A
procuradora-geral, Raquel Dodge, propôs nesta segunda-feira, 13, Ação Direta de
Inconstitucionalidade contra a Lei 13.334/2016, que estabelece diretrizes
gerais para a prorrogação antecipada de contratos de concessão ferroviária.
Segundo Raquel, a lei ‘contém dispositivos que contrariam os princípios
constitucionais da eficiência, da impessoalidade, da moralidade e da
razoabilidade’, além de ‘violar a regra da licitação e comprometer a qualidade
dos serviços oferecidos à sociedade’.
As
informações foram divulgadas pela Secretaria de Comunicação Social da
Procuradoria-Geral da República.
A lei é
resultado de conversão da Medida Provisória 752/2016, ‘que previu a
possibilidade de prorrogação antecipada dos contratos, mediante investimentos
não previstos nos contratos originais e o atendimento de determinadas
condições’.
Para a PGR,
os requisitos previstos na lei ‘são insuficientes para assegurar a prestação de
serviço adequado pelas concessionárias, com prejuízo ao interesse público e aos
usuários do transporte ferroviário’.
“Os
requisitos objetivos para a prorrogação antecipada favorecem concessionárias
que não lograram, nos últimos anos, executar corretamente e com eficiência o
contrato de concessão”, alerta Raquel.
O tema é
acompanhado desde 2016 pela Câmara de Consumidor e Ordem Econômica do
Ministério Público Federal (3CCR/MPF), que já havia alertado a Agência Nacional
de Transportes Terrestres (ANTT) sobre a necessidade de avaliar, nos processos
de prorrogação antecipada, a vantagem econômica da medida frente à realização
de nova licitação; a exigência de efetiva quitação prévia dos valores devidos
pelos atuais concessionários; e os impactos da escolha para a integração da
malha nacional.
A ação de
inconstitucionalidade proposta pela procuradora-geral tem a mesma preocupação:
assegurar que eventual prorrogação dos contratos de concessão ferroviária seja
realizada dentro da lei e tendo em vista, em primeiro lugar, o interesse
público. “A edição de ato que beneficia o interesse particular na prorrogação de
contrato, em detrimento do interesse público na prestação de serviço eficiente
e adequado, ofende os princípios da impessoalidade e, paralelamente, da
moralidade”, afirma Raquel Dogde na ação.
Além da ADI
própria, a procuradora-geral também enviou ao Supremo parecer na Ação Direta de
Inconstitucionalidade 5684/DF, que discute o mesmo tema.
A ação foi
proposta pela Frente Nacional Pela Volta das Ferrovias (Ferrofrente) e pela
Federação das Associações de Engenheiros Ferroviários, e tem como relator o
ministro Dias Toffoli.
Preliminarmente,
Raquel afirma que as entidades não possuem legitimidade legal para propor esse
tipo de ação. No mérito, no entanto, reafirma o posicionamento pela
inconstitucionalidade da MP 752 e da lei dela derivada.
Relativização
Um ponto
destacado por Raquel como potencialmente lesivo à qualidade do transporte
ferroviário nacional é a redução que a nova lei fez do conceito de ‘serviço
adequado’, requisito que será avaliado pelo governo nos pedidos prorrogação
antecipada.
Pelo contrato
original, a análise desse item deveria levar em conta uma série de fatores,
como regularidade, continuidade, eficiência, segurança, atualidade e cortesia
dos serviços prestados ao longo dos vários anos da concessão, além do valor das
tarifas impostas aos usuários.
Com a nova
lei, essa análise fica reduzida ao cumprimento de metas de produção e
segurança, considerados apenas três dos últimos cinco anos de execução
contratual ou, alternativamente, ao cumprimento apenas da meta de segurança,
considerados quatro dos últimos cinco anos de prestação do serviço.
“As
condições específicas exigidas pela Lei 13.448/2017 alteraram, portanto,
exatamente os critérios e conceitos que, nos termos do contrato vigente,
constituem condicionantes para a concessionária pleitear a prorrogação
contratual no forma originalmente pactuada”, ressalta a PGR.
Na mesma
linha, informa a Secretaria de Comunicação Social da PGR, o coordenador da
Câmara de Consumidor e Ordem Econômica do Ministério Público Federal,
subprocurador-geral da República Augusto Aras, alerta que a avaliação isolada
desses quesitos, num curto espaço de tempo, ‘é incapaz de permitir um
diagnóstico real da qualidade do serviço prestado pelas concessionárias que
agora pleiteiam a prorrogação contratual’.
Segundo
Aras, ‘exemplo disso é que, apesar do histórico de multas e sanções impostas a
grande parte dessas empresas, seja pela má qualidade dos serviços ofertados,
seja pelo não cumprimento das contrapartidas devidas ao Estado e à sociedade,
todas atendem aos critérios de qualificação exigidos pelo governo no contexto
da lei atual’.
Insegurança
jurídica
A ação da
PGR contrapõe o argumento de que a medida provisória seria necessária para
assegurar a prestação do serviço e os investimentos dos atuais concessionários
até o término dos contratos vigentes.
Para Raquel,
essa obrigação existe ‘independentemente de haver ou não possibilidade de
prorrogação’.
A
procuradora afirma que ‘a ampla repactuação contratual, permitida pela nova
lei, traz insegurança jurídica ao mercado’.
“A
prorrogação antecipada, nesses termos, ofende, ainda, a regra da licitação e o
princípio da competitividade, afastando potenciais interessados em prestar o
serviço”, sustenta.
A PGR alerta
ainda ‘para o risco de dilapidação do patrimônio da União, por meio da ‘doação’
indevida de ativos operacionais, móveis e imóveis, às atuais concessionárias,
sem o respeito às formalidades legais necessárias’.
Isso porque
a Lei 13.448/2017 previu a extinção dos contratos de arrendamento desses
ativos, com a respectiva transferência não onerosa dos bens operacionais e não
operacionais ao contratado, sem exigir sequer prévio inventário dos bens
transferidos.
“A falta de
inventário dos bens transferidos sem ônus aos contratados, aliada à
possibilidade de livre disposição do referido patrimônio, representa, porém,
verdadeira doação de bem público sem qualquer formalidade e sem possibilidade
de fiscalização”, aponta a ação, segundo destaque da Secretaria de Comunicação
Social da PGR.
Urgência
A PGR afirma
que a questão é urgente, ‘já que eventual prorrogação antecipada de contratos
ineficientes por mais 30 anos além do prazo originalmente estabelecido pode
trazer danos irreparáveis aos cofres da União e à população’. Por isso, pede a
concessão de medida liminar para a suspensão imediata dos dispositivos
questionados (artigo 6.º, §2º, II; artigo 25, §1.º e §§3.º a 5.º e artigo 30,
§2.º da Lei 13.448/2017) até o julgamento final da Ação Direta de
Inconstitucionalidade.
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