O grupo alemão Siemens uniu sua divisão ferroviária com a
fabricante francesa de trens de alta velocidade Alstom. O negócio criou uma
gigante europeia capaz de enfrentar a concorrência chinesa nesse segmento. A
Siemens transferirá seus negócios nessa área para a Alstom, em troca de uma
participação de 50% na empresa ampliada, de acordo com uma declaração conjunta
das companhias.
A nova empresa, chamada por enquanto de Siemens Alstom,
nasce com vendas de € 18 bilhões e permanecerá com base em Paris, onde manterá
as ações listadas. Ela terá 60 mil funcionários e será a segunda maior
fabricante de vagões e locomotivas atrás da China Railway Rolling Stock (CRRC).
O atual presidente-executivo da Alstom, Henri Poupart-Lafarge, vai comandar
nova empresa. Caberá à Siemens indicar o presidente do conselho da companhia.
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As duas empresas são amplamente complementares em
termos de atividades e geografias, informaram as companhias,
acrescentando que o conselho terá onze membros, seis indicados pela Siemens. A
combinação dará à empresa alemã o controle de um ícone da indústria francesa
que desenvolveu os trens TGV de alta velocidade.
O governo do presidente Emmanuel Macron apoiou o acordo
depois de receber garantias sobre empregos, e isso ocorre poucos dias depois
que a chanceler alemã Angela Merkel ser reeleita em uma plataforma de laços
europeus mais próximos.
Por vários meses os investidores acreditaram em um acordo
potencial entre a Siemens e o grupo canadense Bombardier. A reviravolta das expectativas
em torno do acordo se refletiu nas variações sofridas pelas ações da Bombardier
e da Alstom. A primeira caiu 10% desde quinta-feira, enquanto a última
registrou alta de mesmo percentual. Com o fechamento do negócio na Europa, a
Bombardier terá um novo obstáculo no seu plano de expansão.
O acordo está sendo retratado por assessores franceses como
prova de uma relação nova e em aprimoramento entre Paris e Berlim. Alguns
anos atrás, não tenho certeza de que esse acordo teria acontecido, diz
pessoa com conhecimento direto das conversações. Antes, com discussões
entre governos, esse tipo de acordo poderia ter fracassado por questões de ego,
por qualquer outra questão.
Os franceses deixaram claro, além disso, que não vão exercer
a opção de compra de uma participação de 20% na Alstom. A opção tinha sido
negociada em 2014 pelo governo para mostrar que tinha controle sobre o trem de
alta velocidade TGV, da Alstom, símbolo de orgulho nacional para os franceses.
A Siemens e a Alstom são fortes em trens intermunicipais de
alta velocidade com seus modelos ICE e TGV. A Siemens, além disso, é líder em
tecnologia de sinalização. O que dá à nova companhia condições de enfrentar os
chineses. Desde que a expansionista CRRC foi formada, no terceiro trimestre de
2015, por meio da fusão de duas fabricantes de equipamentos ferroviários
controladas por Pequim, tem feito investidas no mercado europeu. O grupo fechou
o ano passado com receita mundial de US$ 30 bilhões.
O CRRC já controla cerca de metade do mercado de vagões e
locomotivas, enquanto a Siemens e a Bombardier possuem cerca de 12% e a Alstom
em torno de 11%, de acordo com a Desjardins Capital Markets.
O negócio só não será concretizado se houver objeções de
reguladores relativas a questões antitruste, que foi uma das principais
preocupações quando a Siemens e a Alstom travaram conversações em 2014.
Mas alguns analistas dizem que a fusão que constituiu a CRRC
reduziu a importância de questões antitruste, já que as autoridades reguladoras
começam a entender que precisam pensar em termos mundiais, não regionais, para
que as companhias europeias prosperem. Se você tem a França e a Alemanha
pressionando, esse é um bom ponto de partida, diz James Stettler,
analista do setor do Barclays.
De acordo com a Dealogic, as empresas chinesas têm comprado
concorrentes europeias a um ritmo de quase quatro por semana neste ano, após o
recorde registrado em 2016. Há o crescente temor de que a China possa dominar
setores inteiros, desencadeando movimentos populistas e apelos por medidas
protecionistas.
No fim do ano fiscal passado, a Alstom tinha uma carteira de
encomendas pendentes de € 34,8 bilhões, mas a qualidade das encomendas não é
divulgada. A Siemens, provavelmente, está consciente desse risco. Embora a
execução de projetos pela Siemens tenha melhorado significativamente nos
últimos anos, desde que Joe Kaeser assumiu como executivo-chefe, em 2013, a
empresa tinha perdido anteriormente centenas de milhões de euros em contratos
devido a atrasos e a estouros de custos.
A Alstom foi, por um longo período, um símbolo do poder
industrial francês. Mais recentemente seu destino tem sido determinado pela
prodigalidade governamental, como a operação de socorro financeiro que lhe foi
concedida pelo governo em 2004.
A tentativa da Siemens de adquirir a Alstom também teve uma
longa e complicada história envolvendo o governo francês.
Em 2014 a empresa alemã, juntamente com a japonesa
Mitsubishi Heavy Industries, tentou derrotar uma oferta da General Electric
pelos ativos de energia da Alstom. A americana GE saiu vencedora dessa disputa,
apesar de ter de aceitar o governo francês como um grande acionista da nova
empresa.
Desta vez, no entanto, um acordo entre a Siemens e a Alstom
parece sinalizar uma mudança da política francesa de intervenção industrial, já
que o governo Macron tem vendido ativos industriais considerados estratégicos
no passado.
O governo não deterá uma participação acionária na nova
empresa, de acordo com pessoas familiarizadas com a questão, em parte porque a
Siemens estipulou essa pré-condição para o acordo. O contrato, além disso, vai
incluir embargos destinados a proteger os interesses franceses.
No entanto, apesar dessas garantias, os políticos franceses
da direita e da esquerda se revelaram energicamente contrários ao pretendido
acordo.
É hoje o fim da Alstom?, postou no Tweeter Eric
Woerth, ex-ministro do Orçamento do governo do presidente francês Sarkozy.
O TGV vai se tornar alemão? Por que o governo aceita um desequilíbrio
desses?
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