Sem conciliar interesses, leilão de ferrovias não sairá do papel

Para destravar as concessões ferroviárias
previstas para este ano, o governo federal precisará de um poder de mediação
imenso. Com interesse das atuais concessionárias de malhas operantes se
contrapondo aos pleitos dos futuros entrantes, empresários e especialistas
estimam chances baixíssimas de levar a certame os três trechos previstos para
2018.

O primeiro trecho a ser licitado,
segundo agenda do governo, seria parte da Ferrovia Norte Sul que envolve 1.537
quilômetros. “Não será fácil, porque ainda há muitas questões negociais que
precisam ser resolvidas para que os contratos em vigor sejam prorrogados.
Acredito que por força da complexidade e do que é preciso equacionar não será
fácil realizar logo”, conta o sócio do escritório LL Advogados, Leonardo Coelho
Ribeiro.

O trecho, que está 90% concluído,
seria o mais atrativo para investidores, mas esbarra em uma polêmica. “Os
contratos já firmados não tratam do ‘Direito de Passagem’, que dá ao novo
concessionário garantia de acesso a pontos prioritários, como portos, onde
outras empresas já operam”, disse o professor engenharia ferroviária, doutor em
concessões públicas e professor titular da Universidade Federal do Rio de
Janeiro, Jânio Messias Fagundes.

Para um ex-presidente da Agência
Nacional de Transportes Terrestres (ANTT), que falou ao DCI sob condição de
anonimato, o modal ferroviário foi “esquecido” até 2010, quando o projeto do
governo Dilma Rousseff, criou o que ele classificou como uma proposta “sem pé
nem cabeça”. “A ideia, na essência, não era ruim, mas a execução foi desastrosa
e afugentou investidores”, disse, se referindo ao papel central da estatal
Valec nas concessões.

Agora, o desafio de trazer o capital
estrangeiro é maior, mas não impossível. “Não há hoje no mundo opções de
construção de ferrovias com tanto potencial. O capital estrangeiro quer vir
para cá, mas a conciliação com os atuais administradores ferroviários é
urgente”, completou o especialista, que hoje faz consultoria para
multinacionais interessadas no setor.

 

A incógnita presidencial

 

Outro assunto que domina o discurso é
a corrida presidencial. Ainda com um cenário bastante nebuloso, a tendência é
que o mercado aguarde o resultado das urnas para definir investimentos deste
porte.

Alheio a essa percepção do mercado, o
ministro da Secretária-Geral da Presidência da República e fiel escudeiro de
Michel Temer, Moreira Franco, garante que as concessões sairão.
“Precisamos nos dedicar obcecadamente à questão ferroviária. O Brasil não
pode continuar com a extensão ferroviária que tem”, disse, em evento, no fim do
mês passado.

Ao final de 2016 Temer assinou o
decreto nº 8.875 que revogou um decreto que instituía o direito de passagem nas
ferrovias e colocava a Valec como operadora do setor ferroviário, este feito
por Dilma Rousseff. “Apesar de revogar a decisão anterior [que era mal vista
pelo mercado pela importância da Valec, o decreto não diz nada sobre como será
o direito de passagem”, comenta o ex-presidente da ANTT.

O Brasil soma hoje cerca de 29 mil km
de ferrovias operantes, menos da metade de países com dimensão geográfica como
a nossa, e inferior a malha argentina (30 mil km). “O problema é ser uma obra
longa. O governo sempre prefere obra com resultado rápido, que pode ser
licitado e entregue em até oito anos”, diz Fagundes, da UFRJ.

O acadêmico ressalta que desde 1997,
quando as primeiras concessões foram feitas, até hoje, a expansão da malha foi
de pouco mais de 3,6 mil km. “Boa parte foi duplicação, ou seja, trechos que já
existiam a receberam reforços”, alerta.


Contratos firmados


De acordo com dados da Associação
Brasileira da Indústria Ferroviária (Abifer), liderada por Vicente Abate,
antecipar a renovação das concessionárias acelerará os investimentos.

Segundo a entidade, as cinco
concessões operantes envolvem mais de 13 mil km e os investimentos podem chegar
a R$ 25 bilhões nos próximos cinco anos, espalhados por empresas como Rumo
Logística, MRS Logística e VLI Logística.

“Acho que o governo deve facilitar as
antecipações para garantir investimento”, disse o ex-presidente da ANTT
lembrando que a antecipação é a chance de negociar o Direito de Passagem, que é
o “calcanhar de Aquiles de Moreira Franco.”

No final do ano passado o Ministério
Público Federal recomendou à ANTT que não prorrogue antecipadamente os
contratos até que o Tribunal de Contas da União se manifeste. O aval do TCU é
uma das etapas do processo e depende da prova de que o aditivo será mais
vantajoso que a realização de uma nova licitação.

“O texto é alvo de questionamentos por
contrariar princípios como a segurança jurídica e a livre concorrência”, dizia
a recomendação que condiciona o dilatamento do prazo de concessão ao pagamento
de eventuais pendências financeiras das empresas beneficiadas. O texto cita
ainda casos de abandono de obras e não cumprimento de duplicações previstas em
contrato como pendências para assinatura.

Fonte: DCI

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