O Tempo (MG) – Prestes a ser concedido pelos próximos 30 anos para a iniciativa privada, o metrô de Belo Horizonte sairá das mãos da Companhia Brasileira de Trens Urbanos (CBTU) e passará a ser administrado pela empresa que apresentar a melhor proposta ao governo de Minas Gerais, conforme o edital que será publicado nesta sexta-feira. (23). Mas apesar do investimento para ampliação da linha 1 e para construção da linha 2 já estar garantido, especialistas criticam o modelo de gestão que passará a ser adotado no transporte público.
O principal questionamento está no modelo de concessão que foi escolhido pelo governo federal, que optou por acabar com a CBTU – que mantinha uma operação até então subsidiada pelo próprio governo – para deixar a operação dos trens sob poder de uma empresa privada que vai tirar seu lucro das passagens que são pagas pelos usuários.
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Segundo o coordenador do programa de Mobilidade Urbana do Instituto de Defesa do Consumidor (Idec), Rafael Calabria, essa é uma opção que, a longo prazo, tende a inviabilizar a operação do metrô, assim como já ocorreu em outras cidades do Brasil.
“A gente tem um exemplo no Brasil que é a Supervia, do Rio de Janeiro, que foi concedida em 1998 e até hoje dá problemas. A concessão é pública e passa a ser privada, e a operação dela é baseada no recurso gerado pela tarifa, e isso vai depender de uma alta lotação para ser rentável. O resultado disso é que a concessionária acaba então precarizando os horários que não são lotados, o que afasta os passageiros e também gera uma queda na qualidade do serviço”, aponta Calabria, que classifica a concessão proposta para o metrô de Belo Horizonte como uma solução que já chegou ‘atrasada’.
Mesmo que esse investimento de R$ 3,8 bilhões para construção da linha 2 e ampliação da linha 1 esteja garantido em contrato, o especialista em mobilidade urbana e membro do Nossa BH, André Veloso, critica o fato do governo ter atrelado esses recursos, que são públicos, a uma concessão privada.
“Você está incluindo na equação da operação do metrô o retorno financeiro de uma empresa de iniciativa privada que vai investir pouco no sistema e que vai ter a exclusividade da operação, enquanto no sistema estatal você tem uma operação que não prevê lucro, inclusive operando no prejuízo, e o que a gente sabe é que os sistemas metroviários do mundo não operam sem subsídio. Ou você vai operar de uma maneira que não dê retorno para a população,e aí você tem um metrô caro e que é utilizado por poucas pessoas, ou você vai subsidiar a operação e o lucro da iniciativa privada a partir do orçamento público. Então está sendo criado um gasto que não existia para fazer uma coisa que já é feita”, avalia Veloso, que também critica o tempo de contrato.
“As concessões de longo prazo na mobilidade urbana tem se mostrado absolutamente desastrosas. Esse governo estadual é o mesmo que reclama, com razão, da concessão de ônibus ter sido realizada em 2007 e ter prazo para acabar em 2037. Se você faz um modelo de 30 anos para acabar na década de 2050, não vai dar nem para saber como vão estar as condições de mobilidade urbana do belorizontino nesse período, por isso a operação pública é recomendada, pois tem mais maleabilidade e não visa só o lucro”, critica.
Sem subsídio e com investimento garantido
A partir da concessão, o governo federal e o governo estadual garantem que não haverá mais qualquer tipo de subsídio para o transporte em Belo Horizonte. Com isso, caberá à empresa a tarefa de aumentar o número de passageiros e garantir a sustentabilidade do sistema. A média de passageiros no metrô, atualmente, é de 100 mil pessoas por dia. A partir dos investimentos nas linhas 1 e 2, a previsão é que a rede receba 260 mil pessoas diariamente, segundo os estudos que foram feitos pelo governo federal.
Apesar de garantir que não haverá nenhuma mudança no cálculo feito para se chegar ao valor da passagem, que atualmente é de R$ 4,50, o edital de concessão prevê que ocorram reajustes ‘pontuais’ que já estão previstos anualmente.
O projeto de privatização do metrô de BH prevê investimentos de R$ 3,8 bilhões. Além do dinheiro do governo federal, o governo de Minas vai arcar com R$ 430 milhões nesse mesmo projeto. Os recursos são fruto do acordo junto à Vale pela reparação dos danos causados pelo rompimento da barragem em Brumadinho. Os demais valores serão de responsabilidade da empresa que arrematar o metrô.
O contrato prevê que a linha 2 esteja pronta em até seis anos a partir do contrato de concessão firmado – algo em torno de 2029. No entanto, é possível que a obra fique pronta antes, ou que seja liberada parcialmente à medida que as estações sejam concluídas.
Quem também é contrário ao projeto de concessão do metrô são os funcionários da CBTU, que desde o dia 25 de agosto estão em greve. De acordo com o Sindicato dos Metroviários (Sindimetro-MG), são 1,6 mil cargos que estão em risco devido ao processo de privatização.
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