Folha de S. Paulo – A queda de um bloco de concreto de uma altura de 15 metros, na semana passada, é o mais recente incidente em uma série de problemas na linha 15-prata do monotrilho de São Paulo. O caso fez com que o Ministério Público estude pedir na Justiça indenização ao consórcio responsável pela obra.
O bloco caiu em cima da ciclovia na avenida Luiz Inácio Anhaia Mello, na zona leste da capital paulista.
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O buraco foi aberto na junta que liga vigas entre as estações Oratório e Parque São Lucas. Ninguém foi atingido, mas pedaços de concreto ficaram espalhados pela via de ciclistas e pelo gramado ao lado.
Em nota, o Metrô disse que não houve queda de bloco de viga ou de estrutura. Segundo a estatal, durante trabalhos de manutenção da linha, na quinta (22), “uma camada de cimento em excesso foi retirada”.
“Não houve qualquer dano à estrutura e não impactou no funcionamento da linha”, diz a nota.
O CEML (Consórcio Expresso Monotrilho Leste), responsável pela obra, diz que o evento é pontual e isolado, sem dano material ou pessoal, e que o o reparo foi integralmente realizado.
O consórcio afirma que está realizando vistoria completa na junção das vigas e constituiu um grupo de trabalho técnico para apurar as causas da queda do concreto.
Um funcionário, sob a condição de anonimato, disse à reportagem que é a primeira vez que vê uma queda como essa, porém, inspecionando a via encontrou reparos, com marca de concreto, como se a viga estivesse rachada.
No dia seguinte à queda do material, os trens da linha 15-prata circularam em velocidade reduzida durante 15 horas, segundo o Metrô, por causa de uma falha no sistema de alimentação elétrica na região da estação Fazenda da Juta.
O Metrô nega que os problemas de sexta-feira (23) passada tenham relação com a queda do concreto na véspera.
Roberto Racanicchi, engenheiro civil e representante do Crea-SP (Conselho Regional de Engenharia e Agronomia do Estado de São Paulo), explica que as vigas são pré-moldadas e içadas inteiras sobre as pilastras de sustentação. Lá em cima é preciso fazer juntas de concreto, com as mesmas características do restante da linha. Foi em uma dessas ligações que ocorreu o problema.
“Nessas juntas há tendência de desgaste mais rápido, por causa da circulação dos trens”, afirma. “Nos elementos principais não vai acontecer nada durante muito tempo, pois a segurança é muito alta. Mas nestas junções, a manutenção periódica é fundamental para a prestação de serviços e para se evitar acidentes.”
O arquiteto Raphael Toscano, que estudou a linha 15 em seu trabalho de graduação, afirma que não é certo fazer a recomposição de concretagem com cimento conforme informou o Metrô. “E sim com concreto, de acordo com a orientação do engenheiro responsável.”
“Se uma pedra de concreto cai daquela altura e atinge alguém na ciclovia pode provocar uma tragédia”, afirma o engenheiro Racanicchi.
Esse não foi o primeiro caso envolvendo o monotrilho. Em março de 2020, o estouro de um pneu lançou uma placa de metal que caiu na avenida Sapopemba e paralisou a linha durante cerca de 100 dias.
Em janeiro de 2019, dois trens se chocaram na estação Jardim Planalto. Um dia depois, um equipamento chamado terceiro trilho se soltou e ficou pendurado a 15 m do solo. Depois, o muro de uma das novas estações desabou sobre a escada que dá acesso à plataforma.
A sequência de ocorrências fez o Ministério Público abrir um inquérito civil que apontou que o estouro do pneu foi provocado por problemas de projeto e execução da linha, assim como no projeto, fabricação e montagem dos trens.
O promotor Sílvio Marques, da Promotoria de Justiça do Patrimônio Público, responsável pelo inquérito, afirmou que já iniciou a apuração da queda de parte da estrutura.
Sobre os casos anteriores, ele disse que está conversando com o Metrô. “Vamos pedir indenização ao consórcio responsável pelo projeto e se os problemas continuarem, poderemos pedir até rescisão de contrato”, afirma.
A Folha teve acesso a um documento de 30 páginas enviado ao Ministério Público no qual o Metrô disse que o CEML está tentando modificar as conclusões do relatório que apontaram erro no projeto da linha 15.
Questionado sobre a acusação do Metrô, o CEML não respondeu. Afirmou apenas que o acontecimento atual não possui qualquer relação com incidente ocorrido em fevereiro de 2020.
A linha foi construída pelas empreiteiras Queiroz Galvão e OAS, além da empresa canadense Bombardier.
As acusações do Metrô fizeram a Promotoria do Patrimônio Público pedir explicações ao consórcio no último dia 6, que ainda não foram respondidas.
Wagner Fajardo, coordenador do Sindicato dos Metroviários, diz que o Metrô se omite de cobrar o consórcio contratado. “Até agora não temos notícias de que o Metrô foi indenizado, nem dos custos com deslocamentos improvisados”, afirma.
Alex Santana, da Fenametro (Federação Nacional dos Metroviários), lembra que em todas as ocorrências havia operadores no trem. “Sem eles poderia ter sido pior”.
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