A concretização do impeachment deve acelerar a negociação
das medidas fiscais já propostas pelo presidente interino Michel Temer, avaliam
economistas. Outras agendas importantes e que exigem maior capital político,
como as reformas previdenciária e trabalhista, podem ser encaminhadas ao
Congresso até o fim do ano, mas não há expectativa de aprovação no curto prazo.
Além da consolidação do ajuste fiscal, outra condição
necessária para que o PIB volte a crescer é o sucesso das concessões em
infraestrutura. Por isso, o governo precisa ter urgência na definição dos
projetos e do modelo de financiamento do Programa de Parcerias de Investimentos
(PPI).
Dentro do projeto de coleta de projeções dos principais
indicadores macroeconômicos do país, o Valor Data faz, periodicamente,
consultas qualitativas com as consultorias e departamentos econômicos de
instituições financeiras. Para essa rodada, foram apresentadas três questões. O
objetivo é entender quais serão as prioridades do governo Temer, caso se torne
efetivo, que condições são necessárias para que a economia volte a crescer e,
também, o que esperar do ajuste fiscal daqui para frente.
“O governo deve ter como principal objetivo consolidar
a percepção de que haverá avanço de medidas que garantam trajetória fiscal
sustentável”, afirma o economista-chefe do Bradesco, Octavio de Barros,
citando o avanço da PEC que limita a alta do gasto público à inflação do ano
anterior e o começo da discussão sobre a Previdência.
A menor incerteza sobre as contas públicas vai contratar
perenidade da melhor confiança, avalia Barros. Já a ampliação do horizonte de
empresários e consumidores dará suporte à retomada nos próximos dois anos.
“Vale ter em mente que o tempo político é mais dilatado que o econômico.
De qualquer maneira, é preciso que o governo mostre seu firme comprometimento
com o ajuste fiscal”, concorda Thaís Zara, economista-chefe da Rosenberg
Associados.
Exercícios feitos pela LCA Consultores apontam que o choque
favorável já observado nas expectativas pode levar o PIB a crescer algo entre
2% e 3% já em 2017, diz Bráulio Borges, economista-chefe da consultoria.
Embasam as projeções da LCA, de alta de 1,5% para o ano que vem, e de 3% para
2018, a percepção de um ambiente político mais estável, assim como a
continuidade da melhora da confiança após a aprovação das medidas fiscais.
Sem essa implementação e o encaminhamento das reformas
estruturais, o desempenho favorável da confiança sofrerá um revés e
impossibilitará a retomada econômica, alerta Jankiel Santos, economista-chefe
do banco Haitong.
Na visão do economista-chefe da MB Associados, Sergio Vale,
a expectativa de crescimento de 2% para o próximo ano não pode ser vista como
otimista, uma vez que haverá retração de mais de 8% durante os dois anos de
recessão. “Só não crescemos mais porque o ajuste fiscal e monetário estão
em andamento e impedem um crescimento mais intenso ano que vem.”
Ainda que a administração atual ganhe força após se tornar
efetiva, a negociação da agenda fiscal não será fácil, pondera Alessandra
Ribeiro, sócia da Tendências Consultoria, não só pela impopularidade do tema,
mas pelo baixo capital político do governo. Por isso, diz, é preciso agir
rápido, para ter apoio dos demais partidos, em especial do PSDB, e ter foco.
“Nesse sentido, não esperamos que outras agendas sejam encaminhadas. O
foco deve ser a agenda fiscal que, por sinal, já é bastante ambiciosa.”
Na avaliação de Marco Caruso, do banco Pine, a aprovação da
proposta que restabelece a Desvinculação das Receitas da União (DRU) abrirá
margem de manobra sobre as despesas discricionárias, enquanto a alta das
despesas obrigatórias será contida pela PEC do teto. A consistência dessa
medida no tempo, porém, vai exigir alguma contenção das despesas
previdenciárias. “Esta ação, no entanto, deve ficar para um segundo
momento”, afirma Caruso. Maurício Molan, economista-chefe do Santander,
acredita que a PEC será aprovada este ano, enquanto o debate sobre a reforma
das aposentadorias vai amadurecer em 2017.
Embora em estágio avançado na pauta do Congresso em relação
às outras propostas, a PEC está sujeita a riscos de calendário capazes de adiar
a aprovação para o próximo ano, diz Raphael Ornelas, do Brasil Plural.
“Dessa maneira, os primeiros esforços do novo governo devem concentrar-se
na aprovação da PEC com o máximo de presteza e o mínimo de desvirtuação.”
Espera-se que, com o fim da interinidade, o governo
“jogue mais duro” com o Congresso, o que não tem feito até agora, diz
Luiz Castelli, da GO Associados, e dê sentido de urgência à aprovação da PEC.
Por outro lado, somente o teto vai demorar bastante para gerar superávits.
“Ou seja, espera-se outras propostas no campo fiscal”.
Juan Jensen, da 4E Consultoria, concorda. “As receitas
devem combinar entradas temporárias, de concessões e privatizações, e
permanentes, como a reversão de desonerações, aumento ou mesmo a instituição de
novos impostos.”
Uma vez tornado efetivo, o governo precisa apresentar
medidas sobre projetos de infraestrutura, diz José Francisco de Lima Gonçalves,
economista-chefe do Fator, com definição de critérios de seleção e regulação
desenhada por incentivos, e não regras “sabidamente ineficazes”.
“Algum tipo de incentivo será necessário, via renúncia ou subsídio, como
as debêntures e garantias do BNDES ou Tesouro, desde que com critérios
objetivos de cobrança de resultados.”
Para que os projetos sejam viabilizados, aponta Helcio
Takeda, da consultoria Pezco, é necessário melhorar o ambiente regulatório,
fortalecendo o papel das agências reguladoras, e aumentar a participação do
mercado de capitais e do investimento estrangeiro no financiamento.
Sem redução dos juros, o mercado de capitais não poderá ser
fonte de recursos para as concessões e privatizações, diz Luis Otavio de Souza
Leal, economista-chefe do banco ABC Brasil, num momento em que os bancos
públicos estão com orçamentos reduzidos. Por isso, é fundamental criar
condições para que os juros caiam. Desse cenário depende a previsão do ABC de
alta de 4% do PIB em 2018.
O Itaú tem projeção igual, mas o economista Caio Megale
destaca que as reformas de ajuste fiscal são necessárias. “São as reformas
que vão possibilitar a redução dos prêmios de risco e que abrem espaço para um
processo mais consistente de queda de juros.”
A perda de fôlego da inflação será outro impulso ao PIB,
segundo Carlos Pedroso e Mauricio Nakahodo, do Banco de Tokyo-Mitsubishi UFJ
Brasil, ao abrir espaço para melhora do consumo, ao menos de bens de menor
valor. Por outro lado, dizem, a demanda ainda será restrita, “devido ao
mercado de trabalho negativo pelo menos até o fim do primeiro semestre e aos
juros elevados, mesmo com o início do ciclo de corte previsto para
janeiro”.
Rafael Leão, economista-chefe da Parallaxis, elevou de 0,5%
para 1,1%, a previsão para o aumento do PIB no próximo ano, com base na
expectativa de redução da Selic e no nível mais desvalorizado do câmbio ante
2014, que ajuda o setor externo. Mais pessimista, Silvia Matos, do Ibre-FGV,
tem dúvidas sobre os rumos do ajuste. “Minha dúvida é se será necessária
nova rodada de mau humor nos mercados para que Congresso e sociedade aceitem
medidas fiscais tão difíceis”, diz ela, que trabalha com alta de apenas
0,5% do PIB em 2017.
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