O Globo (Opinião) – À frente do BNDES, o economista Aloizio Mercadante reivindica a missão de reindustrializar o país. Entre as ideias em discussão está a revisão da Taxa de Longo Prazo (TLP), que sucedeu à antiga Taxa de Juros de Longo Prazo (TJLP), para transformá-la num “leque de taxas” que atenda diferentes setores. Enquanto a TJLP era subsidiada pelo Tesouro segundo critérios que favoreciam grupos empresariais próximos ao governo — os “campeões nacionais” —, a TLP é calculada com base na inflação e na variação de títulos públicos. É das taxas mais baixas do mercado, mas volátil. “Num mês é um valor, no outro mês outro valor”, diz o diretor de Desenvolvimento Produtivo, Comércio Exterior e Inovação do BNDES, José Gordon. “Para o fluxo de caixa do empresário, isso é horrível.”
As mudanças deverão ser apresentadas na forma de Projeto de Lei, com o objetivo de favorecer setores exportadores como aeronaves, bens de capital e indústria automotiva. Não é um acaso que a Fiesp tenha ficado embevecida diante do anúncio. É preciso o máximo de cuidado, porém, para evitar ressuscitar os programas de crédito subsidiado e outras facilidades que os governos do PT distribuíram no passado como se não houvesse amanhã, abrindo um rombo inédito nas contas públicas. Havia, e o desfecho foi a mistura de inflação e recessão em 2015 e 2016, além do buraco fiscal aberto até hoje.
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Com as contas públicas no vermelho e a promessa de zerar em 2024 o déficit primário estimado em R$ 230 bilhões para este ano, não há margem para Mercadante recriar variantes da TJLP com dinheiro do contribuinte. A farra animada pela taxa de juros negativa acabou em 2017. A própria ata da última reunião do Copom destaca a importância de que “a concessão de crédito, público e privado, se mantenha com taxas competitivas e sensíveis à taxa básica de juros [a Selic]”.
Subsídios no crédito para uns, como nos tempos da TJLP, certamente acarretarão maior aperto monetário para todos. Não há mágica. Com o fim da TJLP, o dinheiro antes destinado a subsidiá-la passou a fazer o caminho inverso: voltou ao caixa do Tesouro, reduzindo o endividamento público e permitindo a queda dos juros até 2%. Preocupa que Mercadante tenha, como presidente do BNDES, criticado a devolução pelo banco de R$ 873 bilhões nos governos Temer e Bolsonaro.
O momento não é propício para o novo BNDES desejar qualquer ajuda do Tesouro, muito menos para fazer alquimias com a TLP. O governo se prepara para enfrentar a aprovação do novo arcabouço fiscal no Congresso e precisa ser convincente no compromisso com a saúde das contas públicas. O Tesouro voltar a subsidiar os empréstimos do BNDES seria um contrassenso.
O governo evita falar em relançar a TJLP. O importante é as mudanças garantirem que, se houver subsídios, eles saiam do caixa do próprio banco. A intenção de reduzir a volatilidade é meritória, desde que atenda à necessidade de conter os gastos e a expansão da dívida pública. Sem isso, qualquer política de governo, inclusive a reindustrialização, não terá nenhum futuro.
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