Veja – Nos últimos dias, uma agitação inusual tomou conta da alta cúpula do grupo Cosan, controlado pelo empresário Rubens Ometto. Dono de usinas de cana-de-açúcar, da empresa de energia Raízen, que administra os postos Shell no Brasil, da Rumo, responsável por grande parte do transporte ferroviário de grãos do país, e da Compass Gás e Energia, o conglomerado sempre cresceu por meio de aquisições ousadas. Mas nada em sua trajetória chega perto do anúncio de que se prepara para se tornar um dos principais acionistas da Vale, o colosso da mineração sediado no Rio de Janeiro. Na sexta-feira 7, a Cosan se propôs a comprar 4,9% da empresa e depois chegar a 6,5% das ações. A operação é avaliada em cerca de 23 bilhões de reais, cifra portentosa, uma vez que a própria Cosan valia na data da proposta 33 bilhões de reais.
Trata-se de um negócio extraordinário sob vários aspectos. Nos últimos anos, as maiores movimentações em fusões e aquisições no Brasil ficaram na casa dos 10 bilhões de reais, como a compra da SulAmérica pela Rede D’Or, da InfraCo (unidade de infraestrutura da Oi) pelo BTG Pactual, e mesmo da Amil pelo gigante americano UnitedHealth, há uma década. Mas tão surpreendente quanto a dimensão foi o comportamento do mercado frente ao movimento da Cosan. Na data do anúncio, as ações da companhia caíram 8,7%. Desde então, os papéis que estavam acima dos 18 reais mergulharam na faixa dos 16 reais — e permanecem por lá. “O mercado reagiu mal, primeiramente, por ser uma transação muito grande, em que a empresa vai precisar se endividar. Depois, por entender que é um negócio de pouca sinergia, uma diversificação sem ganhos claros para a Cosan”, explica Fernando Siqueira, chefe de pesquisas da Guide Investimentos.
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Para tentar reverter a desconfiança, os principais executivos da Cosan têm passado os últimos dias em uma maratona de reuniões e apresentações para investidores, bancos e analistas do mercado financeiro. A complexa transação envolverá, num primeiro momento, um financiamento de 8 bilhões de reais do Itaú e do Bradesco, a ser pago por meio de dividendos recebidos da Compass e da Raízen. Ao mesmo tempo, a Cosan espera já estar lucrando com os dividendos repassados pela Vale. O restante seria pago apenas a partir do fim de 2025 por meio de operações financeiras na bolsa de valores. Além do tamanho impressionante, o negócio foi visto como pouco habitual para o grupo, que tem como tradição manter o controle acionário de suas operações. “De maneira geral, os últimos movimentos da Cosan resultaram em participações majoritárias, de modo que pudesse exercer uma forte influência sobre o negócio. No caso da Vale, a Cosan será uma acionista minoritária”, diz José Eduardo Daronco, analista da empresa de pesquisas Suno Research. Na companhia, ela disputará espaço com outros grandes investidores, como a Previ, os poderosos fundos americanos Capital e BlackRock, o grupo japonês Mitsui e o Bradespar, ligado ao Bradesco, que cortou pela metade a sua presença na empresa no início deste ano. “Seria, assim, um investimento mais financeiro, um investimento como nós, pequenos investidores, acabamos fazendo nas empresas. Foge de como a Cosan está acostumada a trabalhar”, diz Giulia Nicola, analista da Nord Research.
Em suas apresentações, os executivos da Cosan argumentam que a compra complementa o plano de se posicionar entre os ativos mais importantes do capitalismo brasileiro: a agricultura, a produção de energia sustentável e de combustíveis, e a mineração. Uma frase constantemente utilizada tem sido que a Vale é “um ativo único e irreplicável, estrategicamente posicionada onde o Brasil tem vantagem competitiva e comparativa”. Também alegam que investir na mineradora, uma empresa global, seria seguro. Afinal, caso o negócio não traga os resultados esperados, será fácil se desfazer das ações. Até o momento, o esforço de convencimento tem sido recebido com reserva pelos ouvidos da Faria Lima.
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