Recessão e problemas em contratos atrapalham PPPs

A recessão e problemas no desenho e no cumprimento de
contratos, além da conjuntura política conturbada do início do ano, provocaram
uma desaceleração no mercado da privatização dentro do modelo de parceria
público-privada (PPP), uma aposta importante para viabilizar novos projetos em
tempos de fortes restrições fiscais. Neste ano, até agosto, pelo menos seis
PPPs foram assinadas por governos estaduais e prefeituras com a iniciativa
privada e outras 16 têm licitações em andamento.

São projetos bastante maduros que podem mobilizar, no
curto prazo, cerca de R$ 7 bilhões em valor de contrato assinado, diz
Guilherme Naves, da Radar PPP, empresa que monitora esse mercado. O valor é bem
menor do que os R$ 44 bilhões apurados nos 12 meses encerrados em agosto de 2015,
com cerca de 25 parcerias concretizadas.

Levando em conta o estoque potencial de projetos, pode haver
uma variação nominal positiva de quase 5% nos valores de contrato. Consideradas
as licitações em andamento, as parcerias nos Estados e municípios podem
acumular R$ 151,9 bilhões neste ano ante os R$ 144,9 bilhões nos 12 meses
encerrados em agosto do ano passado – nenhuma PPP federal avançou e saiu do
papel desde a promulgação da legislação que regula a atividade, em 2004.

O fraco desempenho das PPPs no Brasil ao longo dos últimos
meses, na comparação com 2015, está ligado à atual restrição fiscal vivida pela
administração pública e ao aprofundamento da recessão. Além disso, a
persistente dificuldade burocrática na relação governo-empresa emperra o avanço
de projetos, muitas vezes resultando em atrasos e cancelamentos de contratos.

Com medo de levar calote, o investidor privado está fugindo
de iniciativas cuja remuneração é fixada por regras de custeio do orçamento
público, como hospitais, escolas ou presídios. Por outro lado, é elevada a
demanda por parcerias que têm recurso carimbados- por exemplo, iluminação,
saneamento, resíduos sólidos, todos serviços públicos custeados por tarifas
pagas por usuários ou taxas constitucionalmente definidas e que não podem ser
apropriadas por regras orçamentárias.

Setores como iluminação, que tem uma taxa de
arrecadação prevista pela Constituição, ou fornecimento de água, aeroportos e
rodovias, com serviços pagos pelo usuário, acabam atraindo mais o investidor
para uma PPP ou outra modalidade de concessão; têm um nível de segurança maior
que outros segmentos, acrescenta Naves.

Das PPPs assinadas nos últimos meses e das licitações em
andamento, quase metade ocorre em iluminação pública. Nesse segmento, a
remuneração ao investidor privado que assumir a responsabilidade de melhorar e
operar o sistema vem diretamente da arrecadação de uma taxa cobrada na conta de
luz do usuário, a Contribuição para o Custeio dos Serviços de Iluminação
Pública (Cosip).

Os contratos de PPPs em iluminação pública tiveram alta de
mais de 150% até agosto, numa comparação anual. O estoque de projetos passou de
R$ 686 milhões para R$ 1,7 bilhão no período. Já parcerias para construção e
operação de presídios e dos estádios de futebol da Copa do Mundo de 2014 –
normalmente remunerados com verba de custeio do orçamento público – viram suas
carteiras de investimento diminuir, pois houve cancelamentos de PPPs nessas
áreas.

Das 12 arenas usadas na Copa do Mundo, 6 foram construídas
por meio de PPP. Hoje, todas, sem exceção, apresentam problemas financeiros ou
têm contratos em litígio judicial envolvendo poder concedente, investidor
privado e tribunais de contas estaduais.

Com um custo de construção de quase R$ 500 milhões, a Arena
Pernambuco, localizada na região metropolitana de Recife, teve o contrato de
PPP rescindido em julho deste ano sob suspeita de fraude na licitação da
parceria e superfaturamento, além de se mostrar um negócio deficitário. Deixou
de ser administrada pelo consórcio liderado pela Odebrecht e está agora sob
responsabilidade do governo estadual, que, por sua vez, deve à construtora
quase R$ 250 milhões a serem pagos em 15 anos.

Outro caso, também em Pernambuco, envolve o cancelamento de
uma PPP para a construção de um presídio modelo perto de Recife, com parceria
assinada em 2009. As obras se arrastaram até 2012, quando foram oficialmente
paralisadas. Um processo judicial foi instalado até que, somente no ano
passado, o governo estadual decretou caducidade do contrato.

Em geral, muitas vezes empresas assumem um grande
volume de projetos e comprometem-se; falta também aos governos apurar suas
condições técnicas para melhorar os projetos, os modelos de contrato; mas o
pior de tudo é o excesso de judicialização, que é uma falha do modelo de
licitação no Brasil. Isso vai muito além das PPPs. Toda licitação de grande
porte é suscetível a uma guerra judicial, que muitas vezes atrapalha o projeto,
o deixa defasado, avalia Leonardo Moreira Costa de Souza, sócio da área
de infraestrutura do escritório Azevedo Sette.

Na capital paulista, uma das maiores PPPs do Brasil – e a
maior PPP de iluminação pública do mundo – está parada desde 2013 por causa de
interferência do Tribunal de Contas do Município (TCM). Com contrato de R$ 7,2
bilhões, a parceria público-privada para renovar a malha de iluminação da
cidade, a princípio, foi paralisada porque uma das empresas derrotadas na
licitação entrou com liminar na Justiça e impediu a continuidade do certame.
Mais tarde, o TCM questionou especificidades do edital, como a não divisão da
cidade em lotes e a utilização da Cosip como garantia.

Apesar de ter regulação em vigor desde 2004, as PPPs
sofrem porque ainda são algo ‘novo na realidade brasileira. Elas se apresentam
como um instrumento modernizador [da relação Estado-iniciativa privada], mas
ainda são vistas [pelos órgãos supervisores] pela lente da 8.666 [Lei de
Licitações]. É preciso entender que um contrato de PPP é mais voltado para
resultados, para aspectos qualitativos de seus objetivos; não apenas para
materiais ou custos lançados numa planilha, como é a 8.666, reclama
Rodrigo Pirajá, presidente da SP Negócios, empresa criada pela Prefeitura de
São Paulo para promoção de PPPs e atração de investimentos.

O processo havia sido retomado e abertura dos envelopes
aconteceria hoje. Na sexta-feira, porém, o Tribunal de Justiça de São Paulo
suspendeu novamente a licitação.

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