Desde que a Mitsui anunciou, no fim de abril, não ter mais interesse em continuar como sócia da SuperVia, dois grupos procuraram os japoneses para conversar. A Comporte, do empresário Henrique Constantino, dono da companhia aérea Gol, de empresas de ônibus e agora operadora do Metrô BH, e o fundo árabe Mubadala, acionista majoritário do MetrôRio. Fontes envolvidas no assunto dizem que nenhuma empresa chinesa, até o momento, procurou a Mitsui para tratar de qualquer negócio. A possiblidade de um grupo chinês assumir a SuperVia foi divulgada recentemente pelo secretário de Transportes e Mobilidade Urbana do estado do Rio, Washington Reis, que esteve na China no mês passado. Há uma semana, foi à Venezuela conhecer uma empresa chinesa que opera um sistema de trens naquele país.
As negociações para a transferência do controle acionário da SuperVia pouco têm avançado. Pelo lado da Comporte, houve um recuo após encontro de executivos do grupo com representantes do governo do estado. A questão da segurança pública pesou na decisão da Comporte em dar um passo atrás na negociação, segundo uma fonte. Nos últimos anos, a operação do sistema de trens metropolitanos do Rio tem sido afetada constantemente por furtos de cabos na via, presença de tráfico nas estações e até sequestro de condutores. Já o Mubadala, que tinha aventado a possibilidade de compra da SuperVia antes mesmo da decisão da Mitsui, não tem avançado nas conversas. Demonstrou interesse no início (pós-anúncio dos japoneses) e também recuou depois.
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Pelo contrato, a Mitsui, através da subsidiária Gumi Brasil, precisará manter a operação da SuperVia até o governo estado conseguir outro operador para o sistema. São dois cenários possíveis. O primeiro é entendido como ideal: a transferência do controle acionário para outro investidor antes de outubro deste ano, que é o prazo que o governo tem para atestar os investimentos da SuperVia, previstos em acordos feitos no passado, quando a Odebrecht Transport ainda era a acionista majoritária da concessionária. A validação desses investimentos pelo estado é condicionante para a renovação da concessão do sistema até 2048.
Centro da discussão
Em 2010, governo e concessionária assinaram o termo aditivo 8 ao contrato que, entre outros pontos, previa que cada parte deveria investir R$ 1,2 bilhão no sistema. O governo ficaria com a compra de novos trens. A SuperVia com a modernização da malha, sistema de sinalização, melhorias de estações, entre outros. Até o momento, foram atestados pelo governo do estado R$ 900 milhões dos investimentos feitos pela SuperVia, faltando, portanto, a avaliação de cerca de R$ 300 milhões.
A Gumi Brasil afirma em nota que “o contrato de concessão da SuperVia foi prorrogado em 2010 no âmbito do termo aditivo ao contrato de concessão de número 8 (TA8). Neste aditivo, a concessionária deveria investir R$ 1,24 bilhão no sistema até 2021 em substituição do pagamento de outorga para um período adicional de mais 25 anos, a partir de 2023. Os investimentos foram todos realizados antecipadamente e a documentação entregue à Secretaria de Transportes para comprovação, em novembro de 2018, inclusive com envio de notas fiscais. Os investimentos incluíram a construção de novas estações, de um novo Centro Operacional e a modernização de todo o sistema e subestações elétricas para receber os trens com ar condicionado, entre muitos outros”.
Se não houver transferência direta do controle acionário, o governo do estado terá que relicitar a concessão do sistema. A estimativa do mercado é que esse processo de relicitação leve, por baixo, um ano e meio para ser concluído. Até lá, a Mitsui terá que ficar à frente da operação.
Ambos os cenários são dificultosos e demandarão aportes na modernização do sistema tanto por parte do governo do estado quanto pelo novo acionista. O modelo de contrato de concessão, hoje baseado unicamente na tarifa paga pelo usuário como fonte de receita para a concessionária, também terá que ser atualizado, segundo avaliam fontes do setor.
A complexidade está no fato de que um eventual novo modelo de contrato terá que conciliar valores de investimentos por parte da concessionária e do governo, venda das ações, operação e preço da tarifa. Estima-se que são necessários cerca de R$ 6 bilhões para modernizar o sistema. “Para um novo concessionário assumir, precisará ter apoio grande do governo para a melhoria da infraestrutura do sistema. O grau de deficiência é tão grande que vai requerer investimento muito alto a curto prazo”, diz uma fonte.
Outro desafio está no apagão de canetas que domina o cenário político do estado do Rio: nos últimos quatros anos, foram quatro secretários de Transportes diferentes. O histórico de políticos com problemas na Justiça também inibe decisões e comprometimentos na assinatura de documentos por parte da equipe do Executivo, o que torna todo o processo mais lento, avaliam fontes.
A Gumi Brasil, que tem como sócia a Mitsui (majoritária), a operadora japonesa Japan Railway West e o banco de fomento Join, estruturou recentemente uma área dentro da companhia especificamente para tratar da venda da SuperVia. Também dividiu a parte de comunicados ao mercado e à imprensa. Agora a empresa Mitsui responde pela negociação com o governo do estado para a transferência do controle acionário, e a SuperVia apenas pela operação diária do sistema. “Uma das vantagens de negociar o controle acionário da SuperVia nesse momento é que o sistema não está valendo nada. Está barato comprá-lo”, pontuou a fonte.
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