Valor Econômico – Depois de executivos da Vale demonstrarem falta de interesse em rever os termos da renovação antecipada das concessões de ferrovias, o ministro dos Transportes, Renan Filho, decidiu subir o tom nas negociações com a mineradora, ao admitir que está disposto a levar o caso à Justiça. Segundo ele, é possível que o processo resulte em responsabilizar criminalmente os gestores públicos e executivos que assinaram os contratos, supostamente em desfavor do poder público.
A crítica do ministro dos Transportes é dirigida não só à renovação antecipada de dois trechos ferroviários da Vale, em especial a Estrada de Ferro Carajás, mas também aos contratos assinados pela Rumo e MRS. Ao todo, são quatro ferrovias renovadas na gestão do ex-presidente Jair Bolsonaro, nas quais o atual governo espera reaver o montante de R$ 30 bilhões para dar suporte a um plano de investimento no setor.
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Na visão do ministro, os ativos das ferrovias com contrato renovado por mais 30 anos estão subvalorizados. “Nós fizemos uma avaliação do ativo e chegamos à conclusão que ele está subavaliado em todas as frentes”, afirmou, em entrevista ao Valor.
Para Renan Filho, poder público errou
O ministro considera que o poder público errou ao não fazer a própria avaliação do ativo. No caso da Estrada de Ferro, ele disse que a Vale investiu, ao menos, R$ 50 bilhões na linha duplicada, mas ainda teria que considerar sua rentabilidade.
“É uma ferrovia de quase 1 mil quilômetros em estrada de ferro duplicada. Para construir uma ferrovia dessas, hoje, custa muito mais do que R$ 50 bilhões. Só que, do lado de cá, no Pará, tem a mina de minério de ferro mais produtiva da América do Sul e, do outro lado, tem o porto que é o mais preparado para exportar minério do país, que é o Porto de Itaqui, no Maranhão”, ponderou o ministro.
Outro equívoco do processo de renovação, na visão do ministro, foi permitir que a mineradora abatesse os investimentos não amortizados do valor que seria cobrado na outorga da renovação. Ele destaca que a taxa de desconto em infraestrutura (Wacc, na sigla em inglês) foi definida em quase 12% em valores reais para os 30 anos de contrato. “Isso ocorreu com taxa de juro, na época, em 2% no Brasil”, afirmou. “Isso é privatizar o patrimônio público de graça”, acrescentou.
considera um “escândalo” os termos dos acordo de renovação das ferrovias assinados no governo anterior.
Renan Filho disse que defende o respeito ao contrato, mas que considera um “escândalo” os termos dos acordo de renovação das ferrovias assinados no governo anterior. “Não sou contra o instrumento da renovação e também não quero quebrar contrato. Acho que isso não cabe”, frisou.
Estrada de Ferro Carajás
No caso da Estrada de Ferro Carajás, o Ministério dos Transportes defende que a Vale precisa pagar R$ 20 bilhões, em vez dos R$ 600 milhões pagos a título de outorga. A mineradora teria ainda que assumir mais R$ 8 bilhões da ferrovia Vitória-Minas, além de mais R$ 1 bilhão dos contratos da Rumo e outros R$ 6 bilhões da MRS.
“Temos demonstrado que já existe jurisprudência no governo federal. Existe um decreto do [ex-ministro de Minas e Energia, Adolfo] Sachsida, onde, em casos semelhantes, no setor energético, não se permite abater no valor de outorga o ativo não amortizado”, disse Renan Filho.
“Vou ao TCU [Tribunal de Contas da União] tentar fazer esse acordo. Se não conseguir, o governo vai tomar a decisão do que fazer. Pode judicializar, pode fazer várias coisas”, acrescentou.
Segundo o ministro dos Transportes, a área técnica do TCU apresentou parecer contrário às renovações feitas no governo Bolsonaro, e existe um diálogo com os ministros da Corte de contas para rever as posições.
Apoio do presidente Lula (PT)
O ministro disse que teve que assumir posição numa disputa que não é “fácil”, mas que conta com total apoio do presidente Lula (PT).
Renan Filho defende que, se as empresas fecharem acordo sobre renovação com o atual governo, ainda assim será um negócio vantajoso. Segundo ele, “na hora de fechar a contabilidade”, tudo o que será investido será abatido no Imposto de Renda, entre outros tributos. Segundo ele, “isso volta” para a empresa ao longo de 30 anos de contrato.
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