Câmbio destrava mercado de grãos

A crise política derivada da delação dos irmãos Batista
provocou uma reviravolta na comercialização de grãos no país. Até meados da
semana passada, a grande preocupação dos produtores era onde guardar o milho da
segunda safra – a safrinha -, uma vez que as vendas da colheita recorde de soja
aconteciam em ritmo lento. Mas a queda do real em relação ao dólar após a
divulgação das delações deu novo ânimo à comercialização da oleaginosa.

Esse terremoto político acontece no momento em que a
colheita da safrinha de milho começa a evoluir com maior velocidade em Mato
Grosso, Estado que lidera a produção nacional do cereal. Como o dólar mais
forte acelerou o escoamento de soja – cuja produção também é liderada pelos
mato-grossenses -, a tendência de colapso no sistema de armazenagem de grãos,
que ficava cada dia mais nítida, perdeu força.

Levantamento mais recente do Instituto Mato-Grossense de
Economia Agropecuária (Imea/Famato), divulgado em 8 de maio, indicou 69% da
colheita de 31,2 milhões de toneladas de soja no Estado no ciclo 2016/17 havia
sido comercializada até então, ainda bem menos que na mesma época do ano
passado, quando estava em jogo a safra 2015/16 e o percentual era de 82,1%. No
caso da safrinha de milho, estimada em 28,1 milhões de toneladas, o percentual
era de 46,7%, ante 82,7% no início de maio de 2016.

Analistas como Victor Ikeda, do Rabobank, lembram que os
produtores estavam mesmo à espera de algum “evento” que pudesse
elevar os preços dos grãos e, assim, destravar as vendas. O choque veio com o
câmbio. O dólar comercial subiu 4,71% desde quarta-feira e fechou ontem a R$
3,2788. Apenas na quinta-feira, dia seguinte à divulgação da delação, a alta
foi de cerca de 8%, e muitos produtores aproveitaram para fixar preços de
volumes comprometidos e fechar novas vendas, segundo Francisco Peres, da
Labhoro Corretora de Mercadorias, de Curitiba (PR).

Segundo ele, os preços domésticos da saca de 60 quilos da
soja aumentaram R$ 1,20 entre o dia 12 e segunda-feira. “É uma subidinha
bem significativa”. Conforme Gilmar Meneghetti, da Meneghetti Corretora de
Cereais, de Campo Verde (MT), na quinta-feira foram negociadas no sul de Mato
Grosso, desconsiderando Rondonópolis, cerca de 40 mil toneladas de soja, ante
uma média diária entre 8 mil e 10 mil que vinha sendo negociada.

A maior parte do volume, afirmou Meneghetti, foi comprada
por tradings e direcionada ao esmagamento. Ele informou, ainda, que, também na
quinta-feira as negociações de milho na mesma região chegaram a 50 mil
toneladas, totalmente destinadas à exportações.

Segundo uma corretora localizada em Rondonópolis, as vendas
da oleaginosa naquele polo alcançaram 6 mil toneladas na quinta-feira, grande
parte direcionada ao mercado externo. Mas o volume diário já recuou para cerca
de 600 toneladas.

No caso do milho, os produtores seguem mais cautelosos, à
espera, entre outros fatores, do volume que será negociado nos leilões da
Conab. “As cotações do milho subiram, mas isso ainda não se traduziu em
novos negócios”, afirmou Meneghetti.

Desde o fim de abril, a Conab vem realizando leilões de
Prêmio Equalizador Pago ao Produtor Rural (Pepro) e de Prêmio de Escoamento de
Produto (PEP) para apoiar o escoamento da safra produzida em Mato Grosso e
garantir ao agricultor o preço mínimo de R$ 16,50 a saca de 60 quilos. Além
disso, também estão sendo realizados leilões de compra de contratos de opção de
venda do milho à própria Conab. A perspectiva é que os leilões ajudem a escoar
até 10 milhões de toneladas.

Para Ikeda, do Rabobank, a desvalorização do real pode
estimular o aumento das exportações de milho este ano, até agora estimadas em
cerca de 34 milhões de toneladas. “Se isso não acontecer, vai haver um excesso
muito grande de milho no mercado doméstico e os preços serão ainda mais
pressionados”, diz.

Em meio a esse turbilhão, o Imea soltou seu primeiro
relatório sobre a colheita da atual safrinha de milho no Estado. Até a semana
passada, foi colhido apenas 0,24% dos 4,739 milhões de hectares semeados. Para
Lucas Brunetti, analista do Banco Pine, “todos os indicadores apontam para
uma bela produtividade”. A mudança do patamar cambial pode ser o que
faltava para consagrar a safra 2016/17 como uma das melhores para os produtores
brasileiros.

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