Infomoney – A edição pelo presidente Jair Bolsonaro da Medida Provisória que institui o novo marco legal do transporte ferroviário foi comemorada por alguns analistas de mercado, principalmente com relação à Rumo (RAIL3), mas algumas questões seguem no radar.
Conforme destaca a Levante Ideias de Investimentos, a edição da MP tem como principal mudança a coexistência do regime de autorização com o modelo de concessões hoje praticado.
POD NOS TRILHOS
- Investimentos, projetos e desafios da CCR na mobilidade urbana
- O projeto de renovação de 560 km de vias da MRS
- Da expansão da Malha Norte às obras na Malha Paulista: os projetos da Rumo no setor ferroviário
- TIC Trens: o sonho começa a virar realidade
- SP nos Trilhos: os projetos ferroviários na carteira do estado
O regime de autorização consiste em um modelo onde o investidor privado pode permanecer com o empreendimento após o término do período de contratação, tornando-se o novo dono deste. Os analistas da casa destacam que o modelo é largamente usado em outras indústrias, como telecomunicações e elétricas e, no caso de agora, objetiva a redução de incertezas para o investidor interessado em ingressar no setor para a construção de ferrovias e aproveitamento de trechos pouco utilizados.
Aí entra o objetivo transformar em regime de autorização o prolongamento da Malha Norte (antiga Ferronorte), da Rumo. Hoje, o trecho termina em Rondonópolis e ganharia outro trecho para chegar até Lucas do Rio Verde (MT).
Mas, além deste, outros projetos já foram apresentados ao ministério por potenciais investidores, totalizando um montante de R$ 20 bilhões.
A XP destaca ver a MP como positiva para destravar novos investimentos em ferrovias no Brasil, sendo posicionando como uma alternativa regulatória pra projetos com visibilidade de demanda.
Em relação ao projeto de extensão da malha ferroviária da Rumo de Rondonópolis a Lucas do Rio Verde, no estado do Mato Grosso (MT), os analistas acreditam que a MP não atrapalha o rito em âmbito estadual em curso pela companhia por este ser um projeto intraestadual (começando e terminando dentro do próprio estado).
A MP remete à lei de 2011 (Sistema Federal de Viação) que confere competência federal apenas às ferrovias interestaduais, inter-regionais e internacionais.
“Por fim, vemos uma leitura adicional de aumento de segurança jurídica para o modelo estadual de Autorização, uma vez que confere aos estados competência para outorga de ferrovia que não se enquadre na lei de 2011 (como entendemos ser o caso da extensão ferroviária da malha da Rumo até Lucas do Rio Verde [LRV]). Vemos a publicação da MP como positiva para continuidade dos planos da Rumo de obter Autorização estadual para LRV (já em andamento com o governo do Mato Grosso)”, apontam.
O Credit Suisse aponta que se trata de um marco importante para um desenvolvimento mais rápido da rede de ferrovias do país. Para os analistas, a noticia é positiva para a Rumo, que agora tem mais uma opção para estender a rede norte para Lucas do Rio Verde. A MP está efetiva de imediato e válida por 60 dias, com a possibilidade de ser estendida por outros 60 dias. Para que possa virar lei, a MP tem que ser votada no Congresso ate o final do ano, podendo ainda sofrer modificações.
Os analistas avaliam que uma autorização possa ser concedida depois que a MP for votada para evitar riscos judiciais. Assim, o efeito prático da MP seria acelerar a votação no Congresso dado o prazo final.
O banco suíço menciona ainda que, sem esse desenho regulatório, as rodovias federais só poderiam ser construídas mediante regime de concessão, no qual o governo é responsável por elaborar todo o projeto, estruturá-lo e leiloá-lo via concessão. Nesse regime, os ativos são retornáveis ao governo no final da concessão e sujeitos à regulamentação da Agência Nacional de Transportes Terrestres (ANTT), com investimentos obrigatórios e um preço cap, assim como o direito de rebalanceamento econômico do contrato.
No novo regime, as companhias podem trazer projetos para o governo a qualquer hora (com os respectivos estudos ambientais, urbanos e técnicos). E no regime de autorização, os ativos não são retornados ao governo, não há rebalanceamento econômico nem cap de tarifa e o contrato está limitado em 99 anos, podendo ser estendido pelo mesmo período de tempo.
“A noticia é boa para a Rumo, que agora pode pedir uma autorização para extensão da malha norte de Lucas do Rio Verde. É um projeto que a companhia tem estudado por anos e que aumenta significantemente a competitividade da empresa no Mato Grosso, podendo ser transformacional”, avaliam.
Contudo, os analistas fazem a ponderação de que tal projeto não deve ficar operacional até 2027 e que a MP ainda pode sofrer modificações no Congresso, acreditando ainda que a Rumo só irá atrás de uma autorização após o projeto final ser aprovado. O banco suíço possui recomendação de compra para a ação da Rumo com preço-alvo em R$ 25, o que corresponde a um potencial de alta de 32,6% sobre o fechamento de segunda-feira.
Impasse no Congresso
Sobre o tema Congresso, cabe destacar que, com apoio até de integrantes da base de apoio ao governo Bolsonaro, a Comissão de Assuntos do Econômicos (CAE) do Senado aprovou nesta terça um requerimento para que o presidente do Congresso, senador Rodrigo Pacheco (DEM-MG), devolva ao governo a medida provisória que instituiu o novo marco legal para o setor.
Os parlamentares defendem que, em vez de permitir a tramitação da MP editada na véspera pelo governo, Pacheco recuse-a e paute no plenário da Casa a proposta de marco regulatório do próprio Senado em tramitação há três anos e que dizem estar pronta para votação.
Senadores vão reforçar o pedido na sessão do plenário desta terça. Procurada pela Reuters, a assessoria de imprensa do presidente do Congresso e do Senado não respondeu de imediato sobre qual encaminhamento dará ao pedido.
O senador Wellington Fagundes (PL-MT) disse à Reuters que um dos pontos polêmicos previsto na medida provisória é que concessões ferroviárias ficariam sob a responsabilidade do governo federal. Ele ressaltou que no projeto do Senado os entes regionais é que têm competência para conceder autorizações para os empreendimentos.
“Nosso país é federativo, cada unidade tem a sua autonomia. A maior autoridade nos municípios não é o presidente, é o prefeito”, destacou ele, também líder do bloco parlamentar Vanguarda, que abrange partidos do chamado centrão.
Durante a reunião da CAE, Jean Paul Prates (PT-RN), relator do projeto disse ter se surpreendido com a solução via MP. Segundo ele, embora tenha ressaltado que seja do PT, partido de oposição ao governo, seu parecer foi discutido com integrantes do Executivo e que o texto é abrangente e não contempla só o “lobby do trem”.
“Vamos trabalhar com o presidente Rodrigo que saberá certamente agir salomonicamente e corretamente nesse processo e eventualmente até convencer o governo de que a gente colocar o projeto para tramitar é melhor”, afirmou ele no colegiado.
A Reuters destaca que, embora seja possível a devolução de uma MP pelo presidente do Congresso ao Executivo, foram pouquíssimas as vezes que isso ocorreu até hoje ao longo dos governos da Nova República e esse ato costuma gerar um desgaste na relação entre o parlamentar e o presidente da República.
BBI vê atraso no projeto Lucas do Rio Verde
Além disso, antes da CAE aprovar o pedido para que a MP seja devolvida, o Bradesco BBI tinha apontado que a nova Medida Provisória poderia atrasar o projeto Lucas do Rio Verde.
Os analistas destacaram que o projeto está no centro da disputa entre o governo federal e o governo do Estado de Mato Grosso.
Isso porque o ramal Rondonópolis – Lucas do Rio Verde fazia parte da Malha Norte da Rumo, mas em 2010 os ex-controladores da América Latina Logística (ALL) devolveram esse trecho à ANTT, autarquia federal. “A nosso ver, com base
na medida provisória, Lucas do Rio Verde poderia ser classificado como um projeto federal, uma vez que fazia parte da Malha Norte. Também reconhecemos que este projeto não está listado no Programa de Parceria de Investimentos (PPI) ou no Plano Brasileiro de Logística 2035, o que poderia argumentar que poderia ser regulamentado pelo Estado de Mato Grosso”, apontam.
Se este cenário se confirmar, os analistas avaliam que a aprovação do projeto Lucas do Rio Verde da Rumo poderá ser adiada para o início de 2022. Isso porque, em primeiro lugar, o governo federal pode manter o Ferrogrão como projeto prioritário no setor ferroviário. Em segundo lugar, a Rumo pode precisar apresentar essa proposta ao Ministério da Infraestrutura. Por fim, a empresa também pode preferir esperar para ver se essa medida provisória vai virar lei nos próximos 120 dias, ou se o Congresso vai esperar que ela expire. “Notamos também que o Governo Federal pode delegar este projeto ao estado de Mato Grosso, resolvendo esta situação mais rápido do que o esperado”, apontam.
Para os analistas, o projeto Lucas do Rio Verde, regulamentado pelo governo do estado de Mato Grosso, parece ser a alternativa mais atrativa em termos de retorno para o Rumo, pois é válido por 45 anos, podendo ser renovado por igual período.
“A autorização para construir esta ferrovia será concedida à empresa que: 1) consiga terminar a construção mais rapidamente, 2) tenha maior capacidade e 3) tenha a maior cobertura geográfica. No caso federal, o projeto pode ser leiloado se duas ou mais empresas manifestarem interesse pelo projeto de Lucas do Rio Verde”, apontam. O BBI segue com recomendação de compra para Rumo com preço-alvo para 2022 baseado no modelo de fluxo de caixa descontado de R$ 27, sendo que o preço-alvo não incorpora o projeto.
Seja o primeiro a comentar