Correio 24 Horas (BA) – A criação de um grande corredor logístico para o escoamento de grãos do Centro-Oeste, passando pela Bahia, está mais próxima do que se imagina. Depois de leiloar o trecho 1 da Ferrovia de Integração Oeste-Leste (Fiol 1), que vai ligar Ilhéus a Caetité, o Governo Federal projeta a concessão em um único bloco dos trechos 2 (entre Caetité e Barreiras), 3 (Barreiras a Figueirópolis, em Tocantins) e a Ferrovia de Integração do Centro-Oeste (Fico). O leilão deve acontecer ainda em 2022, de acordo com o Ministério da Infraestrutura.
O engenheiro Marcello Costa, secretário Nacional de Transportes Terrestres do Minfra, explica que a ideia de oferecer as áreas juntas, como se fossem apenas uma, é que o futuro investidor poderá compensar com os trechos mais adiantados os outros que necessitem de um maior volume de recursos. As obras da Fiol 2, tocadas com recursos públicos através da Valec, devem receber até o final deste ano por volta de R$ 450 milhões. Marcello Costa lembra que o volume é bastante expressivo, se for levada em conta a realidade atual.
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“Quase 10% de tudo o que nós temos para gastar está sendo colocado numa ferrovia baiana. É uma decisão importante porque a gente tem a previsão de, já no ano que vem, leiloar a continuação da Fiol 2, 3 e a Fico”, destaca Costa.
Fruto do chamado investimento cruzado, com recursos provenientes da antecipação de renovação da Ferrovia Vitória-Minas, a Fico já nasce paga. Tem R$ 3 bilhões para construí-la e daqui a quatro anos ela estará operacional.
“Estamos concluindo estudos que apontam nesta direção, de leiloarmos em conjunto este grande corredor logístico e não separadamente. Veja, a Fico está paga, ela ajuda a bancar a conclusão da Fiol 2, que está com praticamente 50% de obras concluídas e deve chegar ao leilão próxima de 65%, junto com a Fiol 3, que está partindo do zero”, diz.
Trilhos
Após o acordo de concessão firmado no último mês entre a Bamin e o Governo Federal, a expectativa de ver uma parte significativa do PIB baiano circular pelos trilhos, vai se tornando realidade. Com 537 quilômetros de extensão, a Fiol I vai ligar Ilhéus a Caetité e com isso, contribuir para o escoamento do minério de ferro e grãos, ao interligar a ferrovia ao porto e, ao mesmo tempo, desafogar as estradas e evitar o tráfego intenso de caminhões nos centros urbanos.
Nos próximos quatro meses, a Bamin deve apresentar o cronograma de atividades para aprovação da Agência Nacional de Transportes Terrestres (ANTT) até iniciar a nova fase da obra no segundo semestre do ano que vem, que deve ficar pronta até 2026.
“A gente está iniciando este grande projeto da Fiol 1, que neste primeiro momento tem uma característica muito forte de mineração, até porque quem ganhou a licitação foi a Bamin, uma empresa de mineração”, lembra.
Ele prevê que no futuro próximo o minério será apenas parte das cargas escoadas pela linha férrea. “A Fiol vai se tornar um grande corredor logístico para o transporte de grãos do Oeste Bahia, com a Fiol 2, e a partir da união com o Mato Grosso terá a possibilidade de escoar cargas do Centro-Oeste”, calcula. Juntas, as três etapas vão formar um corredor de escoamento com 1.527 quilômetros de trilhos.
Ferrovia e porto
A Fiol I foi arrematada em abril desse ano pela mineradora que opera a Mina Pedra de Ferro, em Caetité, com lance único no valor de R$ 32,73 milhões pela outorga. O contrato tem prazo de vigência de 35 anos, com cinco anos para conclusão das obras e início da atividade. Para concluir a construção da ferrovia – que está 80% pronta – o investimento da Bamin será de R$ 3,3 bilhões, sendo R$ 1,6 bilhão em obras civis e R$ 1,7 bilhão em vagões e locomotivas.
“O estado da Bahia ocupará uma nova e importante dimensão na economia nacional, tornando-se também o terceiro maior produtor de minério de ferro do país”, afirma o ceo da Bamin, Eduardo Ledsham.
Com a conclusão, a Ferrovia de Integração Oeste-Leste vai ter capacidade para movimentar 60 milhões de toneladas por ano, com a Bamin utilizando somente um terço da estrutura. Outros dois terços ficam disponíveis para outras mineradoras, o agronegócio, petroquímicos e mais outros setores da economia.
Ao fortalecer o modal ferroviário, a Fiol deve passar por 20 municípios com a instalação de mais de 30 pátios de carga ao longo rota. As obras devem gerar ainda, 55 mil empregos diretos e indiretos com a construção da ferrovia nos próximos cinco anos. Para consolidar toda essa infraestrutura de logística integrada, a Mina Pedra de Ferro, também vai se ligar ao Porto Sul, que está sendo construído no município de Ilhéus, em conjunto com o governo do estado, concluído até 2026.
Além dos mais de R$ 3 bilhões que serão investidos para a conclusão da primeira etapa da obra, iniciada pela Valec, estão previstos um volume de recursos parecido para a conclusão do Porto Sul, em Ilhéus. O ceo da Bamin, Eduardo Ledsham, ressalta que após iniciar sua produção esse ano, a mineradora deve movimentar só em 2021, 1 milhão de toneladas. Quando o Porto Sul e a Fiol entrarem eu operação, esse número será ampliado para 18 milhões.
“Estamos construindo um novo e importante corredor de exportação que, certamente, vai contribuir para o crescimento e o desenvolvimento sustentável da região”.
Competitividade
Especialista em engenharia rodoviária e professor da Uniruy, Cícero Bastos tem acompanhado a Fiol com uma certa expectativa e vem desenvolvido alguns trabalhos e estudos, em fase ainda inicial, sobre o modal ferroviário. “Fiol representa um grande avanço, no quesito integração. Considero uma revolução, no sentido de integrar e facilitar o escoamento e transporte, mais rápido de suas riquezas, quando retomamos o estímulo ao transporte ferroviário. Principalmente, tendo em vista que estamos enfrentando problemas com o alto custo dos combustíveis, o que impacta na composição de custos de frete e do produto final”.
Em logística, a solução integrada é determinante para que o produto saia das mãos do produtor até as do comprador de maneira rápida e mais barata possível, considerando toda a competição por mercados em nível global. Para o gerente de Estudos Técnicos da Federação das Indústrias do Estado da Bahia (Fieb), Ricardo Kawabe, a concretização da Fiol representa um passo necessário na modernização da logística do estado.
“Porto Sul deve ofertar justamente esse tipo de solução, viabilizando uma série de negócios, estimulando assim a economia estadual, que carece de infraestrutura de transportes moderna e eficiente”, projeta.
Segundo informações da VLI Logística, responsável pela concessão da Ferrovia Centro Atlântica (FCA), a empresa vem investindo na melhoria dos trechos em que opera na malha ferroviária baiana. Nos últimos anos, mais de R$ 150 milhões foram investidos na linha por onde passa movimentações regulares de derivados de petróleo, cal, químicos, minério de ferro, minério de cromo, minério de magnesita, cimento e contêineres.
A FCA corta os municípios de Alagoinhas, Castro Alves, Iaçu, Licínio de Almeida, Camaçari, Brumado, Campo Formoso, Candeias, Pojuca e Itiúba com pontos de carga e descarga, incluindo aí transportes para empresas como a Braskem, LafargeHolcim e Bamin.
“Na Bahia é evidente a vocação para carga geral. Além dos negócios regulares que mantém, a VLI identifica ainda mais potencial a ser desenvolvido na região. A ferrovia é o melhor modal para distâncias longas e grandes volumes e o estado conta com grandes projetos”, destacou a empresa em nota.
Área portuária recebe investimento
Novos investimentos da iniciativa privada também estão chegando ao ao setor portuário baiano este ano. Com operação em cinco portos no estado, a Intermarítima deve investir R$ 70 milhões para movimentar a cadeia logística no segmento. De acordo com o diretor comercial da empresa, Matheus Oliva, a Bahia tem um potencial ainda inexplorado em investimentos em infraestrutura.
“O mercado, a iniciativa privada, tem interesse nisso e aí você libera o governo para investir em saúde, educação e segurança. Estamos voltados para dar soluções a clientes importadores e exportadores. São cerca de 250 navios por ano. Cada um gera uma cadeia de serviços da carga, da origem ao navio, que exige diversos investimentos”, explica o executivo.
Os recursos estão sendo direcionados para os terminais de carga, equipamentos, máquinas e caminhões. “São investimentos contínuos para dar soluções para seus clientes e atender as demandas do mercado. Já desenvolvemos alternativas para cargas siderúrgicas, conteiners de fertilizantes e atualmente, a maior movimentação no Porto de Salvador é de carga de energia solar com estruturas para parques fotovoltaicos”, ressalta Oliva.
Segundo dados da Agência Nacional de Transportes Aquaviários (Antaq), o estado tem dois dos 20 portos organizados (com áreas que pertencem à União) com maior movimentação em 2020. Aratu (12º) e Salvador (16º) movimentaram 6,1 milhões de toneladas e 5,2 milhões de toneladas de carga, respectivamente. Entre os terminais de uso privado, o Terminal Aquaviário de Madre de Deus (Temadre) ocupa a 8ª posição no volume de carga e descarga de navios atracados, quando chegou 20 milhões de toneladas em movimentação.
Para o gerente de Desenvolvimento Industrial da Federação das Indústrias do Estado da Bahia (Fieb), Marcus Verhine, concessões no setor ajudam a resolver gargalos de infraestrutura que são problemas crônicos, que dificultam o escoamento da produção baiana. O impacto da ineficiência nos transportes se traduziu na constante perda de competitividade das empresas, frente à forte concorrência de outros estados e países.
“O grande desafio é realizar os investimentos que possam trazer equipamentos públicos projetados e construídos no século passado para os padrões atuais de capacidade, eficiência e custos. Dada a incapacidade fiscal do Estado em realizar investimentos nessas infraestruturas, o caminho é o da parceria com o setor privado”, analisa.
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