em uma tentativa de tirar do papel o trecho da Transnordestina no Estado, que poderá ser excluído da concessão federal, operada pela Companhia Siderúrgica Nacional (CSN).
A proposta foi uma reação à recente declaração do ministro de Infraestrutura, Tarcísio Freitas, de que o governo federal planeja redesenhar o contrato da ferrovia para concluir apenas o trecho que vai até o porto de Pecém, no Ceará, abrindo mão do eixo até o Porto de Suape, em Pernambuco.
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A Transnordestina é uma concessão federal operada pela CSN desde 2006. Em meio a atrasos nas obras e dificuldades para a liberação dos recursos públicos ao empreendimento, apenas 54% da via foi construída até hoje. O projeto original prevê a ligação do interior do Piauí, em Eliseu Martins, até os dois portos da região.
Devido aos atrasos, a Agência Nacional de Transportes Terrestres (ANTT) já chegou até mesmo a autorizar a caducidade da concessão. A anulação não foi decretada pelo ministério, mas é uma carta na manga do governo para pressionar a CSN, que retomou a construção no fim de 2019. Desde então, os trabalhos já têm se concentrado nos trechos do Piauí e Ceará – neste momento, há 1.246 trabalhadores mobilizados.
A avaliação do ministério é que a concessão teve erros de modelagem e não existe viabilidade econômica para os dois eixos, no Ceará e em Pernambuco. Por isso, o contrato está sendo renegociado, para que ao menos uma parte da ferrovia entre em operação.
O governo pernambucano, porém, não está satisfeito. O secretário estadual de Desenvolvimento Econômico, Geraldo Julio, afirma que não participou de qualquer negociação e que espera que a CSN realize a obra. “A expectativa é que o contrato seja cumprido.”
Desde a declaração do ministro, concedida na Live do Valor, em julho, representantes do Estado têm buscado se articular contra a proposta. O argumento é que faltam 313 km para a conclusão das obras até Suape, 92 km a menos do que o trecho até Pecém. O investimento também seria R$ 1 bilhão inferior – a conta apresentada é que seria preciso R$ 2,5 bilhões para o trecho em Pernambuco e R$ 3,5 bilhões no Ceará.
Procurada, a CSN preferiu não se manifestar sobre o tema.
Caso a exclusão do trecho de Pernambuco se confirme, o Estado vê duas opções: ou o governo federal faz uma nova licitação, ou o próprio Estado assume o projeto, diz o secretário. “Vamos fazer de um jeito, ou de outro.”
Como uma pressão adicional, a PEC enviada ontem à Assembleia Legislativa pernambucana abriria caminho para que o Estado delegue a uma empresa privada a construção e operação do trecho, possivelmente em regime de autorização, e não de concessão – à luz do que outros Estados têm estudado fazer.
Já haveria inclusive uma empresa interessada em levar o projeto adiante: a Bemisa, que depende da ferrovia para viabilizar seu projeto de minério de ferro Planalto Piauí. Procurado, o grupo diz que “tem acompanhado todos os esforços para viabilizar a Transnordestina seja por meio do governo, seja pelo setor privado” e que “avalia as possibilidades”.
Segundo Julio, a PEC enviada à Assembleia tem sido estudada há algum tempo, e poderá permitir a construção de outros ramais privados, além da Transnordestina. Porém, não há nenhum projeto na mesa neste momento, diz.
A estratégia de lançar projetos estaduais de ferrovias tem sido traçada por outros Estados, tanto para viabilizar pequenos ramais quanto para corredores que o governo federal não priorizou em seu planejamento de concessões.
Procurado, o Ministério de Infraestrutura diz que “todas as iniciativas que vierem se somar aos esforços do governo federal e do setor privado, em sintonia com o Plano Nacional de Logística, são bem vistas ”. No entanto, “reforça a necessidade da aprovação de um arcabouço normativo federal que padronize as demandas para viabilizar o pleno funcionamento deste modo de transporte”.
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