Novo governo terá 141 ativos para leiloar

Valor Econômico (Coluna) – O presidente eleito em outubro terá a oportunidade de conceder para o setor privado 141 ativos já em 2023, mobilizando quase R$ 245 bilhões em novos desembolsos, com foco na área de infraestrutura. Essa carteira será deixada pelo Programa de Parcerias de Investimentos (PPI) como um legado ao próximo governo. Inclui projetos como a BR-040 entre o Rio de Janeiro e Belo Horizonte, quatro lotes de rodovias no Paraná, o Porto de Santos e a Companhia Docas da Bahia, renovação contratual da Ferrovia Centro Atlântica (FCA), oito aeroportos na Amazônia, duas privatizações capazes de revigorar redes antiquadas de mobilidade urbana (Trensurb em Porto Alegre e CBTU Recife).

O secretário especial do PPI, Bruno Westin Leal, avalia que hoje os principais partidos e candidatos, em todas as esferas e independentemente do perfil ideológico, reconhecem como os gestores privados fazem a diferença na infraestrutura: enfrentam menos dificuldade na execução de obras, precisam cumprir metas de qualidade na entrega dos serviços, tendem a ser mais ágeis na incorporação de inovações. “E é um desenho melhor para ter investimentos constantes, sem os solavancos do orçamento público”, afirma.

PPI deixa carteira de R$ 245 bilhões para concessão em 2023

O capital privado é cada vez mais necessário, mas também tem sido insuficiente. Segundo dados da Associação Brasileira da Infraestrutura e Indústrias de Base (Abdib), o investimento em quatro setores – transportes e logística, telecomunicações, energia elétrica, saneamento – fica em 1,7% do PIB por ano. A entidade avalia que seria preciso ampliar esses aportes para 4,3% do PIB anuais, ao longo de uma década, a fim de acabar com os gargalos atuais e emparelhar o Brasil com o “padrão OCDE”.

Para isso, a Abdib acredita que está na hora de elevar o gasto público “de qualidade”. Não se trata de nenhum trem-bala ou de uma nova refinaria da Petrobras, mas de priorizar o festival de obras inacabadas pelo país. O último levantamento disponível da Controladoria-Geral da União (CGU) aponta que há cerca de 11 mil empreendimentos parados. Mais da metade são projetos simples: quadras poliesportivas, escolas e creches, unidades de saúde, pavimentação urbana. A manutenção de rodovias federais também enfrenta uma escassez de orçamento sem precedentes.

Líder nas intenções de voto, o ex-presidente Lula acena com flexibilização do teto de gastos e maior investimento público. A turma da Faria Lima, para lá de condescendente com a PEC dos Precatórios e com o atropelo da legislação eleitoral na PEC das Bondades, soará pusilânime se encasquetar. Ao petista, caso chegue novamente ao Palácio do Planalto, caberá uma leitura atenta do momento econômico e reconhecer que mais aportes do governo na infraestrutura podem complementar, mas não substituir, investidores privados.

O que isso significa? Seguir, à risca, o que for deixado pelo PPI. Desta vez, como frisou em artigo o advogado Maurício Portugal Ribeiro, retomar investimentos públicos em infraestrutura demorará mais do que levar adiante concessões e PPPs já estruturadas. Para o governo realizar grandes obras, seria preciso reiniciar a elaboração de projetos básicos de engenharia e retomar o processo de licitações em órgãos federais que ficaram com a prateleira vazia. Levaria tempo e dificilmente teria resultados antes de meados de 2024 – sem falar nos riscos de ineficiência e descontinuidade.

“Um eventual governo do PT herdará uma série de projetos cuja estruturação encontra-se em diferentes estágios. Vários desses projetos estarão prontos para ir a leilão já no primeiro semestre de 2023. A vantagem das concessões e PPPs é que, celebrados os contratos, obras são geralmente realizadas no prazo e pelo custo estimados”, escreveu (Agência Infra, 6/7).

Há cinco concessões de florestas para o manejo sustentável previstas no ano que vem. Se for aprovada uma nova lei em tramitação, os investidores poderão receber pela prestação de serviços ambientais (manter em pé a vegetação nativa) e vender os créditos de carbono. São projetos que fazem parte da solução, não do problema, para devolver ao Brasil seu status de protagonista no meio ambiente.

Mais de R$ 4 bilhões, em uma área total de 133 mil hectares, deverão ser investidos na concessão de seis grandes polos de agricultura irrigada em Minas Gerais e no Nordeste. É criação de emprego no campo e ampliação de cultivos mais rentáveis. Para comparar: todo o orçamento da União destinado aos projetos de irrigação – por meio das estatais Codevasf e Dnocs – somou R$ 708 milhões entre 2013 e 2020.

Também escarregou, de 2022 para 2023, a desestatização do Porto de Santos. Lula, se eleito, não deveria sequer cogitar um recuo ou desistência. A minuta de contrato prevê R$ 16 bilhões em investimentos. Os aportes abrangem até um túnel para a ligação seca Santos-Guarujá. Quem acompanhou as últimas dragagens no porto conhece o drama de fazê-las como obra pública. Não há por que desistir.

As concessões de ativos em infraestrutura conseguiram beneficiar-se de planos que atravessaram vários governos, com razoável estabilidade. Dilma Rousseff deixou para Michel Temer novos leilões de aeroportos – já sem a Infraero como sócia – e de terminais portuários. Temer preparou o terreno para Jair Bolsonaro destravar bilhões de reais em ferrovias e na privatização das primeiras Companhias Docas. Bolsonaro agora entrega, quem sabe até para ele mesmo, essa carteira refeita. O BNDES trabalha na privatização do saneamento em Estados como Paraíba, Acre, Sergipe, Rondônia. A expertise do banco precisa continuar à disposição dos governadores.

Resta uma pergunta: o PPI, como um núcleo especializado e coordenador das concessões, continuará existindo? Ele foi objeto da primeira medida provisória do governo Temer, e esse histórico talvez baste para colocar sua sobrevivência em risco sob Lula, caso o petista adote postura revanchista. Nem com a reeleição de Bolsonaro dá para bancar a continuidade do PPI, que ficou passeando pela Esplanada dos Ministérios – Secretaria-Geral, Secretaria de Governo, Casa Civil – até pousar na Economia como secretaria especial. Pode facilmente tornar- se alvo de uma reorganização da máquina em segundo mandato.

Westin Leal, atual chefe do PPI, defende a continuidade da estrutura. “É um órgão de referência para falar com todo tipo de investidor, sem viés político, cujo papel de coordenação facilita transpor boas práticas entre diversas áreas do governo, que difunde a cultura de concessões nos ministérios e nos entes subnacionais”, resume.

Fonte: https://valor.globo.com/brasil/coluna/novo-governo-tera-141-ativos-para-leiloar.ghtml

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