O projeto de abertura de capital da Infraero esbarra nas
dificuldades que ela tem para sanear suas contas. A estatal frustrou os planos
de recuperação do governo e teve um prejuízo líquido de R$ 276 milhões no
primeiro semestre, de acordo com números preliminares obtidos pelo Valor.
Trata-se de um déficit consideravelmente menor do que os R$
574 milhões verificados no mesmo período de 2016, mas distante das cifras
desejadas pelo governo para 2017. Em audiência pública no Senado, na
terça-feira, o ministro dos Transportes, Maurício Quintella, disse que a
Infraero fechará o ano com lucro em torno de R$ 400 milhões. Um valor bastante
próximo foi prometido pelo presidente da empresa, Antônio Claret, em entrevista
concedida ao Valor em fevereiro.
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Em nota, a Infraero argumentou que a previsão de lucro perto
de R$ 400 milhões se referia ao resultado operacional recorrente. “Ao
final do primeiro semestre, esse número já atingiu R$ 160,2 milhões
positivos”, sustentou. A estatal destacou ainda a “melhora
significativa” no prejuízo líquido, que diminuiu 51%.
O objetivo do governo era torná-la financeiramente
independente já em 2018, bancando inclusive seus próprios investimentos em
obras e melhorias, que hoje são feitas com aportes do Tesouro Nacional. A
realidade das operações mostrou-se diferente: da rede de 59 aeroportos
administrados pela Infraero no primeiro semestre, só 23 foram lucrativos.
A lista dos terminais rentáveis é encabeçada por Congonhas
(SP), com superávit de R$ 137 milhões no período de janeiro a junho, o que
reforça a condição de “joia da coroa” entre seus ativos.
O impacto da última leva de concessões à iniciativa privada,
no entanto, deverá ser sentido nos próximos meses. Em segundo e em terceiro
lugar na lista estão, respectivamente, os aeroportos de Salvador e Porto
Alegre. Fortaleza e Florianópolis também estão entre os dez mais lucrativos.
Todos eles tiveram seus contratos de concessão assinados há duas semanas. O
período de transição para as novas operadoras dura de sete a dez meses. Depois,
os terminais são retirados do balanço financeiro da estatal.
Sobrará para a Infraero uma dor de cabeça: o que fazer com
1.148 empregados que hoje batem ponto nos quatro aeroportos. Naqueles já
concedidos, menos de 10% foram absorvidos pelas novas operadoras privadas.
Sem contar com esses quatro aeroportos, o déficit teria
quase dobrado e chegado a R$ 454 milhões no primeiro semestre. As contas podem
se agravar mais ainda com a concessão de outros terminais na mira do governo –
como Santos Dumont (RJ), Recife, Vitória e Cuiabá – que também fazem parte da
lista dos rentáveis.
Uma medida provisória deve ajudar na limpeza do balanço. A
MP transferirá a infraestrutura de torres de controle e estações de
telecomunicações hoje operadas pela Infraero para uma nova companhia, por
enquanto batizada de Nave Brasil, sob comando da Aeronáutica. Com isso, não
apenas uma operação deficitária passará para os militares, mas um contingente
de até 1,7 mil trabalhadores sairia da folha de pagamento da estatal e migraria
para a Força Aérea Brasileira (FAB).
O problema é que a MP travou na reta final de elaboração.
Segundo fontes oficiais, a FAB quer o enquadramento da Nave Brasil como
“empresa estratégica de defesa” no texto da medida provisória, o que
lhe garantiria benefícios tributários. O pleito dos militares divide o governo
porque, com essa classificação, a nova companhia de navegação aérea ficaria
menos submetida aos órgãos de controle – como o Tribunal de Contas da União
(TCU) – e precisaria de uma mudança legal para ser concedida mais adiante.
No dia 23, em reunião no Palácio do Planalto, o conselho do
Programa de Parcerias de Investimentos (PPI) receberá do Ministério dos
Transportes uma proposta de contratação de dois estudos para a Infraero. Um
deles buscará fazer o “valuation” da participação acionária de 49%
que ela detém nos aeroportos concedidos pela ex-presidente Dilma Rousseff:
Guarulhos (SP), Galeão (RJ), Brasília (DF) e Confins (MG). Viracopos (SP), que
a concessionária privada resolveu devolver à União, será relicitado sem a
participação da Infraero.
A ideia é que uma consultoria externa faça a avaliação de
mercado sobre o valor das fatias acionárias nos aeroportos privados e recomende
uma estratégia de oferta desses ativos no mercado.
O outro estudo tem como objetivo definir uma reestruturação
da Infraero, com possíveis novas subsidiárias, e sua eventual abertura de
capital. Há ainda um problema de natureza jurídica: hoje a Infraero é uma
empresa sem patrimônio, já que seus aeroportos pertencem oficialmente à União e
precisam ser “contratualizados”. Sem isso, ela não faz captações no
mercado por falta de garantias aos bancos.
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